Não faltará bacalhau para a consoada neste Natal, mas o preço vai subir até 20%
Muito pescado chegou no início do ano, porém poderão não estar disponíveis em dezembro alguns calibres e origens. Portugueses pagarão mais para manter a tradição devido à escassez de matéria-prima e subida de custos da produção.
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Os portugueses vão ter de abrir os cordões à bolsa para manter a tradição na consoada, devido a uma série de circunstâncias (designadamente a escassez de matéria-prima e a escalada dos custos de produção) que farão os preços do bacalhau aumentar até 20%. Poderão faltar calibres e origens, mas haverá peixe para todos, garantem as empresas.
Ricardo Alves, da Riberalves, empresa que processa 25 mil toneladas por ano, cerca de 10% de todo o bacalhau pescado no Mundo, garante que, "no imediato, não está em causa o aprovisionamento de bacalhau para o Natal e para o final do ano". O pescado chegou a muitas empresas na primeira metade do ano, logo após o fim das campanhas de pesca, e, desde então, tem estado a ser processado. Outras empresas estão a desenvolver estratégias para receber o fiel amigo, debelando as dificuldades sentidas nos transportes.
No entanto, o preço vai subir e esse aumento deverá continuar no início de 2022. "O bacalhau aumentou cerca de 15% nos últimos três meses e, com esta situação, é natural que volte a aumentar, nomeadamente em 2022, quando se inicia a temporada de pesca e a fase de maior volume de importação", diz Ricardo Alves.
O Grupo Rui Costa e Sousa & Irmão, de Ílhavo, que processa 20 mil toneladas de bacalhau por ano, antecipa "menos disponibilidade e consumo de tamanhos grandes" em relação ao que era habitual para a época. Para isso, contribuem a "diminuição de quantidades" e consecutivo aumento de preço "na origem". Também se assiste a uma subida de "custos dos transportes, embalagens, eletricidade, etc.", acrescenta a empresa. Logo, fizeram "maior stockagem e aquisição de produto em época".
Consumo a recuperar em 2021
Depois de uma quebra no consumo em 2020 e no início de 2021, referida ao JN por várias empresas, a situação está a voltar ao normal. A Lugrade, de Coimbra, conta que tem vindo a sentir, no segundo semestre deste ano, "um aumento do consumo face ao semestre anterior. Bacalhau não vai faltar no Natal, podem é faltar algumas referências", ou seja, as pessoas podem querer "comprar um determinado calibre, nomeadamente os maiores, que são mais procurados nesta altura, ou uma [determinada] origem" e não haver no mercado, referiu.
Luísa Melo, da Esbal, em Ílhavo, corrobora que este foi um ano de aumento dos custos de produção, sobretudo ao nível da energia, embalagens e combustíveis e de matéria-prima. Ainda que parte seja absorvida pela indústria, espera-se um aumento de "15% a 20%". E, nos "primeiros meses de 2022, não se prevê baixa".
A Caxamar, de Ourém, também frisa que, neste Natal, "o preço "vai estar 15% a 20% mais caro do que em 2020", obrigando a um "esforço financeiro acrescido" para manter a tradição. Antevê dificuldades em relação à obtenção de pescado "nos primeiros três meses de 2022, considerando que as pescas apenas começarão em fevereiro ou em março". Em 2021, a "procura foi crescendo, contudo, a produção na origem não acompanhou o mesmo ritmo", o que motivou "um acentuado aumento dos preços da matéria-prima".
"Não correu como era expectável ao longo da campanha. Pescou-se menos bacalhau e algumas quotas não chegaram a ser atingidas", concorda Manuel Guimarães, da Soguima, em Guimarães.
O setor
De onde vem
Como o bacalhau que a frota lusa pesca não chega para o consumo nacional, a indústria portuguesa importa, sobretudo, da Noruega, Rússia e Islândia, indica a Associação dos Industriais do Bacalhau.
Para onde vai
Parte do que se transforma em Portugal é exportado para o mercado da saudade, com destaque para o Brasil e França, mas também para outros países onde estão emigrantes. Angola era importante, mas tem perdido peso.
O que comemos
Portugal é responsável por 20% do consumo de bacalhau no Mundo, ou seja, somos os maiores consumidores a nível mundial de bacalhau seco.
Quanto empregamos
Só a indústria transformadora emprega cerca de 2000 pessoas. As empresas queixam-se de falta de mão de obra: são precisas mais duas a três centenas de trabalhadores.
Saber mais
60 mil toneladas de bacalhau são consumidas em Portugal por ano, segundo a Associação de Industriais de Bacalhau. O consumo é cada vez menos sazonal, mas estima-se que, só no Natal, se comam entre quatro
e cinco toneladas.
400 milhões de euros era o volume de negócios das empresas transformadoras de bacalhau antes da covid-19, segundo a associação, que representa 75% das firmas. A pandemia, ao afetar o turismo e a exportação, fez o negócio cair.
5,2 mil toneladas de bacalhau era o total de quotas para a frota lusa, este ano, nas águas do Atlântico Norte. O peso é para peixe fresco, que pesa três vezes mais do que o seco consumido tradicionalmente.