Seis meses de pandemia: sem vacina ainda certa, o Mundo poderá ter que conviver com a covid-19 por muito mais tempo do que o esperado.
Corpo do artigo
A realidade é muito dura: "Aquilo que vivemos hoje está muito longe de acabar. Embora muitos países tenham conseguido progressos, globalmente a pandemia está a acelerar. A falta de unidade nacional em muitos países e a falta de solidariedade global estão a ajudar o vírus a espalhar-se". As palavras preocupadas são de Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), que fecha a previsão assim: "O pior ainda está para vir".
Esta semana marca os seis meses desde que a China disse ter identificado em Wuhan, cidade de 10 milhões, um novo vírus altamente contagioso, SARS-CoV-2, coronavírus da síndrome respiratória aguda grave. Estávamos aí totalmente inconscientes de que a doença iria aterrorizar, destruir vidas e afundar a economia global na recessão mais grave de quase um século.
12388888
O Mundo mudou, talvez para sempre. Um a um, os países fecharam a economia e a sociedade, um número gritante de pessoas perdeu o emprego e muitos enfrentaram depressões e maleitas mentais devido à solidão. As máscaras impuseram-se no quotidiano.
Cada país deu a sua resposta ao vírus. Alguns, como a Coreia do Sul, ativaram bloqueios restritos e testaram massivamente. Outros, como a Suécia, quase não decretaram restrições. Outros ainda, como a Nova Zelândia, eliminaram com sucesso o vírus, por agora, com ação rápida, diretivas consistentes e outras estratégias eficazes como vigiar e seguir círculos de infetados.
Mas o fim não se vê. Diz ao "The Guardian" Mark Woolhouse, epidemiologista da Universidade de Edimburgo: "Vamos conviver com o vírus por muito mais tempo do que pensámos. Essencialmente, são seis meses de uma relação para a vida". Em meio ano, mais de 11 milhões de pessoas foram infetadas, com mais de meio milhão de mortos, incluindo 193 330 na Europa.
EUA, o alegado país mais rico do planeta, tem 1/4 dos infetados mundiais, com 132 mil mortos por covid-19, a doença designada do coronavírus. O país do republicano Donald Trump, negacionista que recusa usar máscara, caminha imparável no abismo: nas últimas 24 horas teve 60 383 novos infetados, novo recorde diário.
O vírus desacelera na Europa e na Ásia, mas está a propagar-se com alarmante velocidade no Sudoeste dos EUA e na América do Sul, com o Brasil, país também governado por um presidente negacionista, a acumular números trágicos - tem agora 1,5 milhões de infetados e há dados a prever 110 mil vítimas mortais até ao próximo agosto.
Portugal preocupa
O cenário sombrio aplica-se a Portugal, que regista mais de 43 mil infetados e 1600 mortos? Responde Filipe Froes, infecciologista e consultor da DGS. "O pior está para vir, se não conseguirmos fazer muito do que falta fazer: redefinir estratégias para o desconfinamento, envolver todas as partes, alocar recursos e, principalmente, fazer a procura proativa da doença", diz. O especialista avisa que "o pior não é inevitável", mas que temos que "testar muito mais" e ir à procura dos assintomáticos: "As pessoas sem sintomas são as responsáveis pela manutenção e perpetuação do vírus na comunidade".
estávamos mal preparados
"A doença revelou-se muito pior do que qualquer uma das pandemias que prevíamos combater", disse ao "The Observer" Martin Hibberd, da universidade londrina de medicina tropical. "Estávamos muito mal preparados. A taxa de mortalidade é de 1% e o vírus é altamente transmissível pela respiração. É o pior dos cenários realistas, está no limite do que se podia esperar", diz.
"No início, pensamos que era só uma doença respiratória que afetava o peito. Agora é claro que pode causar doenças nos órgãos respiratórios; pode afetar o revestimento dos vasos sanguíneos e desenvolver coágulos sanguíneos. A doença também é associada a fadiga extrema, danos nos rins e ataques cardíacos - e não exclui pessoas relativamente jovens", atesta ao "The Guardian" David Navarro, enviado especial da OMS.
Em fevereiro, especialistas disseram à "Live Science" que a pandemia teria quatro finais possíveis: o vírus seria contido; o vírus perderia poder de infeção com o tempo; surgiria uma vacina; ou o vírus permaneceria indefinidamente entre nós, ocupando um lugar ao lado da gripe sazonal.
Resultado: o vírus não pára de infetar e não parece que vá extinguir-se naturalmente. Sobram duas opções: viver com ele para sempre ou encontrar uma vacina.
12388984
Vacinas em fase de testes
O que podemos esperar dos próximos seis meses? "Idealmente, teremos a primeira das vacinas em quantidades limitadas para profissionais de saúde e depois para a população geral", disse esta semana George Rutherford, infecciologista da Universidade da Califórnia, nos EUA. "Mas isso ainda não é uma realidade".
Atualmente, há 17 vacinas em ensaios clínicos, diz a OMS. A vacina experimental da Moderna que usa o mensageiro RNA (ácido ribonucleico) para estimular o corpo a dar uma resposta imune ao vírus. A tecnologia nunca foi antes usada em vacinas; testes começam ainda este mês, diz um relatório da "Live Science". Cientistas da Universidade de Oxford, no Reino Unido, testam outra vacina feita a partir do vírus da gripe enfraquecido combinado com genes do coronavírus e esperam ter as primeiras doses prontas até ao outono.
RECUO
Catalunha decreta isolamento para 200 mil pessoas
É uma marcha-atrás: o presidente da região da Catalunha ordenou novo confinamento aos 200 mil habitantes em redor da cidade de Lérida, Nordeste espanhol, devido à multiplicação dos casos de contágio do coronavírus. "Decidimos confinar com base nos dados que confirmam um crescimento muito importante do número de contágios de covid-19", anunciou Quim Torra, o independentista que preside à região catalã. O isolamento vigora desde o meio-dia de ontem e restringe entradas e saídas da zona afetada, proibindo novamente concentrações com mais de 10 pessoas, entre outras medidas. Os dados mostram que o foco do vírus passou da capital espanhola para a Catalunha: a região autónoma registou esta semana um pico de 834 novos casos, enquanto Madrid contou só 329. Em toda a Espanha há agora 297 625 infetados e 28 385 mortos, atirando o país para o 5.º lugar, entre 215 Estados, em que a situação é mais preocupante.