Federação pela Vida diz que, depois da crise, "não faz sentido" pedir aos médicos que "matem pessoas nos hospitais". Partidos não recuam.
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A Federação Portuguesa pela Vida (FPV) desafia os cinco partidos com projetos de lei sobre a eutanásia a retirem os diplomas. Para o vice-presidente da FPV, António Pinheiro Torres, "não faz sentido" pedir aos médicos "que matem pessoas nos hospitais", depois de terem andado a lutar pela vida, sobretudo dos mais idosos, durante a pandemia da Covid-19. PS, BE, PEV, PAN e Iniciativa Liberal (IL) recusam o repto e garantem que o processo legislativo será retomado, assim que o Parlamento esteja a funcionar em pleno.
"Parece-nos que depois disto, da consciência de que os profissionais de saúde estão a dar pela vida de todos, com a consciência mais viva do abandono dos idosos, é natural que sejam retirados os projetos de lei", defende António Pinheiro Torres, adiantando que foi com essa expectativa que a FPV suspendeu o processo de pedido de um referendo à eutanásia, que já conta com 76 mil assinaturas. "Não faz sentido pensar que, depois disto, vamos pedir aos profissionais de saúde que matem as pessoas nos hospitais. Não se justifica", reforça o vice-presidente da FPV, adiantando que, depois da retoma da normalidade dos trabalhos parlamentares, a Federação vai fazer "um convite aos partidos para repensarem o assunto".
"Explora a emoção e o medo"
Os cinco partidos autores dos projetos de lei, que se encontram a ser analisados em especialidade, recusam o repto da FPV. Para o BE, até foi feito de uma forma "totalmente desonesta", porque procura "explorar a emoção e o medo que está a ser criado pela pandemia".
"Do que se trata evidentemente não é de qualquer decisão relativamente a velhinhos mas o respeito pela decisão de quem está em sofrimento", vinca o deputado José Manuel Pureza, reiterando o empenho do BE no trabalho na especialidade. Recorde-se que já foi constituído um grupo de trabalho, coordenado pela deputada social-democrata Mónica Quintela.
André Silva concorda que se trata de uma "declaração de mau gosto" e que, "nos moldes em que o assunto é abordado", é um "desrespeito". "Assim que a Assembleia da República regresse à normalidade, o processo legislativo seguirá o seu curso", assegura, ao JN, o deputado e porta-voz do PAN.
"O processo legislativo será retomado, assim que seja possível e a Federação pela Vida também será chamada a pronunciar-se. Não vamos retirar o projeto e o processo vai até ao fim", reafirma a deputada socialista Maria Antónia Almeida Santos, considerando que o diploma do PS "é equilibrado".
Os Verdes seguem a mesma linha de recusar retirar o seu projeto de lei, assim como a Iniciativa Liberal, que lamenta a "instrumentalização de emoções". "O desafio lançado pela FPV não faz sentido. Seria como a IL lançar um desafio à FPV para suspender a sua atividade", crê o partido de João Cotrim Figueiredo.
Parlamento já tem desde fevereiro pedido de referendo
A Federação pela Vida só retomará a luta por um referendo à eutanásia se o trabalho na especialidade prosseguir. Com 76 mil assinaturas, poderá desencadear uma iniciativa popular. Mas já está, desde fevereiro, no Parlamento, uma petição a pedir um referendo. Com quatro mil assinaturas, garante a sua discussão, mas terá que ser acompanhada por um projeto de um partido. Na petição de Diniz Freitas, professor catedrático da Faculdade de Medicina de Coimbra, considera-se que a eutanásia é "um retrocesso cultural e civilizacional". "É a última arma que temos para travar a eutanásia", admite Diniz Freitas, considerando sagrado o juramento que médicos como ele fizeram "a favor da vida". No PSD, Pedro Rodrigues já exigiu que o partido pedisse um referendo. A discussão interna está parada por causa da pandemia. "Não é oportuno neste momento discutir o assunto", crê.
128 votos favoráveis ao projeto socialista
Foi o projeto de lei mais votado dos cinco, aprovados a 20 de fevereiro passado. O diploma do PS recebeu 128 votos favoráveis, o do BE 126, o do PAN 122, e os do PEV e do IL receberam, cada um, 115 votos a favor.
5 países europeus aceitam a eutanásia
Holanda e Bélgica foram os primeiros países europeus a legalizarem a eutanásia em 2002. Seguiu-se a Suíça e o Luxemburgo. O caso mais recente, em 12 de fevereiro, foi a Espanha.