Tirando 2020, é o valor mais baixo de sempre. Dois terços são primeiros casamentos e em 29% existiam filhos comuns
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Tirando o primeiro ano de pandemia, com uma quebra histórica no número de casamentos, nunca se realizaram tão poucas uniões pelo rito católico em Portugal. No ano passado, ficaram-se por um quinto do total, quando, no início do século, respondiam por dois terços. Numa sociedade em transformação, com os primeiros casamentos a pesarem 65% e a partilha comum de residência antes do matrimónio a ser preponderante. E a de filhos em comum em crescendo.
Isso mesmo revela uma leitura mais fina aos recentes dados disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). Constatando-se que, no ano passado, apenas 19,9% dos casamentos entre pessoas do sexo oposto foram católicos, que compara com 64,8% em 2000. Foram 7094 celebrações, numa quebra de 9,8% face ao ano anterior. Expurgando 2020 – os casamentos realizados no primeiro ano de pandemia não chegaram aos 19 mil – é o valor mais baixo desde, pelo menos, 1990, quando os casamentos católicos chegavam aos 52 mil e respondiam por 73%.
Olhando ao território, há 26 municípios onde o casamento católico pesa 0%, seguindo-se Bombarral, Vila Real de Santo António e Grândola, entre os 1,5% e 2%. Em sentido inverso, destaque para Vila Velha de Ródão e Penamacor, nos 100%. Contudo, em termos absolutos, Lisboa (289) e Braga (233) foram os que mais casamentos católicos registaram.
Primeiros casamentos
Por outro lado, os registos do INE mostram-nos, ainda, que no ano transato os primeiros casamentos respondiam por 65,3% do total, quando, no início do século, chegavam aos 86,8%. Olhando aos perfis, um quarto dos cônjuges que casaram no ano passado estavam divorciados e pouco mais de 1% era viúvo. Sendo que a maioria estava divorciada há seis ou mais anos.
Sem surpresas, também, a partilha de casa antes do matrimónio, representando 71% do total. Quando, no início do século, apenas 13% dos casamentos tinham registo de residência anterior comum. Evolução semelhante verifica-se quando analisada a existência de filhos comuns anteriores ao casamento. No ano passado, em quase 29% dos 35.589 casamentos celebrados existiam filhos comuns. Quando, em 2000, correspondiam apenas a 5,4% dos mais de 60 mil casamentos então registados.
O peso da escolarização
O aumento do peso dos casamentos civis é “uma tendência que se tem vindo a acentuar” e está relacionada com a “escolarização da sociedade”, explica ao JN a socióloga Filomena Santos. Na medida em que o “casamento já não é encarado como um sacramento, mas algo terreno”. A que não é alheia a “diminuição dos católicos praticantes e a diminuição do peso da Igreja na regulação da vida privada das pessoas”, nota a professora no departamento de Sociologia da Universidade da Beira Interior.
Mostrando ainda os dados do INE um “aumento do fenómeno da coabitação conjugal”, numa “tendência da informalização da conjugalidade”. Querendo com isto a investigadora do Centro de Investigação e Estudos em Sociologia do Iscte dizer “que o casal é formado pouco a pouco”. Num “fenómeno muito contemporâneo”.
Acresce, explica Filomena Santos, “a erosão dos papéis tradicionais de género e uma crescente individualização”, num “quadro de equidade, em que há cada vez mais igualdade de género”. Vincando, no entanto, que “não é uniforme e não toca a todos da mesma maneira”.
Há mais casamentos com estrangeiros, a maioria brasileiros
No espaço de quatro anos o número de casamentos entre portugueses e estrangeiros aumentou 60%, ultrapassando os seis mil. No ano passado, correspondiam a 14,6% do total de celebrações. E, de acordo com os dados fornecidos pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) ao JN, os casamentos com cidadãos brasileiros respondem por mais de metade.
Dos 6006 casamentos registados no ano passado entre cônjuge português e estrangeiro, 41% referiam-se a uniões entre homens portugueses e cidadãs brasileiras. Sendo que o Brasil responde também pelo maior número de casamentos com mulheres portuguesas, num total de 631, mesmo assim quatro vezes menos face ao sexo masculino.
No caso de celebrações entre cônjuge português masculino e estrangeiro feminino, seguem-se, ao Brasil, Angola (177 celebrações), Venezuela (123), Ucrânia (115) e Cabo Verde (93). Enquanto as portuguesas casam mais com cidadãos de Cabo Verde (126), Bermudas (89), Angola (71) e França (55). Refira-se, ainda, que no ano em análise o INE tem registo de 2556 casamentos em que ambos os cônjuges são estrangeiros.