Preparar e pagar as cerimónias fúnebres em antecipação continua a ganhar adeptos. Na Servilusa fazem-se em média 100 contratos em vida por ano.
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Há quem defina a lista de convidados, escolha a indumentária, o perfume, a maquilhagem, a banda sonora do velório e ter uma reportagem fotográfica e vídeo da cerimónia. Escolhe-se o carro que vai transportar a urna e até se faz um roteiro do cortejo. No Dia de Finados, fomos à descoberta dos pedidos mais inusitados dos portugueses que pagam antecipadamente o seu funeral e o organizam ao detalhe.
São pessoas acima dos 65 anos, que vivem sozinhas, sem familiares próximos ou que "querem poupar a família financeira e emocionalmente, libertá-la de decisões difíceis num momento de tristeza", explica Paulo Moniz Carreira, diretor-geral de negócio da Servilusa.
A maior agência funerária do país celebra, em média, por ano, 100 contratos de funeral em vida - no total, já firmou 700. Disponibiliza seis planos: o mais barato ronda os 1.900 euros, o mais caro pode atingir facilmente os 18 mil euros, já que contempla uma urna especial para jazigo numa madeira importada que pode durar mais de um século. Mas os valores podem "ir muito mais além", tudo depende dos desejos do cliente. E o cardápio de extras é longo.
O cardápio de extras
O lançamento das cinzas ao mar - que inclui o transporte de familiares e amigos num iate, num veleiro ou lancha - é uma das opções preferidas, a par da colocação das cinzas numa urna biodegradável num jardim para fazer crescer uma árvore. Mas há também quem queira ter a música de um violino, de uma harpa ou uma cantoria lírica na cerimónia. E quem escolha um sidecar para levar o caixão e um minibus para transportar a família e até quem desenhe o percurso do cortejo, fazendo-o passar por um lugar importante em vida, como um estádio de futebol ou uma praça de touros.
"Por vezes surgem pedidos mais invulgares. Há quem não queira que certas pessoas estejam presentes no funeral, escolha o perfume, a forma como quer ser maquilhada, o vestido...", conta Vasco Simões da agência "A Lusitana".
A procura nas pequenas e médias funerárias ainda é reduzida. "Enquanto a Segurança Social comparticipar com um valor substancial para ajuda das despesas de funeral, a preparação em vida será reduzida", defende Carlos Almeida, presidente da Associação Nacional de Empresas Lutuosas, que, ainda assim, vai lançar um "Plano Poupança Funeral".
Esta é uma prática muito comum nos EUA e em vários países da Europa, que por cá ainda está a ganhar raízes, observa a socióloga e investigadora Clara Saraiva.
"O cenário da morte mudou muito em Portugal nos últimos 30 anos. Basta ver que a cremação continua a aumentar, quando antes era um assunto de elites de esquerda, intelectuais, que não eram normalmente seguidoras do catolicismo. A própria atitude perante a tanatopraxia [técnica de conservação do cadáver] também mudou. Por isso, é possível que a mentalidade também esteja a mudar perante os contratos de funeral em vida".