A legislação que proíbe copos, talheres e louças de plástico de uso único criou o "novo" negócio dos reutilizáveis.
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Custam e pesam dez vezes mais e são geralmente importados. Não estão a ser reutilizados, até porque não há regulamentação sobre procedimentos de lavagem e esterilização a adotar pela restauração e hotelaria. Na prática, poluem mais, custam mais e é o consumidor que paga.
Avelino Freitas, presidente da Associação de Pescadores Profissionais e Desportivos do Cais do Ouro (APPDCO), denunciou a nova prática das empresas fornecedoras de bebidas durante as festas de S. João, no Porto: em vez de fornecerem copos, passaram a vendê-los e nem reutilizáveis são. "Já em 2018, pedimos copos reutilizáveis, não havia. Este ano, a Unicer [fornecedora oficial das tasquinhas das associações] não implementou os copos reutilizáveis, mas cobrou-nos os copos descartáveis que antes oferecia", denunciou Avelino Freitas, que estima terem vendido, naquela noite, dois a três mil copos. "A maioria dos copos acaba no rio, todos os pescadores sabem que não se pode deitar redes durante dias após o S. João, vêm cheias de lixo", disse.
Dez vezes mais poluição
A Unicer explicou, ao JN, que tem em curso "a introdução gradual de copos reutilizáveis", mas que "vai levar o seu tempo". Não quis informar o número de copos que distribui anualmente, porém, uma informação deste ano refere que, desde 2016, poupou seis milhões de recipientes descartáveis ou 12 toneladas ao vender copos reutilizáveis em eventos. Com dez vezes mais gramagem e sem recolha obrigatória para reciclagem, há uma grande probabilidade de, afinal, terem sido lançadas ao lixo 120 toneladas de copos. A Central de Cervejas também distribui copos reutilizáveis, mas a troco de uma caução. "A utilização de copos reutilizáveis não deve ser um negócio, mas, sim, um propósito assumido de minimização do impacto ambiental", comentou fonte da empresa dona da Sagres.
Na sequência da denúncia da APPDCO, o Partido Ecologista Os Verdes questionou o Governo para saber de que forma o Ministério do Ambiente incentiva as empresas que fornecem bebidas e os respetivos copos de plástico para que recorram a materiais mais amigos do ambiente. E também se tem conhecimento "deste tipo de aproveitamento, para maximizar os lucros, feito por parte de empresas usando a defesa do ambiente como pretexto".
falta regulamentação
Segundo Mariana Silva, da Comissão Executiva Nacional do PEV, "há a preocupação de que as festas e festivais de verão venham a tornar-se numa fonte de rendimento a reboque da preocupação ecológica". O Governo ainda não respondeu, mas está a acabar o prazo de três meses para o fazer.
O problema não são só os festivais de verão. Em Lisboa e no Porto, por exemplo, os bares já são obrigados a servir nestes copos. Mas ninguém sabe com que rigor são lavados para serem reutilizados, pois falta regulamentação.
Até agora, a Associação Portuguesa das Indústrias de Plástico "não foi consultada sobre estas matérias de extrema relevância, não só para a eficiência dos sistemas de reutilização como da própria segurança alimentar e saúde dos consumidores", lamenta David Pimenta, presidente da APIP.
Saber mais
Uso único - As proibições começam nos sacos degradáveis, passam pelas hastes dos cotonetes e as palhinhas, copos, pratos, talheres, enfim, toda a louça descartável, e acabam nas cuvetes e sacos para pão e frutas e legumes. Até 2023, no máximo, estarão banidos.
Exceções - As louças descartáveis poderão continuar a ser utilizadas em contexto clínico ou hospitalar, bem como em contexto de emergência social ou humanitária.
Porcelana da avó - Menos plástico, mais água e detergentes: as alternativas à louça descartável são a louça "à moda antiga": pratos de cerâmica, copos de cristal, talheres de inox e chávenas de vidro. O pão, os legumes e as frutas são comprados no saco de pano de casa.
Comer a embalagem - Já há louças descartáveis produzidas com cereais e embalagens comestíveis produzidas a partir de açúcar ou até das algas que abundam nos oceanos.
113 milhões - Segundo o Instituto Nacional de Estatística, a indústria nacional vendeu, em 2018, perto de 113 milhões de euros de utensílios de mesa/cozinha de plástico.
1307 milhões - Valia a indústria global do plástico em Portugal em 2017, empregando quase 22 mil pessoas em 951 empresas. Só em embalagens de plástico, exportámos 208 milhões de euros em 2018, principalmente para Espanha, Angola, Reino Unido e França.