Adesão à União Europeia, língua comum e estabilidade política e económica fazem com que brasileiros procurem o mesmo que nós no passado: trabalho.
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Estima-se que, atualmente, existam tantos portugueses a viver no Brasil quanto brasileiros a residir em Portugal. Serão pouco mais de 200 mil em cada um dos países. Mas se a emigração portuguesa remonta ao século XVIII, a que acontece em sentido contrário - e que está agora a atingir números nunca antes alcançados - só começou a ter maior expressão a partir dos anos 2000. O historiador e analista político brasileiro José Murilo de Carvalho diz que, atualmente, Portugal foi "invadido" por estudantes e imigrantes brasileiros que vêm com um único propósito: "em busca de emprego e de formação académica".
José Murilo de Carvalho, também analista político e membro da Academia Brasileira de Ciências, recorda que "a emigração portuguesa para o Brasil teve altos e baixos". "A descoberta do outro fez com que, no século XVIII, chegassem uns 600 mil imigrantes. Outras grandes ondas deram-se nas primeiras três décadas do século XX e nas décadas de 1950 e de 1960", contextualiza o historiador, ao JN, sublinhando que, "hoje, pela primeira vez, temos emigração brasileira para Portugal".
"Irritação" com sotaque
Mas, afinal, o que procuraram esses fluxos migratórios do passado - de cá para lá - e o que busca o atual, de lá para cá? Para Murilo de Carvalho a resposta é simples: "Em ambos os casos, a motivação é a mesma: emprego". "Portugal precisa de mão de obra e o Brasil tem excesso de desempregados e de subempregados", sublinha, ainda.
O "medíocre crescimento da economia brasileira, nas últimas décadas", provocou, segundo Murilo de Carvalho, a busca de emprego no exterior. Primeiro, nos Estados Unidos e, depois, em Portugal. "Libertadas as colónias e livre da ditadura salazarista, Portugal aninhou-se na União Europeia, adquirindo estabilidade política e económica. De exportador de mão de obra, passou a ser importador. E a língua comum facilitou a adaptação dos brasileiros", frisa o historiador. Além disso, sublinha o facto de o mercado português estar em busca de mão de obra e de o Governo "facilitar a entrada de migrantes".
No entanto, no entender do analista político brasileiro, há "percalços" no processo, "sobretudo, a irritação dos portugueses com a gramática e a pronúncia do português brasileiro". Murilo de Carvalho ressalva que as universidades portuguesas têm beneficiado da presença de estudantes brasileiros, sendo os mesmos "fonte de recursos". Mesmo que "os professores torçam o nariz diante da pronúncia e da gramática do português falado no Brasil".
Um país "moderno"
Pedro Góis, sociólogo e investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, também atribui ao turismo um papel importante na imagem que Portugal passou a ter lá fora e, consequentemente, na vontade de os brasileiros virem residir para o nosso país.
"Há cerca de dez anos, um fluxo turístico de brasileiros passou a levar uma imagem de Portugal diferente para o Brasil. Leva uma Lisboa cosmopolita, um país com qualidade de infraestruturas e moderno, que remunera melhor do que o Brasil. Talvez seja esse o sucesso", analisa.
À lupa
Residentes
Segundo o Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo, do SEF, em 2021 residiam em Portugal 204 mil brasileiros. Por seu turno, em 2019, de acordo com o Governo, havia 218 mil portugueses recenseados no Brasil.
Nacionalidade
Em 2021, o SEF deu o seu parecer em 13 328 pedidos de aquisição de nacionalidade portuguesa - por tempo de permanência no país -, feitos por cidadãos brasileiros. Por casamento ou união de facto, foram apresentados 3064 pedidos.
Entradas
No ano passado, entraram em Portugal 39 456 brasileiros. O número mais alto registado pelo SEF refere-se a 2019, quando houve 48 796 entradas.