Pediatra realça bom senso dos pais portugueses na vacinação e critica desinformação
O pediatra Gonçalo Cordeiro Ferreira considera que, em Portugal, "há muito bom senso" por parte dos pais na vacinação dos filhos, ao contrário de outros países onde os movimentos antivacinas têm vindo a ganhar força.
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Na véspera da celebração dos 60 anos do Programa Nacional de Vacinação (PNV), o antigo diretor de Pediatria no Hospital Dona Estefânia, em Lisboa - onde trabalhou cerca de quatro décadas -, destacou, em entrevista à Lusa, a importância das vacinas e alertou para os perigos da desinformação e dos movimentos antivacinas.
Para o especialista, os discursos antivacinação, alguns protagonizados por líderes políticos, "são feitos por pessoas que não tiveram experiência de ver crianças doentes".
"É o mínimo que posso dizer", comentou, sublinhando que as epidemias de sarampo que têm acontecido no sul dos Estados Unidos, por exemplo, "já deviam ser suficientes para abrirem os olhos".
Segundo Gonçalo Cordeiro Ferreira, este tipo de discurso resulta, por um lado, de "uma cegueira por estarem num sítio confortável em que não lhes chegam essas doenças nem aos seus próximos", e, por outro lado, de uma questão político-filosófica que não acontece apenas nos Estados Unidos.
"Há países muito refratários no uso de vacinas, como por exemplo, os países da Europa Oriental que estiveram na influência soviética", observou, explicando que, nesses contextos, as vacinas são vistas como "uma imposição do Estado".
"Não percebem a bondade da vacina", encarando-a como "um atentado à sua liberdade", mas é um erro: "Este é o bom peso de uma organização do Estado, que é a prevenção da doença através de um instrumento seguríssimo que são as vacinas", realçou.
O pediatra realçou que, "felizmente, em Portugal" a hesitação vacinal é pouco significativa, tendo sempre havido "uma grande aceitação" do PNV, sobretudo quando foram feitas campanhas de sensibilização.
"Em Portugal há muito bom senso da parte dos pais", reforçou, acrescentando que até a comunidade imigrante que chega ao país adere ao programa vacinação, o que atribui também ao trabalho realizado pelos centros de saúde.
Segundo o relatório anual 2024 do PNV, Portugal mantém-se como referência internacional na vacinação, com 98% a 99% das crianças vacinadas no primeiro ano de vida, assim como as coberturas vacinais até aos seis anos, atingindo ou ultrapassando, no geral, a meta dos 95%"
O especialista recordou que, no passado, situações como uma constipação ou o facto de faltar um dia para a idade recomendada eram motivos para adiar a vacinação.
"Hoje em dia isso já não acontece. Os profissionais estão, de facto, muito mais bem informados, a nível da enfermagem, nos centros de saúde e aproveitam a presença das pessoas para as vacinar", salientou.
Cordeiro Ferreira lamentou, no entanto, que sejam os próprios profissionais a darem "tiros nos pés", como aconteceu durante a pandemia da covid-19, quando alguns médicos vieram a público questionar a segurança da vacina, o que considerou "ser perigoso" porque indiretamente retira credibilidade às outras vacinas.
"Mas as famílias sabem a importância que têm as vacinas", assegurou.
O médico destacou ainda os avanços na forma como as vacinas são administradas, como a utilização de vacinas combinadas (hexavalentes), que permite reduzir o número de injeções.
"Tudo está a evoluir para ser mais cómodo, tanto para quem dá como para quem recebe a vacina".