Hospital prepara-se para a chegada de quadros mais complicados no inverno, numa altura em que circularão SARS-CoV-2 e gripe. Na certeza de que todos são suspeitos.
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No Serviço de Urgência do Hospital de S. João, no Porto, há já algumas certezas quanto ao inverno. Que o número de atendimentos vai aumentar. Que todo o utente que se apresente com tosse, dores de corpo ou febre é suspeito. E que os quadros de dificuldade respiratória vão multiplicar-se. Nessas certezas, o espaço da Urgência está a ser duplicado.
O objetivo, revela ao JN a diretora da unidade, não é receber mais doentes - "para uma urgência polivalente [altamente diferenciada], já recebemos doentes acima do adequado, numa média diária de 460". Antes, sim, para "melhorar a capacidade de resposta, atender com mais qualidade e segurança, o que faz aumentar a eficácia", diz Cristina Marujo.
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Às tendas e contentores instalados no exterior do hospital - que no pico da pandemia atendiam, respetivamente, casos ligeiros e moderados - expande-se agora fisicamente a Urgência, "roubando" espaço a serviços administrativos. O mesmo se passa na pediatria, a aumentar o seu espaço interior sendo que, em caso de necessidade, "partilhará os contentores" com a Urgência geral, adianta o coordenador daquele serviço, Nélson Pereira.
Mas, sublinham os médicos, mais do que o número, importa o estado em que o doente chega. Sempre pior no inverno: "São mais difíceis de manobrar", precisa Cristina Marujo. "A doença respiratória retém os doentes muito tempo e atinge uma população muito envelhecida. Em termos logísticos é um pesadelo", afirma o coordenador do serviço.
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E numa época em que convivem SARS-CoV-2, gripe e constipações, quais os procedimentos na triagem? "É tudo suspeito. Temos de ser muito latos para ter a certeza que os apanhamos por uma questão de saúde pública. Por exemplo, só 30% dos doentes com covid-19 têm febre", explica Nélson Pereira. E, aqui, outra evidência. Se antes tínhamos um pouco de febre e pingo no nariz e quedávamo-nos por casa à espera que passasse com paracetamol, agora procuraremos os serviços de saúde, pelo bem comum.
Vida além da Urgência
Serviços esses, alertam Cristina Marujo e Nélson Pereira, que não têm de ser, forçosamente, as urgências hospitalares: "O Serviço de Urgência não é o único sítio que pode dar resposta". Num país que sofre de "hospitalite crónica", o coordenador da Urgência pede aos "responsáveis que se preocupem em capacitar a rede de Cuidados de Saúde Primários para que deem resposta e que a Linha de Saúde 24 possa fazer o correto encaminhamento". Tanto mais que não se pode descurar a atividade programada, cujos atrasos se avolumam.
Volvidos agora seis meses sobre o primeiro caso confirmado de covid-19 em Portugal, há também outras certezas. "Sabemos bastante mais sobre a doença, como funciona, como se apresenta, olhamos para o doente com outro tipo de segurança e os profissionais sentem-se mais seguros", frisa Nélson Pereira.
Na altura, "a vaga chegava cá dentro e não estávamos a ver que ela vinha", prossegue. Como o dia em que a Urgência recebeu, em 24 horas, 350 doentes suspeitos. "Acho que não mais vamos ser apanhados na curva".
Números
167646 pessoas atendidas na Urgência do S. João no ano passado. Se juntarmos pediatria (77 mil) e obstetrícia (15 mil), foram 260 mil atendimentos.
2100 positivos, tendo 500 ficado internados, dos milhares de casos suspeitos recebidos em seis meses. A aposta foi na hospitalização domiciliária.
À lupa
Mais testes rápidos
Os testes rápidos, que fornecem o resultado numa hora, são escassos e usados com parcimónia. "Por exemplo, num doente que precisa de ser operado", explica Nélson Pereira. Na zaragatoa clássica, a espera varia entre quatro e cinco horas.
Recuperar todo o atraso
O aumento da hospitalização domiciliária e a minimização dos tempos de internamento são fulcrais para não diminuir a atividade programada. O S. João quer chegar "ao pico do inverno com o atraso nas cirurgias recuperado".