Após vários pareceres a alertar para o risco de o projeto de lei do Partido Socialista (PS) de descriminalização do consumo de drogas poder dificultar a atuação das autoridades, os deputados socialistas avançaram com propostas de alteração com vista a separar o consumo do tráfico de droga.
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Assim, no caso de aquisição ou detenção de drogas que exceda a quantidade necessária para consumo médio individual durante o período de dez dias, se ficar “demonstrado” que se “destinam exclusivamente a consumo próprio, a autoridade judiciária competente determina, consoante a fase do processo, o seu arquivamento, a não pronúncia ou a absolvição e o encaminhamento para a Comissão de Dissuasão da Toxicodependência” (CDT). Também o grupo parlamentar do PCP propõe que nos casos “sem indício da prática de crime de tráfico” seja feito encaminhamento para a CDT. Cabendo “à autoridade judiciária fazer prova da prática do crime de tráfico”, lê-se na proposta de alteração do PCP.
A Polícia Judiciária (PJ), recorde-se, no parecer emitido alertava que o alargamento da descriminalização, “sem qualquer limite (…), irá trazer dificuldades acrescidas à atividade desenvolvida pelas autoridades no combate ao tráfico porquanto muitos traficantes irão facilmente justificar a posse de drogas, alegando que as mesmas se destinam ao seu consumo quando na realidade se destinam a ser traficadas”. Também o Conselho Superior do Ministério Público avisava que a alteração proposta pelo PS “poderá, no limite, levar a um agravamento da insegurança jurídica, pois poderá dificultar gravemente a atuação dos órgãos de polícia criminal e do Ministério Público perante situações de deteção de quantidades significativas de droga”.
O Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), por sua vez, propôs que a aquisição ou detenção no caso de quantidades que excedam os limites possa ser descriminalizada “desde que a autoridade judiciária ou o órgão de polícia criminal não tenha qualquer indício da prática de crime de tráfico”. Uma forma de, lê-se no parecer assinado por João Goulão, “não colocar em causa a atividade própria dos órgão de polícia criminal e das autoridades judiciárias quando considerem estar perante uma circunstância, não de consumo, mas de tráfico”.
Perante os reparos, o grupo parlamentar do PS avançou, então, com propostas de alteração ao projeto de lei, salvaguardando a descriminalização do consumo em quantidades superiores às previstas quando fique demonstrado que exclusivamente para consumo próprio. E se na versão inicial definiam que a aquisição ou detenção que “exceda a quantidade necessária para o consumo individual durante o período de dez dias constitui mero indício de que o propósito pode não ser o de consumo”, nas alterações propostas passa agora a ler-se “constitui indício”. Atualmente, explique-se, a lei enquadra-o como um crime de consumo, sendo que no caso de pequenas quantidades estamos perante uma contraordenação.
Recorde-se que os próprios ministros da Administração Interna e da Saúde tinham levantado reservas sobre o projeto de lei, pedindo “ponderação” e “prudência”.