As organizações ligadas à segurança rodoviária acusam a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária de ser pouco transparente na divulgação de dados sobre sinistralidade.
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Ao terceiro mês de 2020, a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) ainda não forneceu informação deste ano; e não publicou qualquer detalhe sobre o ano passado, ainda que provisório, nem sequer dados mensais definitivos, ao contrário do que era prática habitual.
No site da ANSR, que está sob a tutela do Ministério da Administração Interna, só há dados globais de 2019: o número de mortos e feridos graves nos últimos dez dias do ano, a que se somam os feridos ligeiros e os acidentes de todo 2019, por distrito. São dados provisórios, que contam só o número de pessoas que morreram no local do acidente ou a caminho do hospital e excluem todos os que acabam por morrer nos dias seguintes (ler ao lado). Deste ano, nenhuma informação foi publicada.
Ao JN, fonte oficial da ANSR disse ter em curso "a reformulação da informação periódica" e "assim que os dados de janeiro do corrente ano estejam compilados e analisados serão publicados". Mas a explicação não satisfaz as organizações da sociedade civil que estudam a sinistralidade rodoviária.
"Se a ANSR não tem os dados, não consegue cumprir a sua missão. Mas se os tem e não divulga, fica prejudicada a avaliação crítica que a sociedade civil pode fazer a essa política pública e o auxílio que lhe pode dar", disse João Queiroz, da Associação Estrada Mais Segura. "Numa sociedade democrática, o dever de informação é fundamental, a opacidade só gera desconfiança", acrescenta Nuno Salpico, do Observatório de Segurança das Estradas e Cidades.
José Miguel Trigoso, da Prevenção Rodoviária Portuguesa, já questionou a ANSR e ouviu a mesma resposta enviada ao JN. "É positivo que sejam divulgados dados com maior detalhe, até porque os que conhecemos agora são demasiado vagos, têm pouca utilidade. Mas é melhor ter dados vagos do que não ter informação alguma".
Mais preocupante do que ainda não haver qualquer informação sobre este ano, diz Trigoso, é o facto de se desconhecer qualquer detalhe relativo ao ano passado. "Como está a evoluir a sinistralidade dentro e fora das localidades? Entre os peões? Quais as estradas mais perigosas?", pergunta.
Saúde pública em causa
"Quase todos os dias morrem pessoas, este é um problema urgente que exige uma resposta urgente", apela Nuno Salpico. Esta é, lembra Arlindo Donário, professor da Universidade Autónoma, "uma questão de saúde pública".
Neste momento, a única informação relativa a 2019 indica que o número de mortes diminuiu, mas este é um número oficioso. Desconhecem-se dados oficiais.
Programa contra sinistralidade acaba no final deste ano
Acaba em dezembro o Plano Estratégico de Segurança Rodoviária (PENSE 2020). O roteiro contra a sinistralidade previa terminar este ano com 41 mortos por milhão de habitantes, o que seria uma redução de 56% face a 2010. Mas o país estará longe de alcançar a meta: segundo a União Europeia, em 2018, morreram 59 pessoas por milhão de habitantes. A diferença poderá estar relacionada com a execução do PENSE 2020. No último balanço, em abril do ano passado, a ANSR dizia que 40% das medidas estavam no terreno. Mas as organizações do setor têm denunciado ações avulsas e sem impacto real na segurança nas estradas.
Estatísticas
24 horas: dados provisórios
Os dados a 24 horas, reproduzidos nesta página, retratam as mortes ocorridas no local do acidente ou a caminho do hospital. Em 2019, morreram 472 pessoas, menos do que as 508 de 2018. Este dado, todavia, não é oficial.
30 dias: dados definitivos
É o dado oficial, para consumo interno e comparações internacionais: a sinistralidade mortal é a que ocorre até 30 dias depois do acidente. Ainda não foi revelado este número para o ano de 2019.