Em causa concurso no valor de 819 milhões de euros para a compra de 117 composições. O problema está nas diferentes alturas das plataformas.
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O concurso para a aquisição de 117 novas composições que a CP tem em curso exige que as carruagens tenham degraus devido às diferentes alturas das plataformas. Atualmente, há muitos comboios inacessíveis às pessoas com mobilidade reduzida e esta compra vai prolongar o problema pelos anos de vida útil dos equipamentos.
A utilização dos atuais Intercidades está completamente fora de questão para alguém em cadeira de rodas elétrica. "Por um lado, há o problema das escadas; por outro, as portas são muito estreitas. Nenhum modelo de cadeira elétrica passa naquelas portas", explica, ao JN, José Senra, um cidadão de Viana do Castelo que se desloca em cadeira de rodas e que, sempre que lhe é possível, usa o comboio como meio de transporte.
"Só podem embarcar clientes com cadeiras de rodas manuais dobráveis, dada a largura útil das portas e corredores", explica o manual do Serviço Integrado de Mobilidade (SIM) da CP. O mesmo documento deixa claro que o apoio dado pelos seus funcionários "não inclui o acompanhamento nas atividades básicas de vida". Uma vez que as casas de banho dos Intercidades são de reduzidas dimensões, a sua utilização é inviável para estas pessoas.
Dos 117 novos comboios que a CP vai adquirir, num concurso com um preço base de 819 milhões de euros, 55 vão para o serviço regional e 62 para os suburbanos de Lisboa e Porto. As escadas previstas para estas composições vão prolongar, durante o tempo de vida destas unidades as dificuldades de acesso para pessoas com mobilidade reduzida. O problema está relacionado com as diferentes alturas das plataformas das estações, cuja responsabilidade é da Infraestruturas de Portugal. Contactada pelo JN sobre este problema e quais as medidas para o resolver, a IP não respondeu.
APD questiona o Governo
A Associação Portuguesa de Deficientes (APD) "considera que qualquer alteração ou aquisição de equipamentos deve respeitar as normas técnicas de acessibilidade e convergir sempre, por forma a assegurar a circulação de todos os cidadãos, nomeadamente os que têm mobilidade condicionada".
Uma vez que "o caderno de encargos contempla soluções que dificultam a mobilidade dos cidadãos", a APD revelou ao JN que vai questionar o ministro das Infraestruturas, João Galamba, com conhecimento da secretária de Estado da Inclusão, Ana Sofia Antunes, "para obter esclarecimentos sobre as medidas que irão ser tomadas, na salvaguarda de acessibilidade às carruagens."
A solução apontada pela CP às pessoas com deficiência que precisam de fazer longas distâncias é o serviço Alfa, com carruagens niveladas com as plataformas, corredores mais largos e sanitários mais espaçosos. "Porém, mesmo neste caso não estamos a falar de casas de banho adaptadas", sublinha Sandra Costa, técnica de acessibilidades da APD.
Além disso, o Alfa não chega a todas as cidades. Mesmo uma capital de distrito, como Viana do Castelo, não está abrangida por este serviço. José Senra vê as suas requisições ao SIM serem por vezes rejeitadas pela CP, "porque puseram carruagens do Intercidades a fazer a Linha do Minho". Este utilizador defende que a solução seria acabar com estas carruagens logo que possível e "colocar estruturas para nivelar o chão com as portas das composições em todas as estações, já que fazer obras de remodelação poderá levar muitos anos".