O preço dos medicamentos não é a única razão da falta de medicamentos no mercado: há também problemas de matérias-primas e exportação paralela. Quem o defendeu foi Hélder Mota Filipe, bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, ouvido quarta-feira na comissão de Saúde da Assembleia da República , a pedido do Chega.
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"O resultado é sempre o mesmo: o doente não ter acesso ao medicamento em tempo útil. Mas as razões são muito diversificadas", apontou o bastonário, defendendo que é necessário fazer uma avaliação caso a caso das causas da rutura, de modo a ser adotada a solução mais adequada.
Segundo o bastonário, a rutura dos medicamentos, que definiu como uma situação em que o "mercado deixa de estar abastecido por tempo prolongado", é um problema europeu, mas sublinhou que Portugal tem "condições particulares que permitem que o problema se agrave", nomeadamente o mecanismo anual de revisão de preços.
"Tem a sua vantagem, que é o SNS [Serviço Nacional de Saúde] pagar menos, em vez de pagar mais, e manter o acesso. Mas faz com que esta revisão seja sempre para manter ou baixar [o preço]. Só muito excecionalmente se pode aumentar", afirmou.
Nestas situações, defende que é preciso perceber quando o medicamento deixa de ter sustentabilidade para se manter no mercado e "ter um mecanismo célere para rever adequadamente o preço nestes casos".
Outra das causas que apontou foi a exportação paralela de medicamentos, explicando que esta acontece devido à diferença de preços nos diversos países da Europa e que, defendeu, se for excessiva pode levar a um desequilíbrio, devendo que deve ser monitorizada.
"Exportar demais para mercados que pagam mais, pode levar a situações de rutura", alertou, acrescentando que o Infarmed tem uma lista de medicamentos cuja exportação pode não ser autorizada em alguns momentos, para evitar que Portugal se depare com uma falta de acesso.
A falta de matérias-primas e de substâncias ativas foi outra das causas para o problema apontadas pelo bastonário, que reconheceu, no entanto, que este é um problema de toda a Europa.
Como possíveis soluções, Hélder Mota Filipe sublinhou a importância de Portugal ter "uma verdadeira reserva estratégica" de medicamentos que, no seu entendimento, poderia "amortecer significativamente o efeito de uma falta de medicamentos".
"Na minha opinião, a reserva que temos não responde às necessidades de uma sociedade moderna. Manter nos hospitais e no laboratório militar um armazém estático de produtos que podem ser úteis em situações de crise não resolve o problema, pois passa a validade e, depois, os medicamentos não podem ser usados", alertou.
Também o presidente do Infarmed, Rui Santos Ivo, que foi ouvido na mesma comissão, revelou que entre janeiro e outubro de 2022 o Infarmed impediu a exportação de 1 milhão e 690 mil unidades de medicamentos.
Rui Santos Ivo defendeu ser preciso cuidado em relação à reserva de medicamentos. "Não queremos criar nenhum mecanismo que em vez de facilitar o acesso aos medicamentos fosse uma espécie de açambarcamento feito pelas autoridades e pelos Governos", declarou.