Regulador acusa hospitais e centros de saúde de dificultarem acesso a cuidados médicos

Hospitais e centros de saúde estão a recusar utentes "por falta de vagas"
Foto: Artur Machado
A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) está a acusar hospitais e centros de saúde de dificultarem o acesso dos utentes a cuidados médicos, o que viola o definido na Constituição Portuguesa, na Carta de Direitos e Deveres dos Utentes e a própria Portaria n.º 438, de 15 de dezembro de 2023, que regulamenta o funcionamento do programa "Ligue Antes, Salve Vidas".
O relatório da ERS sobre o funcionamento do programa "Ligue Antes, Salve Vidas", a chamada porta de entrada do utente no SNS, chegou à conclusão, segundo um exclusivo do "Diário de Notícias", que o atendimento aos utentes estão a ser negados por hospitais e centros de saúde.
O documento exemplifica alguns dos casos mais graves, como um utente que foi encaminhado pela Linha SNS24 para uma consulta no seu centro de saúde a determinada hora, mas quando lá chegou viu recusado o atendimento por "falta de vagas". Outro dos exemplos que dá o "Diário de Notícias" é o caso de uma mãe que se dirigiu a uma urgência hospitalar com o filho de 15 anos, que tinha febre e chorava com a mão no ouvido, mas não foi atendida por não ir referenciada, tendo que ligar para a Linha SNS24, que em vez de a encaminhar para a zona onde estava, encaminhou-a para outro estabelecimento de saúde a mais de 80 quilómetros.
Mas o relatório não fica por aqui: divulga um caso de um utente adulto que teve um acidente de bicicleta, ligou para a linha e foi encaminhado para um dos grandes hospitais de Lisboa para ser observado em ortopedia, mas quando lá chegou a especialidade já não estava a funcionar. Encaminharam-no para outro hospital, mas quando chegou teve de ligar para a linha para ser admitido.
O "Diário de Notícias" escreve também a ERS está a avisar os organismos centrais, os hospitais e os centros de saúde que o incumprimento das regras - a recusa em atender o utente - "é punível com coimas, que podem ir dos mil aos 44 mil euros", exigindo maior articulação entre serviços e que os profissionais de saúde não tomem decisões que não são "adequadas" e que prejudicam os utentes.
Ao longo do relatório, a ERS expõe falhas, crítica e relembra as responsabilidades atribuídas ao Estado pela Constituição quanto à "universalidade" dos cuidados de saúde. Segundo o regulador, tais situações desrespeitam "um dos princípios basilares do SNS". Se "um utente que se dirige a um serviço ou a um estabelecimento do SNS, legalmente vinculado a assegurar a proteção da saúde individual e coletiva, não pode ver negado, sem mais, o respetivo acesso, ainda que conclua que o tipo de cuidados procurados não é o adequado ou que o estabelecimento em causa não possui o perfil assistencial ou capacidade para a prestação dos tratamentos".
A direção-executiva do SNS e os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), no mesmo documento, reconhecem haver "constrangimentos relevantes na operacionalização do modelo em vigor, quer ao nível da integração do sistema e da articulação da informação existencial, em tempo útil, quer no domínio da articulação funcional entre os diferentes níveis da prestação de cuidados".
O programa "Ligue Antes, Salve Vidas", criado a 23 de maio de 2023 pelo então ministro da Saúde Manuel Pizarro, começou como projeto-piloto na Unidade Local de Saúde da Póvoa de Varzim/Vila do Conde durante um ano, após o qual acabou por ser alargado a todo o país, sendo classificado pelo então Governo como a "porta de entrada do SNS".

