Cerca de 100 bebés nascerão nos próximos meses de barrigas de aluguer. As famílias, portuguesas, estão sem notícias.
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Há dois dias que um casal português está na fronteira da Polónia com a Ucrânia a tentar chegar aos filhos gémeos que nasceram através de gestação de substituição. Os bebés nasceram com 34 semanas e estarão à guarda de uma funcionária da clínica que tratou do processo do casal. Sem teste genético, nem qualquer registo de nascimento, porque todos os organismos públicos ucranianos estão encerrados, os bebés não podem passar a fronteira. Do lado polaco, os pais portugueses, também por causa da guerra, não conseguem entrar no país. Este caso está sinalizado pelas autoridades nacionais, que procuram uma solução para trazer bebés e pais para Portugal. Mas há situações que, aparentemente, não têm solução à vista.
A Ucrânia permite realizar legalmente a gestação de substituição (ou barrigas de aluguer) e há cerca de cem gravidezes já concretizadas que ninguém arrisca dizer como vão terminar. "Sabemos que há nascimentos previstos para março e os pais não estão a conseguir contactar as clínicas onde fizeram a fertilização e não sabem quem são as gestantes nem se estão em segurança", disse ao JN Cláudia Bancaleiro, da direção da Associação Portuguesa de Fertilidade (APF).
Desde o início da guerra que se avolumam as dúvidas e pedidos de esclarecimento à APF, diretamente ou através dos vários grupos criados pelos casais nas redes sociais. Nos grupos, a angústia dos pais é evidente: "Não sei onde está a gestante, mas o meu filho ainda não nasceu e já está perdido no meio da guerra. Tanto lutei pelo meu filho e agora não sei, sequer, onde está", escreveu uma mãe. Uma das soluções para ajudar a localizar os bebés seria as clínicas fornecerem aos pais a identificação e o contacto das gestantes. Desta forma, os pais poderiam tentar encontrar os bebés. "Mas está tudo destruído ou encerrado", referiu a mesma fonte.
Na prática, quem recorre à gestação de substituição são casais ou mulheres inférteis que, não o podendo fazer legalmente em Portugal, optam por esta técnica na Ucrânia, onde existem pelo menos duas empresas (Successful Parents Agency e a BioTexCom) com uma significativa procura por casais portugueses. "Pelo que sabemos, tudo é feito legalmente e tudo corre bem mas, com a guerra, saiu tudo fora de controlo", referiu ainda Cláudia Bancaleiro.
O silêncio das clínicas
Joana Freire, que gere vários grupos de discussão sobre a gestação de substituição, garante que há "grande apreensão por parte dos casais", que têm muitas dúvidas e incertezas", aumentadas pelo silêncio da parte das empresas.
"Alguns casais que já tinham decidido recorrer a estas empresas tiveram de adiar, outros que já começaram os procedimentos não sabem como ou quando é que vão terminá-los e até há casos de casais cujo nascimento da criança está previsto para daqui a pouco tempo", explicou.
O maior receio é que a guerra impeça a circulação e se torne impossível ir buscar os bebés para trazer para Portugal após o seu nascimento. "Muitas destas pessoas passaram por processos longos até tomarem esta decisão e agora receiam que o seu sonho, à beira de ser concretizado, vá por água abaixo", finalizou Joana Freire.
Perguntas e Respostas
O que é preciso fazer para recorrer a uma gestação de substituição na Ucrânia?
Segundo os pais contactados pelo JN, o primeiro passo é procurar na internet as várias clínicas que disponibilizam este serviço a estrangeiros. Escolhida a clínica, deve apostilar a certidão de casamento (o serviço só é prestado a casais heterossexuais) e relatórios médicos que comprovem que a mãe não pode engravidar. Cada clínica tem procedimentos próprios.
Quanto custa?
O valor varia conforme o contrato feito com a clínica e pode andar entre os 30 mil e os 50 mil euros por inseminação. As consultas durante a gravidez e os exames são comunicados ao casal e, se pretender, este pode falar ao telefone ou por videochamada com os médicos que atendem a gestante.
É preciso fazer algum contrato legal?
É recomendável. Normalmente, a clínica trata de propor um contrato entre o casal e a gestante e a própria instituição que realiza a fertilização. A gestante nega qualquer direito sobre o bebé.