Em 73% dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde ocorrem regularmente ruturas de medicamentos. Em quase um terço (32%) daquelas instituições as falhas ocorrem todos os meses, em 23% são semanais e em 18% são diárias. O Index Nacional do Acesso ao Medicamento Hospitalar 2022, que é divulgado esta sexta-feira, mostra as barreiras que persistem num país assimétrico, que corre a velocidades diferentes, e que dedica pouca atenção ao impacto dos fármacos na qualidade de vida dos doentes.
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"As ruturas têm vindo a melhorar, ainda que sejam preocupantes", refere o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), que promove a realização do Índex, desenvolvido pela Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa.
Xavier Barreto explica que, para contornar as falhas, os hospitais recorrem à importação e a empréstimos entre unidades ou os profissionais de saúde adotam outros regimes terapêuticos. "As ruturas não significam que os doentes ficam sem tratamento", frisa, notando que as falhas afetam em especial os fármacos de baixo valor que deixam de ser interessantes para a indústria.
No índex, realizado anualmente com base em respostas dos hospitais do SNS recolhidas em outubro último, 77% das instituições considera a rutura de medicamentos um problema grave, mas só 37% avaliam o impacto das roturas.
No acesso aos medicamentos inovadores, o índex mostra que os hospitais aprovam o uso, "mas a velocidade não é igual" em todo o país, destaca Xavier Barreto. O presidente da APAH realça ainda a fraca evolução dos hospitais no que toca à medição do impacto dos medicamentos inovadores no doente. Segundo o estudo, apenas 18% das instituições recolhe de forma sistemática dados sobre a qualidade de vida dos doentes em terapêutica.
Partilha do risco
"Gastamos milhões de euros em medicamentos inovadores que a indústria farmacêutica nos diz que têm um efeito. Faria sentido confirmar esse resultado clínico na vida do doente até para dar suporte a acordos de partilha do risco, que praticamente não existem", defende Xavier Barreto. A partilha de risco prevê que o pagamento dos fármacos fique associado a resultados. Esta não tem sido uma prioridade da tutela, mas "devia ser" porque traz poupança e promove a sustentabilidade do SNS. O administrador hospitalar defende a criação de incentivos para os hospitais que avaliem o impacto das terapêuticas nos doentes.
Outra preocupação é a baixa percentagem de hospitais com consulta farmacêutica (27%) para ajudar o doente a conciliar terapêuticas e identificar casos de sobremedicação. "Não está a avançar com a mesma velocidade em todas as instituições e a grande dificuldade, pela falta de recursos, vai ser manter esta consulta para todos os doentes que dela precisam", avisa Xavier Barreto.