Quando país continua sem regiões, os dado da OCDE ajudam a avaliar modelos. Especialista quer simplificar referendo.
Corpo do artigo
Desenvolvimento e descentralização são indissociáveis na hora de discutir a regionalização. Ambos os indicadores caminham lado a lado. Portugal é o sexto país mais centralizado da OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, com um rácio de despesas públicas feitas ao nível subnacional em relação ao produto interno bruto (PIB) muito baixo.
São perto de 6% quando, por exemplo, aquele rácio é de 33% na Dinamarca, país ainda mais pequeno do que Portugal. Em contrapartida, o nosso país era o 27.º, a contar do fim, em matéria de PIB per capita numa lista que, em 2018, incluiu 35 membros.
Espanha, estado vizinho composto por regiões, era apenas o 29.º país da OCDE mais centralizado e estava em 21.º lugar (com 21%) na análise do PIB per capita.
Joaquim Oliveira Martins, ex-chefe da Divisão de Política e Desenvolvimento Regional da OCDE que participa esta quarta-feira na conferência JN, DN e TSF sobre regionalização, em Lisboa, sublinhou a pertinência daqueles dados para uma análise comparativa, notando que estes anos de pandemia introduzem perturbações na leitura estatística destas matérias.
Receios sem evidência
O economista e investigador destacou ao JN que são poucos os países na Europa sem regiões administrativas. Quase todo o continente tem um nível intermédio de governação. Embora ressalvando que não é possível estabelecer uma relação direta de causa-efeito entre desenvolvimento e descentralização, diz não haver dúvidas de que são "comitentes".
Este adepto de regiões administrativas nota ainda não terem fundamento os receios de que regionalização e descentralização criem pressão sobre despesa e emprego públicos, notando que não existe evidência estatística que permita fazer essa relação. A propósito, refuta cinco "ideias preconcebidas".
De qualquer modo, o processo de descentralização terá de ser "bem feito", alerta o responsável.
Uma coisa é certa: Joaquim Oliveira Martins não tem dúvidas de que a descentralização ajuda os governos centrais a terem maior eficácia e capacidade de gestão. E crê que será possível existir na próxima legislatura entendimento para um acordo de regime que permita avançar com a regionalização, defendendo o mapa das cinco regiões por ser o mais consensual.
Revisão constitucional
Quanto ao referendo, que António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa apontam para 2024, Joaquim Oliveira Martins chama a atenção para as "armadilhas", considerando que se deve fazer "uma revisão constitucional para que não tenha de haver mais de 50%" nas urnas, perante os elevados níveis de abstenção no país, e para "se retirar a obrigação de maioria de votos em cada região a criar".
Antes da regionalização, enumerou outros passos a dar em Portugal, como o reforço das áreas metropolitanas e a possibilidade de municípios cooperarem fora do espaço das suas comunidades intermunicipais. Sobre o atual processo de descentralização para as autarquias, considera ser "perigoso" quando a intenção anunciada é criar um poder regional para o qual terão de passar competências dos poderes central e local.
Ideias a desmontar
Tamanho do país não conta
Uma ideia preconcebida que Joaquim Oliveira Martins rejeita é a de que a regionalização não se justifica num país pequeno. O que conta é a "heterogeneidade", contrapõe, notando que Dinamarca e Holanda são países pequenos e isso não impediu a sua descentralização.
Corrupção
Do mesmo modo, nota não haver "qualquer evidência" nos países da OCDE, bem "pelo contrário", de que a descentralização aumenta a corrupção.
Despesa pública
Em terceiro lugar, assegura que também "não há evidência" que permita relacionar descentralização e despesa pública.
Emprego
O receio dos antirregionalistas de que poderes descentralizados trarão mais emprego público também é rejeitado por Joaquim Oliveira Martins. Mas "o processo tem de ser bem feito" e sem duplicações, avisa.
Regionalização desagrega
Diz não haver esse risco e que trará mais unidade e respeito pelas diferenças regionais.