A lista de produtos isentos de IVA anunciada por Costa chega esta terça-feira ao Parlamento e dura entre abril e outubro. Retalhistas só ajustam preços 15 dias depois da publicação da lei.
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Entre o próximo mês e outubro, os consumidores não pagarão IVA em 44 bens alimentares, numa lista com taxa zero. Mas, no total, a poupança não chega aos oito euros numa seleção de produtos que o JN fez na loja online do Continente com os artigos mais baratos (baixa de 127,35 para 119,56 euros, menos 7,79). Do pão à batata, dos brócolos ao melão, ou ainda do feijão às ervilhas, o cabaz apresentado pelo Governo tem um pouco de tudo, sem esquecer o leite, o queijo, a sardinha, o bacalhau e o azeite. A proposta de lei dá hoje entrada no Parlamento, após o Conselho de Ministros ter reunido ontem para a aprovar, segundo anunciou António Costa.
Porque "é preciso falar com clareza para não criar ilusões", explicou que só "15 dias após a publicação da lei, o retalho alimentar procederá à redução do preço em conformidade com a redução do IVA". Só então os consumidores sentirão a baixa de preços. Avisou que, antes da entrada em vigor, a medida "requer uma aprovação de lei na Assembleia da República", pedindo "a maior rapidez aos partidos" para que o debate da proposta seja agendado e Marcelo Rebelo de Sousa a possa promulgar.
Programa de 600 milhões de euros
Após ter anunciado um programa que custará ao Governo 600 milhões de euros e que, para além do cabaz isento de IVA, inclui também um reforço do apoio à produção, António Costa explicou que o Conselho de Ministros iria ainda ontem reunir por via eletrónica para aprovar a proposta de lei que dá hoje entrada na Assembleia.
O Governo assinou um pacto para a estabilização e redução de preços dos bens alimentares com o diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), Gonçalo Lobo Xavier, e com o presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), Eduardo Oliveira e Sousa.
"Contamos seguramente com o empenho de todas as forças políticas para que a Assembleia possa agendar com a maior rapidez possível esta proposta de lei, a possa tramitar com a maior urgência possível e que o presidente da República a possa promulgar".
Os 44 produtos resultaram da articulação entre duas listas. Por um lado, uma compilação do Ministro da Saúde feita de acordo com a Roda dos Alimentos para garantir uma alimentação saudável, conforme propôs a Ordem dos Nutricionistas (ler entrevista na página seguinte). Por outro lado, a lista apresentada pela APED, em que o critério foi diferente e prendeu-se com os alimentos mais comprados no mercado nacional.
"Não foi fácil"
O chefe de Governo admitiu que as negociações foram difíceis. Aliás, nos últimos dias, a medida gerou críticas e avisos por parte de retalhistas e de produtores.
"Não foi fácil nos sentarmos todos à mesa. Naturalmente, há pontos de vista diversos e foi preciso um grande esforço para compreendermos que o que os portugueses esperam de nós não é que ralhemos uns aos outros", sublinhou Costa. Mas "casa onde há inflação todos ralham e todos têm a sua parte da razão", sublinhou, no arranque da intervenção.
O acordo que permitiu chegar à lista de 44 alimentos foi feito com "boa fé entre todos", assegurou ainda, esperando que os apoios destinados à produção permitam ir mais longe e fazer outras reduções. Embora compreenda as dificuldades que os agricultores enfrentam pela subida dos custos de energia e de produção, e se mostre solidário também com os retalhistas que se queixam dos aumentos a montante, António Costa sublinhou que a "parte de leão cabe aos consumidores".
Se fosse às compras com o IVA já a zero, gastaria 119,5 euros na compra do cabaz de 44 alimentos anunciados pelo Governo. Poupança é de 7,79 euros.
Restaurantes não vão baixar preços
Para o setor da restauração, o IVA a 0% para alguns alimentos não terá impacto no preço final praticado ao consumidor. Ou seja, os restaurantes e similares não vão fazer repercutir nos preços das refeições o que vão poupar quando forem às compras. Os representantes da restauração só entendem que a baixa de preços nos estabelecimentos só seria possível se houvesse também uma redução do IVA na restauração. Para o presidente da PRO.VAR - Associação para a Defesa, Promoção e Inovação dos Restaurantes de Portugal, "do ponto de vista do consumidor", o IVA a 0% "não terá qualquer efeito, porque o restaurante entrega na mesma o produto a 13%". O que poderia acontecer, defendeu, se o IVA da restauração, "a par desta descida, reduzisse de 13% para 6%".
Também a secretária-geral da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), Ana Jacinto, afastou a possibilidade de repercutir o IVA a 0% nos produtos vendidos pelos seus associados. "Para o consumidor qualquer redução de IVA poderá ser uma medida positiva se de facto se traduzir numa efetiva diminuição de custo. Porém e porque o IVA é um imposto do consumidor final, para as nossas empresas não há qualquer impacto, porque deixamos de ter IVA a deduzir das compras, mas passamos a ter mais IVA a pagar nas vendas, e por isso, no apuramento das contas o efeito é nulo", explicou a responsável ao JN.
Ana Jacinto recordou ainda que o setor da restauração "está a absorver uma parte muito significativa dos aumentos dos produtos alimentares, não repercutindo esse aumento nos seus preços". A responsável da AHRESP mostra que, segundo os dados do INE, a inflação nos produtos alimentares registou uma variação homóloga de 21,5%, face a fevereiro 2022, e nos restaurantes, cafés e similares, ela chegou 10,4%.