A banca que vende roupa do partido à porta da convenção tem uma t-shirt com a bandeira LGBT. Muitos oradores têm feito críticas ao Chega. Mas há quem admita uma "geringonça de Direita" que inclua o partido de André Ventura e, embora esteja em minoria, até existe quem denuncie o "wokismo". Estes últimos querem que a IL não se perca "na espuma dos dias" e se centre "no que é importante". Estarão os liberais a dividir-se entre fações antagónicas?
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Durante a convenção, foi-se tornando claro que os presentes se dividem em dois polos principais: um, de índole mais social-liberal, está sobretudo alinhado com Rui Rocha; o outro, mais conservador, tende a preferir Carla Castro, embora esta também congregue apoios da área vista como "progressista".
A primeira fação rejeita qualquer aproximação ao Chega e é mais aberta a causas como o anti-racismo ou os direitos LGBT. A segunda não descarta uma "geringonça de Direita" e tem apoiantes que, nas palavras de Paulo Carmona - número dois de Carla Castro -, se opõem a "wokismos e cancelamentos".
No sábado, a sala foi surpreendida pela quantidade de aplausos ao discurso de Carla Castro. Esta recebeu uma ovação não menor do que a que tinha sido dirigida a Rui Rocha, candidato apoiado por Cotrim Figueiredo e visto como favorito.
Contudo, no domingo, a fação "social-liberal" pareceu fazer uma demonstração de força, a julgar pelos muitos assobios a Nuno Simões de Melo, orador conservador que alertou para o risco de o partido se tornar "uma melancia azul, liberal por fora mas bloquista por dentro".
Ainda assim, seria precipitado dizer que Rui Rocha é o candidato "progressista" e Carla Castro a candidata "conservadora". Os muitos aplausos a Carla Castro e os muitos assobios à intervenção de Simões de Melo indiciam que uma parte relevante dos apoiantes da candidata não se revê numa visão mais conservadora de partido.
"Deixar as minorias ativistas a falar sozinhas"
Nuno Simões de Melo, coronel na reserva, integra a lista B ao Conselho Nacional, composta por um pequeno grupo crítico do rumo geral do partido. Assumindo-se ao JN como "liberal clássico", este militante tentou, no início da campanha, uma aproximação da sua fação à candidatura de Carla Castro à direção. Embora a convergência não tenha ocorrido, Simões de Melo apoia a deputada a título pessoal.
Foi este candidato da lista B quem recebeu o maior coro de assobios deste o início da convenção, sobretudo quando apelou a que não se desenterre a "luta de classes" e se "deixe as minorias ativistas" do partido "a falar sozinhas". Perante os apupos, reagiu com gritos de "Liberdade! Liberdade!".
A intervenção de Nuno Simões de Melo desencadeou várias reações de militantes alinhados com a fação mais social-liberal. Um deles, Luís Sebastião, garantiu, recebendo palmas, que a IL "nunca será um partido conservador".
Minutos depois, um outro membro, Carlos Silva, disse identificar-se com uma IL "que desce a Avenida no 25 de Abril". Assumindo-se contra "a extrema-direita fascista, racista, xenófoba e homofóbica", atirou: "Tenho medo de adormecer agarrado ao meu sonho liberal e acordar num partido conservador". Saiu do palco ovacionado.
Leonor Dargent, apoiante de Rui Rocha e ex-candidata a deputada - a primeira não eleita da lista por Lisboa -, quis saber se a lista B "lamenta" o apoio à causa LGBT, às alterações climáticas ou à legalização das drogas. Numa alusão ao Chega, Guilherme Folhadela disse ter faltado pouco para que se falasse em "liberais de bem" e frisou: "Se uma ideia liberal é partilhada pelo BE, não somos nós que estamos mal, são eles que estão bem".
Simões de Melo quer "deswokizar" a IL
Ao JN, momentos depois do discurso em que foi assobiado, Nuno Simões de Melo desvalorizou o momento, justificando-o com "a emoção da luta eleitoral". Negou que se viva uma "luta de classes" na IL, mas disse que as suas prioridades são "dessocializar, descoletivizar, descentralizar e 'deswokizar'" o partido. Esta última palavra refere-se ao combate às causas identitárias habitualmente conotadas com a Esquerda liberal.
Para Simões de Melo, é preciso que a IL "não se perca na espuma dos dias"e se centre "no que é importante". O candidato alerta contra causas que diz serem "a transferência, para o séc. XXI, da luta de classes anacrónica de Marx" e que colocam "todos uns contra os outros". Advoga, no seu lugar, a defesa dos direitos humanos "para todos", independentemente da "cor da pele" ou da "orientação sexual".
Nuno Simões de Melo considera positivo que haja sensibilidades diferentes no partido e garante que, apesar das diferenças, a IL voltará a estar unida a partir de segunda-feira. "Somos todos liberais" mas, para que a IL se torne "um partido de Governo", é preciso "congregar" as várias visões diferentes, conclui.