Entre 2017 e 2019, verificou-se um aumento de quase 12% do número de pedidos de licença parental facultativa por parte do pai a darem entrada nos serviços da Segurança Social.
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Nasceram menos bebés no ano passado, apontam os dados preliminares do Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgados recentemente, mas houve mais bebés a ter o pai em casa a cuidar deles durante mais tempo nos primeiros dias de vida.
De acordo com os dados, o número de subsídios parentais obrigatórios exclusivos do pai está a crescer há três anos consecutivos: se em 2017 foram 62 337 licenças, no ano passado subiu para 67 689. Um crescimento acima de 4% que foi acompanhado por um aumento significativo dos subsídios opcionais que de 56 205 em 2017 passaram a ser 62 810 em 2019 (ver infografia).
Isto significa que, no ano passado, mais de 92% dos pais que gozaram a licença obrigatória não prescindiram da opcional, quando em 2018 - que registou uma subida ligeira de nascimentos - já tinham sido 90%. Em 2016 eram pouco mais de 87% aqueles que decidiam usar as duas.
Na década de 70, a Suécia operou uma pequena revolução na família e introduziu, pela primeira vez, um subsídio para a licença paternal exclusiva. Hoje, mais de metade dos países da União Europeia segue o modelo escandinavo.
Nova lei reforça direitos
É o caso de Portugal, onde este ano entrou em vigor a nova lei da parentalidade, que vem reforçar alguns direitos dos pais, mas sobretudo do pai, que agora goza obrigatoriamente 20 dias úteis, em vez dos 15 anteriores, passando a ter cinco opcionais e não dez como dantes.
"O que é particularmente significativo e mostra a intenção de unir precocemente o pai ao filho, e à mãe, é o facto de os cinco dias adicionais serem imperativamente gozados e de modo consecutivo, a seguir ao nascimento", defende Cristina Rocha, socióloga e professora da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP).
Pai sai da sombra
Não há volta a dar: o papel do pai está a mudar e é cada vez mais relevante. "Podemos inferir que estará em curso uma mudança cultural e institucional muito positiva. Os pais sentir-se-ão mais mobilizados para acompanhar e participar na vida dos seus filhos e da mãe, aquando do nascimento e sentir-se-ão mais seguros a fazê-lo nos seus contextos de trabalho", refere a docente e autora de vários artigos sobre a Sociologia da Família e da Infância.
Há uma valorização crescente da importância do envolvimento do homem quer nos primeiros tempos de vida, quer ao longo de toda a infância da criança, sublinha José Albino Lima, psicólogo e professor da FPCEUP: "Os dados das investigações revelam isso. A tomada de consciência de que o pai pode, e deve, assumir um papel significativo e próximo junto da criança é cada vez mais evidente. Fala-se mesmo de um "novo" papel de pai centrado, para além das outras dimensões, no cuidar, no afeto e em formas de envolvimento ativas no desenvolvimento dos filhos."
A profissionalização do trabalho feminino, as transformações e as configurações na tipologia das famílias, associadas ao aumento significativo de separações e divórcios e as políticas de apoio à família também ajudam a explicar a cada vez maior atenção sobre a paternidade motivada. Que foi sendo traduzida, por exemplo, em políticas específicas no campo da saúde desde os anos 90, observa Cristina Rocha.
"Assistiu-se progressivamente à valorização da presença do pai, por exemplo nas consultas médicas. A existência da criança na vida do pai e do pai na vida da criança tem uma visibilidade cada vez mais acentuada. Há uma mudança cultural significativa, o esbater de um estereótipo de género que acentuadamente atribuía aos cuidados da criança à mãe (ou à avó), ficando o pai na sombra, muitas vezes associado a uma incapacidade de género".