O poder das redes: youtuber que abraçou Musk e influencer xenófobo a caminho do Parlamento
Um youtuber cipriota que chegou aos 2,6 milhões de subscritores depois de um abraço a Elon Musk. Um influencer espanhol com meio milhão de seguidores no Telegram, onde difunde boatos, mensagens machistas e xenófobas. O que têm em comum? Formaram os seus próprios partidos e deverão ser eleitos para o Parlamento Europeu.
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Já ninguém tem dúvidas sobre a influência das redes sociais na vida política. Já não são apenas o substituto das desbragadas conversas de café. Veja-se a explosão dos partidos da direita radical populista: boa parte do seu sucesso deve-se à manipulação eficaz de mensagens e vídeos através de plataformas como o Youtube, Facebook, Instagram, Twitter e Tik Tok. E isso trouxe-lhes um exército de eleitores, em particular entre os mais jovens, na Europa, como em Portugal.
Mas a capacidade de eleger e ser eleito através das redes sociais não se limita a partidos organizados. Por estes dias é notícia, em dois países europeus, a provável eleição de dois jovens candidatos que são, afinal, uma espécie de arautos da antipolítica. Um é cipriota e atingiu a fama através do Youtube. Outro é espanhol e destaca-se pelas mensagens desbragadas e politicamente violentas em redes sociais como o Telegram.
Acabou-se a festa, diz o ultra
“Acabou-se a festa”. É a denominação do movimento formado por Luis Pérez, conhecido nas redes como Alvise. Um sevilhano de 34 anos que já tinha passado na política mais tradicional, como assessor de um dos dirigentes principais do Ciudadanos, o partido liberal que está próximo da extinção e já não deverá conseguir eleger qualquer deputado europeu nas eleições de domingo.
Alvise conseguiu reunir as 15 mil assinaturas para concorrer ao Parlamento Europeu e, de acordo com a mais recente sondagem do CIS (instituição de sondagens estatal), poderá chegar aos 3,2% dos votos, o suficiente para se eleger a si próprio e eventualmente um segundo candidato.
Uma das plataformas preferidas de Perez é o Telegram. Tem uma audiência de quase meio milhão de seguidores fiéis, que se entusiasmam com as várias mentiras que vai proferindo sobre políticos e jornalistas (já foi processado e condenado várias vezes por causa disso), bem como com as mensagens xenófobas e machistas.
Apoio dos eleitores mais jovens
De acordo com a imprensa espanhola que está por estes dias a despertar para o fenómeno do “Acabou-se a festa”, o movimento de Perez é catalogado como de extrema-direita. Sendo que a sua principal mensagem política é a de “eliminar a mafia política, mediática e judicial”. Soa familiar?
Um manifesto que está a fazer estragos no principal partido da ultradireita espanhola, o Vox. De acordo com o jornal “El Confidencial”, é a esse partido que Luis Peréz vai buscar boa parte do seu potencial eleitorado. Um eleitorado, acrescente-se, bastante jovem: de acordo com a sondagem do CIS, 9,8% dos eleitores entre 18 e 24 anos declaram que irão votar em Alvise. E nos 25/34 anos serão 9,5%.
Um dos objetivos não declarados do inluencer da direita radical pode muito bem ser outro: se for eleito, conseguirá imunidade parlamentar, e que o pode ajudar pelo menos a adiar os muitos processos judiciais em curso, por difamação de múltiplas personagens da política e do jornalismo espanhol.
Um abraço a Elon Musk
O Chipre é um dos países mais pequenos da Europa. E, por isso mesmo, tem direito apenas a seis deputados no Parlamento Europeu. O que torna o feito de Fidias Panayiotou, um youtuber de 24 anos, ainda mais espetacular. As mais recentes sondagens da ilha mediterrânica, atribuem a este candidato independente um resultado de 8,7%, o que deverá ser suficiente para conquistar um lugar em Estrasburgo.
Fidias é agora um político que admite não saber nada de política. E pelos vistos não precisa. A sua plataforma é o Youtube, onde acumulou um número gigante de subscritores: 2,6 milhões de pessoas, desde que começou, em 2019.
O passo definitivo para a fama foi a sua “gesta” de abraçar uma centena de personalidades do mundo digital. O objetivo final era chegar aquele que mais admira, Elon Musk, o multimilionário dono do “X” (ex-Twitter), da Tesla ou da SpaceX. E conseguiu, como se prova em vídeo no Youtube, onde mais poderia ser?
Candidato que nunca votou
Panayiotou anunciou a candidatura em janeiro passado e, em abril, formalizou-a, ao lado do pai, um padre ortodoxo vestido a rigor. “Nunca votei na minha vida”, reconheceu o Youtuber, acrescentando que não percebe nada de política europeia. Aparentemente, não é uma questão valorizada pelos eleitores cipriotas, país onde a abstenção nestas europeias deverá atingir níveis estratosféricos.
Numa tentativa de explicação da popularidade do jovem youtuber, o politólogo cipriota John Ioannou argumentou, em declarações ao site “politico.eu”, que “o caso Fidias é a definição de pós-política num momento em que a produção de conteúdos é uma prioridade estratégica para a própria União Europeia – para além do planeamento político”. O especialista associa este fenómeno a outros temas, como “o ressurgimento de sentimentos populistas na Europa, a primazia da imagem sobre a ideologia e o imperativo do envolvimento cívico, especialmente entre os novos eleitores de países como Chipre.”