Há três anos que Ana Luísa Barbosa quer cortar todos os elos com a religião católica. Contactou a paróquia de Rebordosa, em Paredes, onde foi batizada, e os serviços da diocese do Porto, mas, até agora, ainda não conseguiu o documento que confirma a sua apostasia.
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"Não quero ter nada a ver com a Igreja Católica. Não quero correr o risco de que, um dia, alguém faça uma cerimónia católica em meu nome e, sobretudo, não quero estar ligada de nenhuma forma a uma organização que se aproveita das dinâmicas sociais e explora a pobreza", disse ao JN.
Ana Luísa, 33 anos, não está sozinha no processo de "desbatização". Nos últimos anos, embora sem dados oficiais, há cada vez mais pessoas a pedir às paróquias para revogar o batismo e assim ficarem oficialmente desligadas da Igreja.
No Facebook, o grupo Apostasia em Portugal tem mais de 600 elementos, a grande maioria já com o processo terminado. Também a Associação Ateísta Portuguesa lançou a "Campanha Apostasia 2023", disponibilizando ajuda para "pedir a anulação do batismo".
diferentes velocidades
Rita Oliveira não quer pertencer "às estatísticas que dizem que Portugal é um grande país católico e que, na verdade, não o é", e pediu à diocese de Coimbra para se "desbatizar". "Estou à espera de uma decisão, mas acho que o meu processo ainda está na paróquia onde fui batizada e não vai sair de lá porque o padre não deixa", afirmou ao JN.
Nuno Folgado, 48 anos, fez o pedido à paróquia de Santo Condestável, em Lisboa e, num mês, resolveu "o assunto". "Os abusos sexuais não são toleráveis. Quando começaram a ser conhecidos os abusos em França, pensei em deixar a Igreja. Quando soube o que se passou em Portugal, tive a certeza de que não queria ter nada a ver com isto".
Ao contrário do que se passa com Ana Luísa na diocese do Porto, em Lisboa o processo foi fácil. "Enviei a carta a pedir a anulação do meu batizado no dia 12 de março e no dia 3 de abril recebi a resposta afirmativa", explicou, ao JN, Nuno Folgado.
O padre José Tito Espinheira, vigário-geral da diocese lisboeta, garante que os pedidos de apostasia "são residuais". "Pelo contrário, o que tem aumentado são os pedidos de adesão à Igreja Católica", afirmou ao JN, dando como exemplo os "68 pedidos de pessoas adultas que, só este ano, querem ser batizadas".
No Porto, Ana Luísa Pereira afirma que o único contacto que recebeu dos serviços da diocese foi para lhe perguntar se era emigrante na Alemanha, o que não é o caso. "Como na Alemanha os católicos pagam automaticamente um imposto para a Igreja, se as pessoas provarem que deixaram a Igreja deixam de pagar", explicou.
Sem números, é certo que os pedidos de apostasia continuam a chegar. Na prática, o pedido chega à diocese a partir das paróquias onde foi apresentado e deverá depois ser aprovado pela Vigararia Geral da diocese em causa. A renúncia fica depois registada no assento de batismo (livro onde estão registados, nas paróquias, os batismos dos católicos).
"Continua sempre a existir uma prova de que aquela pessoa esteve batizada. A folha com a data do batismo continua na paróquia, não deixou de existir apesar de haver uma atualização de renúncia", disse ao JN um sacerdote da diocese de Braga.
Modelo está na net
A Associação Ateísta Portuguesa elaborou uma carta de pedido de apostasia/desbatização (disponível no seu site) que pode ser usada, depois de preenchida, para enviar ao pároco do local onde foi realizado o batismo ou ao bispo da diocese.
Motivos mais usados
O imperativo de consciência é o motivo mais usado para pedir a apostasia. Evocar o facto de as convicções filosóficas e religiosas não corresponderem às das pessoas que decidiram realizar o batismo é outro dos argumentos. Há quem opte por dizer que adotou outra religião.
Paróquias atestam
Na resposta à carta a pedir a apostasia, as respostas são variadas. Contudo, todas têm que ser assinadas e referir que a pessoa em causa "renegou o batismo" e "renunciou à fé católica".