Até terça-feira, foram adquiridos bens e serviços no valor de seis milhões de euros. Nenhum foi contratado por concurso público ou por consulta prévia.
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A Estrutura de Missão para a Presidência do Conselho da União Europeia compra todos os bens e serviços por ajuste direto. Até terça-feira, nenhum dos 145 contratos assinados passou por um concurso público ou pelo processo de consulta prévia a vários fornecedores. E quase metade ultrapassa o limite previsto na lei portuguesa - o que lhe é permitido graças a uma exceção criada na legislação sobre o Orçamento do Estado nacional. "Pode ser legal, mas não ser correto", diz Susana Coroado, da Transparência e Integridade.
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A exceção à regra permite que a Estrutura de Missão ultrapasse o limite de 20 mil euros previsto no Código de Contratos Públicos, para a compra de bens ou serviços por ajuste direto. Ao invés, pode ir até ao máximo previsto numa diretiva da União Europeia e que vai dos 139 até aos 750 mil euros, consoante o tipo de contrato. A possibilidade foi invocada em mais de cem dos contratos publicados no Portal Base, entre dezembro de 2019 e o final do dia de ontem.
O JN questionou a Estrutura de Missão sobre a razão pela qual só optou por ajustes diretos, cujo uso abusivo tem sido criticado por entidades como o Tribunal de Contas ou a Transparência e Integridade. Em resposta, fonte oficial assegurou não existir "qualquer princípio ou orientação" nesse sentido e garantiu ter realizado "consultas de mercado a diversas entidades". No Portal Base, onde são publicados todos os contratos públicos, não consta qualquer procedimento além do ajuste direto.
Quanto aos critérios seguidos para escolher as empresas contratadas, a mesma fonte referiu o preço proposto, bem como critérios como a "sustentabilidade da operação," a "eficiência (capacidade de resposta imediata/flexibilidade em termos de prazos e de alterações de última hora)" ou a capacidade para atingir os "padrões de qualidade" exigidos.
A Estrutura de Missão diz, ainda, que a lei "não proíbe a realização de concursos públicos, mas também não [os] impõe".
Contratada empresa com 15 dias
Um cruzamento de dados do Portal Base e do Ministério da Justiça mostra que, pelo menos, três contratadas são recém-nascidas. A Factos e Episódios, por exemplo, assinou um contrato para produzir o filme tema da presidência apenas duas semanas depois de ter sido constituída, por quase 95 mil euros. No caso da Gentilobras, decorreu um mês entre a escritura de arranque e o contrato para a "realização de pinturas" no Centro Cultural de Belém (sede da Estrutura de Missão), por 11 629 euros. E a Glaudiusucess tinha perto de quatro meses quando foi contratada para fornecer máscaras e porta-máscaras, por 99 750 euros.
Ao JN, a Estrutura de Missão justificou a escolha destas empresas com o facto de não fazer "qualquer discriminação positiva ou negativa sobre a contratação com empresas com maior antiguidade ou mais recentes no mercado".
"A exceção torna-se a regra"
O Código de Contratos Públicos prevê que as entidades do Estado comprem bens e serviços, ou contratem empreitadas, por concurso público ou por consulta prévia, com convite a, pelo menos, três entidades, além do ajuste direto.
Há muito que a Transparência e Integridade critica o uso excessivo do ajuste direto, e as justificações da Estrutura de Missão, disse Susana Coroado, não colhem: "Dizer que está de acordo com a lei é um excesso de formalismo" que "não respeita a boa gestão do dinheiro público".