Estão propostas 70 zonas para gestão da paisagem, mas ainda faltam 41 entidades gestoras. Desconhecimento dos donos e problemas de "diálogo" podem atrasar medida emblemática.
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O objetivo de constituir, até 2023, 60 áreas integradas de gestão da paisagem (AIGP), foi superado em 2021, atingindo as 70, que deverão receber 220 milhões de euros. É uma das medidas emblemáticas do pacote de mais 580 milhões da última "reforma florestal" (diplomas aprovados entre 2019 e 2021). Mas ainda há muito por fazer.
O tema ganha atualidade em pleno agravamento dos incêndios. Até ontem à noite, o total de ocorrências ascendia a 7 269. Só julho regista 2639. A área ardida somava 60 352 hectares (ha). Se em 30 de junho era de 11 372, em 29 dias arderam cerca de 49 mil ha.
Segundo dados do Ministério do Ambiente e Ação Climática (MAAC), estão em execução as ações para as 70 AIGP já constituídas, no valor de três milhões de euros destinados a projetos, prevendo-se mais 217 milhões para a sua execução.
As AIGP, com uma área mínima de 100 hectares (ha) e da iniciativa de autarquias locais ou organizações de produtores, serão objeto de operações integradas de gestão, designadamente de reconversão de culturas, valorização dos espaços agrícolas e florestais, compartimentação de povoamentos com diferentes espécies e intercalando com pastos e campos, e faixas sem combustível.
37 municípios
Numa análise a dados da Direção-Geral do Território (DGT), verifica-se que as 70 AIGP - 41 das quais foram propostas por autarquias e 29 por organizações de produtores - abrangem 37 municípios, num total de 140 861,1 ha, distribuídos por 292 mil prédios rústicos, dos quais 197 mil não possuem cadastro.
Estão por constituir 41 entidades gestoras de AIGP que somam 88 827,3 ha, ou seja, 63% do total proposto. Trinta e oito são da responsabilidade de autarquias. A Câmara Municipal de Vouzela é responsável pela iniciativa com a maior área (mais de 6400 ha), mas o seu presidente, Rui Ladeira, desdramatiza.
Sinalizando que o prazo termina no final de setembro e que nada foi feito em cinco anos em Vouzela (14 mil ha ardidos em 2017), explica que "ir a jogo" implicou conversar com as duas associações que gerem zonas de intervenção florestal (uma será a entidade gestora), discutir o modelo jurídico e refletir sobre a estratégia para "encontrar formas inovadoras de criar economia no imediato, pondo pessoas e gado na montanha".
João Dinis, dirigente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), representativa de pequenos e médios agricultores e do minifúndio, aponta dificuldades à aplicação, como a falta de conhecimento dos donos e a concertação de vontades.
territórios vulneráveis
As AIGP são "importantes para revitalizar os espaços rurais, a agricultura familiar e a reflorestação, mas é necessária muita sabedoria e diálogo com os proprietários e não entrar à bruta", diz, sublinhando que muitas propostas foram apresentadas sem que fossem consultados. Já o objetivo do Governo de criar 70 áreas parece-lhe curto: "Só o meu concelho (Oliveira do Hospital, onde arderam 20 mil ha em 2017) precisava de 20!"
Segundo o diploma que delimita os territórios vulneráveis, há 1 279 freguesias em 164 municípios nesta classificação, enquanto dez dos 20 programas de reordenamento e gestão, nos quais se inserem as AIGP, abrangem 48 concelhos.
Uma reforma de 580,2 milhões
Pacote
Dezenas de diplomas
Desde os grandes incêndios de 2017, foram aprovadas dezenas de diplomas e medidas. Destacam-se o Sistema de Gestão Integrada dos Fogos Rurais e o seu Plano de Ação, limites à plantação de eucalipto, criação da empresa pública de gestão FlorestGal, o programa "Aldeia Segura, Pessoas Seguras", o regime simplificado do cadastro (56 milhões), o polémico regime do arrendamento forçado, o apoio ao emparcelamento e o Programa de Transformação da Paisagem (270 milhões). O pacote mais recente representa quase 580,2 milhões de euros.
Paisagem
Reordenamento
Criado em 2020, o Programa de Transformação da Paisagem inclui os programas de reordenamento e gestão da paisagem, com uma dotação de 270 milhões no PRR. Está em vigor o das serras de Monchique e de Silves e estão em elaboração ou preparação os das serras da Lousã e Açor, Alto Douro e Baixo Sabor Serras de Marão, Alvão e Falperra, Pinhal Interior Sul, Entre Minho e Lima, Alva e Mondego, Montes Ocidentais e Beira Alta, serras da Gardunha, Alvelos e Moradal e serra do Caldeirão.
Gestão
Áreas Integradas
É a medida mais emblemática, mas limita-se a 70 áreas integradas de gestão da paisagem (AIGP), já criadas ou propostas. O PRR prevê 220 milhões, para financiar os agricultores e produtores florestais a 100%. Não se sabe se a medida será alargada.
Sistema
Gestão reforçada
A gestão integrada de fogos rurais dispõe de uma dotação de 260 milhões no PRR. O Ministério do Ambiente destaca a aposta em faixas de gestão de combustível, da responsabilidade do ICNF (contratos assinados no valor de 34 milhões) e aquisição de meios de prevenção e combate (16 milhões).
Aldeias
Condomínios
Com o objetivo de intervir em 800 aldeias na gestão de combustível em redor dos aglomerados, possui uma dotação de 36,3 milhões de euros. Em 2021, foram aprovadas 31 candidaturas (58 condomínios) no valor de 1,2 milhões. Em 2022, estão em avaliação 123, com investimento proposto de 10,2 milhões
Meios
Sapadores florestais
Em 2020, foi alterado o regime dos sapadores florestais. Os apoios às equipas foi reforçado em cinco mil euros por ano, acrescendo 15 mil às que integram brigadas intermunicipais (valor global: 3,5 milhões).