Software desadequado e "falta de articulação" entre Câmara e Santuário são razões para o falhanço do projeto.
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Custou cerca de 820 mil euros e foi anunciado como uma peça importante na gestão do tráfego aquando da visita do Papa a Fátima em maio de 2017, por ocasião do Centenário das Aparições. Mas até hoje o Sistema Integrado de Mobilidade da Cova da Iria nunca funcionou e, além de inoperacionais, alguns dos equipamentos instalados nos parques do Santuário estão já danificados.
"Uns foram vandalizados, outros danificados por manobras de viaturas, nomeadamente de autocarros. Deviam estar mais recuados", conta Vicente Reis, morador em Fátima, do concelho de Ourém, convicto de que, se funcionasse, o sistema "seria uma boa ideia", sobretudo em dias de grandes peregrinações.
O problema, ressalva Isabel Gonçalves, proprietária de um estabelecimento comercial na cidade, é que, sem marcações de lugares de estacionamento, "não é possível controlar" a lotação. "Primeiro tinham de arranjar os parques e depois fazer o investimento. Assim, foi dinheiro deitado fora", alega.
Necessário mais investimento
Para Luís Albuquerque, presidente da Câmara de Ourém, que herdou o problema do Executivo socialista que lhe antecedeu, tratou-se de "uma boa ideia", que não foi executada da melhor forma. "O sistema foi bem idealizado, mas apresentava, desde o início, fragilidades que deveriam ter sido acauteladas, como a requalificação e, consequente marcação, dos parques de estacionamento do Santuário que ainda estão em terra batida", afirma o autarca, admitindo que houve "falta de diálogo e de articulação" entre a autarquia e a instituição religiosa.
Além da questão do ordenamento dos parques, Luís Albuquerque aponta falhas ao software adquirido, que "não é o mais adequado". Segundo o autarca, a sinalética e as câmaras de vigilância estão a funcionar, mas "há todo um conjunto de problemas" associados ao facto de o equipamento "não ser compatível". Para já, "não há muito mais a fazer, a não ser tentar uma nova candidatura para melhorar o sistema, tornando-o operacional", assume o presidente da Câmara.
A Soltráfego, empresa à qual foi adjudicada a empreitada, acredita que é possível colocar o sistema a funcionar, "se for esse o entendimento da entidade adjudicante [Município de Ourém]" e com mais investimento. "Será, obviamente, necessário fazer uma avaliação do estado atual dos equipamentos e sistemas instalados à data e fazer a devida substituição ou reparação de componentes eventualmente danificados", avança a empresa em resposta ao pedido de esclarecimentos do JN.
Além da implementação de sinalética digital e de dispositivos para contabilizar as entradas e saídas de veículos dos parques de estacionamento, o sistema contemplava a criação de vários postos informativos na cidade, aos quais os peregrinos e turistas poderiam recorrer, caso estivessem perdidos ou precisassem de saber a localização de algum estabelecimento ou "em situação de urgência".
"Em teoria, uma ótima ideia. Mas, pelos vistos, não resultou", constata Vítor Martins, motorista turístico, que só agora percebeu a razão de, nas muitas vezes que se desloca a Fátima, nunca ter visto o sistema a funcionar. "Pensava que só operava nos dias de grandes peregrinações. Alguém ganhou e muito", diz.