Portugal já espiou jornalistas e um ex-primeiro-ministro e vendeu segredos aos russos
A vida dos espiões portugueses estará longe do glamour da retratada nos filmes do James Bond, mas os escândalos que eles, ou os serviços para os quais trabalham, têm protagonizado já davam um razoável argumento para Hollywood. E se o filme não fosse de ação teria, seguramente, alguns bons momentos de comédia.
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Desde relatórios secretos publicados em órgãos de comunicação social, a espiões a vender segredos aos russos, passando por um ministro a divulgar a lista de quem deveria estar na sombra, ou um "super-espião" a vasculhar a vida de um jornalista e de um grande patrão da Comunicação Social, há de tudo um pouco.
O "top secret" de Portugal estriba-se no Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), organismo coordenador de duas "agências": o SIS (Serviço de Informações de Segurança) e o SIED (Serviço de Informações Estratégicas de Defesa). Difícil falar dos sucessos de uma atividade que deve decorrer longe dos holofotes mediáticos, mas os deslizes dificilmente passam despercebidos.
A mais recente polémica envolve a recuperação de um computador, alegadamente furtado por Frederico Pinheiro, ex-adjunto do ministro das Infraestruturas, João Galamba. O governante terá contactado o SIS, que recuperou o portátil com documentos classificados, mas alguém se terá esquecido de informar a Polícia Judiciária, que tentou reaver o equipamento.
Super-espião condenado
Jorge Silva Carvalho, conhecido como o "super-espião", entrou para o SIS em 1991 e chegou a diretor do SIED em 2008, cargo onde se manteve até 2010. No ano seguinte deu o salto para o setor privado, ingressando como administrador na Ongoing (empresa na área das telecomunicações e media).
Em 2016 ficou a saber-se, em tribunal, quando foi julgado por violação do segredo do Estado, por ter mando espiar a faturação telefónica de um jornalista do Público e por ter devassado a vida privada de Pinto Balsemão, que usou o SIED para recolher informações para o seu futuro empregador (embora disso não tenha retirado proveitos pessoais segundo o acórdão).
Mas ficou igualmente provado que mandou espiar o jornalista, autor de notícias sobre o SIED que Jorge Silva Carvalho entendia que prejudicavam. E que foi encontrado no seu computador um relatório sobre a vida íntima e profissional do antigo primeiro ministro.
Acabou por ser condenado a quatro anos e seis meses de prisão, pena que o Tribunal entendeu suspender por igual período.
Vendeu segredos aos russos
Frederico Carvalhão Gil tem, seguramente, um lugar na história do SIS, pois terá sido o único espião português detido por vender segredos aos... russos, em 2015.
O espião foi detido, em Roma, Itália, quando vendia segredos do país e da NATO a um espião ao serviço do Serviço Externo da Federação Russa (SVR). Vendeu a alma ao Diabo por 10 mil euros e acabaria por ser condenado a uma pena de sete anos e quatro meses de prisão.
Como nota de rodapé, refira-se que em 2019, já depois de ter sido condenado, continuava a receber mensalmente o seu salário de "espião": 2500 euros líquidos.
Ministros transparentes
Em 1999 não caiu o "Carmo e a Trindade", mas o Forte Dom Carlos tremeu. É ali que funciona a sede do SIS e onde caiu como uma bomba a divulgação por Veiga Simão (falecido em 2014), à data ministro da Defesa Nacional, do nome de 69 espiões e detalhes de operações em que haviam participado.
A lista fora entregue numa comissão parlamentar, que integrava 22 deputados mas acabaria publicada no semanário "O Independente". E Veiga Simão demitiu-se no mesmo dia.
Em 2010 foi a vez de Augusto Santos Silva, na qualidade de ministro da Defesa, se descuidar e referir, numa entrevista, que Portugal ia ter uma célula de espiões no Líbano. E que, antes dela, seria enviada uma equipa para o Afeganistão...