Entre 2022 e 2023, população até aos 14 anos cresceu em 2296, o que não acontecia há 20 anos. Mas, numa década, a quebra chegou quase aos 170 mil.
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Num país envelhecido e litoralizado há pequenas variações estatísticas que nos fazem sorrir, mesmo que ainda estimativas e para apenas um ano. Portugal fechou 2023 com mais 2296 crianças até aos 14 anos. Um feito que há 20 anos não se via. Um pequeno oásis, se tivermos em conta que nos últimos dez anos a população infantil diminuiu em mais de 167 mil, período de alargamento no topo da pirâmide etária, com quase mais meio milhão de maiores de 65 anos. Oásis que se verificou em 43% do território. Interior incluído. Como é o caso de Oleiros, o mais envelhecido concelho do país, onde cinco crianças fazem a diferença.
No top 10 dos 132 concelhos com aumento de residentes até aos 14 anos, de acordo com as estimativas de população do Instituto Nacional de Estatística (INE), tirando Porto e Torres Vedras, todos os outros integram a Área Metropolitana de Lisboa (AML). Imediatamente a seguir está Portimão e Albufeira. Num movimento em linha com a evolução da natalidade e dos fluxos migratórios.
No que aos nascimentos concerne, os dados do INE confirmam a recuperação, em 2023, face ao ano transato, nos zero e um anos - mais 6314 bebés -, compensando a quebra nos dois e três anos, decorrente do impacto da pandemia, com intenções de parentalidade adiadas. Mas também o efeito da troika, com quase menos 10 500 crianças, no período em análise, na faixa 10-11 anos. No ano passado, a AML respondeu por 35% dos nascimentos e a do Porto por 15%.
Valores que, mesmo assim, destaca ao JN a demógrafa Maria Filomena Mendes, “não se aproximam sequer” dos registados em 2011, quando nasciam mais de 90 mil bebés por ano no nosso país. “Com exceção para o Algarve e para a então denominada AML”. Nas suas projeções, o Eurostat, gabinete de estatísticas europeu, põe apenas aquelas regiões a ganhar população até 2050, enquanto o Interior pode registar perdas superiores a 20%.
O peso das migrações
“Conjunturalmente”, admite a professora da Universidade de Évora, “a imigração pode ser mais impactante”. Indo por partes. Em 2023, Portugal ganhou mais 123 mil residentes, dos quais apenas 1,9% até aos 14 anos, enquanto 44% estavam acima dos 65, respondendo por um quarto da população total.
Nesse ano, o saldo migratório (diferença entre entradas e saídas por migração) recuperou para valores de 1974 e 1975, ultrapassando os 155 mil.
Com os impactos na população infantil a medirem-se pelos nascimentos: 22% dos bebés nascidos no ano passado eram filhos de mãe estrangeira, contra 13,6% em 2021. Em 2022, 5,5% das crianças residentes em Portugal tinham nacionalidade estrangeira (+1,2 pontos percentuais).
Não havendo, ainda, dados destes saldos por idades, a demógrafa explica, no entanto, existir “um valor acumulado de imigrantes que passaram a residir no país e que têm um efeito direto e imediato no aumento de residentes e um efeito indireto no aumento da natalidade”. Em termos totais, a Grande Lisboa e a Área Metropolitana do Porto concentraram 18% e 17%, respetivamente, do saldo migratório positivo do ano passado.
Cautela com os dados
Sendo “positivo e de assinalar” este aumento dos residentes até aos 15 anos, Maria Filomena Mendes pede cautela na leitura dos dados, na medida em que podem ser “momentâneos e esporádicos”, ou, “pelo contrário, ter alguma sustentabilidade”, que só o tempo poderá aferir. Sê-lo-á por via das migrações, tanto mais que, destaca, por via da natalidade, era preciso “um aumento bastante significativo nos próximos cinco a dez anos”, antecipando a idade em que as mulheres têm filhos, das mais altas da Europa.
Numa leitura a dez anos, os dados do INE dizem-nos que destes 132 concelhos a ganharem crianças até aos 14 anos de idade ficamos apenas com 19, com Odivelas a destacar-se, com mais 1334 crianças, seguindo-se Porto (+512) e Lisboa (+428). Mas também, no extremo oposto, a ilha do Corvo, com mais cinco crianças. São agora 56.