O pior que tem acontecido aos territórios rurais em Portugal, para além de um conjunto complexo de fatores convergentes para a sua desarticulação (fluxos migratórios para os grandes centros urbanos, em especial do litoral, envelhecimento da população e partida dos estratos mais jovens, fraca atividade económica, etc.), tem sido a forma casuística de gestão dos seus recursos naturais. Se no território do interior do país, ou nos seus espaços mais rurais, nos focarmos na floresta, é convicção generalizada de que se tratam de espaços ao abandono, não associados à necessidade de uma gestão eficiente, baseada em conhecimento técnico. Quantas vezes a floresta é vista como um baú onde se pode vender algumas das suas árvores, sempre que há necessidade pontual de que o seu proprietário tenha algum dinheiro extra? Neste contexto há ainda uma diferença enorme entre a atividade agrícola, indiscutivelmente assente em Engenharia Agrícola, e a atividade florestal, nem sempre associada à Engenharia Florestal.
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Os fogos de 2017 vierem colocar a descoberto esta dinâmica de inatividade, de braços caídos, de inoperância perante uma mancha extensa do território. Deu ainda para perceber que, independentemente da propriedade destes espaços, na sua quase totalidade privada e com proprietários que nem sempre conhecem as suas propriedades, os impactos, positivos e negativos, têm repercussões em todo o território, desde logo nas grandes urbes litorais onde se concentra grande parte da população. Este passou a ser um problema de todos e não apenas de alguns.
Mais do que na discussão quase inútil de discutir exclusivamente estruturas de combate, a visão profunda de análise do problema passa pela entrada na mata (o combate está essencialmente associado a um posicionamento no seu exterior), perceber e avaliar as suas potencialidades, geri-las, potenciá-las e, o mais relevante de tudo, valorizá-las. Quando formos capazes de criar dinâmicas que valorizem efetivamente todo o seu potencial que, dada a microproriedade de partida, pode ter de passar por microprojectos integradas, numa escala que pode ser desde logo municipal, mas desejavelmente regional. As questões mais prementes que se devem colocar neste momento, é, que dinâmicas de valorização devem ser criadas em todo o país, no sentido de desenhar janelas de oportunidade de toda esta riqueza territorial. Como consigo reforçar plataformas de apoio técnico a estes territórios e aos seus agentes? Como consigo colocar mais Engenharia Florestal (ainda que a multidisciplinaridade seja fulcral, dada a complexidade da situação) disponível aos cidadãos e ao território? Somos poucos para debater e resolver os problemas. Somos indiscutivelmente muito poucos Engenheiros Florestais. As poucas universidades (apenas 2) e politécnicos (apenas 1), têm aberto poucas vagas e a atratividade que tem tido junto dos jovens não tem sido a desejável. As ofertas de trabalho (certamente em resposta às calamidades de 2017) não têm conseguido dar resposta aos jovens que entretanto se formaram. Os desafios são tão grandes que, a realidade nos vai obrigar a perceber a importância desta área de conhecimento na valorização do nosso território.
O pior que pode acontecer a um País é sentir que o seu território é excessivo para a sua capacidade de gestão, de aproveitamento do que a natureza lhe faculta e que o foco da sua atenção se resume exclusivamente aos espaços onde tem as mais altas densidades de população. O pior que pode acontecer à sociedade é identificar os problemas mas sentir-se cansado de ouvir falar deles e de os debater. Quando nos cansarmos de debater a floresta estamos indiscutivelmente a não conseguir gerir o nosso país e a responder aos desafios que ele nos lança.
Visões otimistas de que somos capazes de olhar para os problemas e de lhes conseguir dar resposta são necessárias. Mesmo porque a realidade nos vai obrigar a ter essa abordagem!
*CENTRO DE INVESTIGAÇÃO E TECNOLOGIAS AGROAMBIENTAIS E BIOLÓGICAS DA UTAD