Em causa beneficiários com baixos rendimentos. No primeiro trimestre deste ano, 6779 estavam no limiar.
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Nos primeiros três meses deste ano, 6% dos beneficiários do subsídio parental inicial recebiam o mínimo definido por lei: 351 euros. A que se juntam, no mesmo período, 3516 abrangidos pelo subsídio social parental, previsto, por exemplo, para mães que não têm os descontos para a Segurança Social (SS) necessários ou estão em situação de desemprego. Ao todo, eram 6779 os pais a receberem pelo mínimo.
De acordo os dados facultados ao JN pelo Instituto da Segurança Social, no primeiro trimestre contavam-se 3263 beneficiários do subsídio parental inicial a receberam 11,70 euros/dia - valor mínimo previsto na lei, correspondente a 80% do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), totalizando 351€/mês. Em causa, refira-se, beneficiários com rendimentos muito baixos. Sendo que, apesar de haver cada vez mais pais a partilharem licença, as mães são as principais beneficiárias. Os pais estão obrigados a 15 dias de licença e as mães a seis semanas.
Uma proporção sem grandes oscilações face aos anos anteriores. No ano passado, eram 9702 os beneficiários de subsídio parental inicial a receberem pelo cálculo de 80% do IAS: 5,3% do total. Em 2019, eram 6%.
No que ao valor médio concerne, verifica-se uma descida neste primeiro trimestre, para os 34,93 euros/dia (1048€/mês). Desde, pelo menos, 2016 que o valor médio vinha aumentando, atingindo os 35,96€/dia em 2020.
Apesar de se analisar apenas um trimestre, esta descida não é alheia ao impacto da pandemia na economia, com mais desempregados e trabalhadores em lay-off. Isto porque o subsídio parental inicial é calculado com base nas remunerações declaradas à SS nos primeiros seis meses dos últimos oito anteriores ao mês do nascimento. Absorvendo, assim, o impacto dos confinamentos nos trabalhadores, nomeadamente nos recibos verdes.
Subsídio social
Quanto ao subsídio social parental - pago quando não se cumpre o prazo de garantia ou se beneficia do subsídio de desemprego (ler ficha) -, havia registo de 3516 pais, 83% dos quais a receberem 351 euros. Outros 528 auferiam 280,84 euros, por terem optado por 150 dias de licença não partilhada; e 65, com licença de 180 dias partilhada, recebiam 289,61 euros (66% do IAS).
Numa leitura anual, o número de beneficiários deste subsídio social tem vindo a descer desde 2017, ano em que se contavam 21 709 beneficiários. No ano passado, rondaram os 14 mil. Quantos dos requerimentos que foram indeferidos não foi possível apurar. Isto porque o subsídio social é recusado quando o rendimento mensal por agregado familiar é superior a 80% do IAS.
Subsídio inicial
Cobre os rendimentos perdidos pela mãe e pelo pai durante o gozo da licença. O subsídio parental inicial é concedido por um período de 120 ou 150 dias consecutivos, consoante a opção dos pais. O pai pode optar por partilhar a licença com a mãe. Obriga a cumprir prazo de garantia: ter trabalhado e descontado para a Segurança Social durante seis meses (seguidos ou não), não podendo haver um período igual ou superior a seis meses sem descontos.
Subsídio social
Para cidadãos nacionais ou estrangeiros sem regime de proteção social ou beneficiários de subsídio de desemprego, por exemplo. O rendimento mensal, por pessoa, do agregado familiar, não pode ultrapassar os 351,05€.
A dificuldade de preparar a chegada de um bebé com 10 euros por dia
Uma jovem desempregada que se estreou na maternidade e uma mãe de três filhos que é família de acolhimento dão o seu testemunho.
Por terem empregos com salários baixos, há mulheres que vivem a experiência da maternidade com subsídios que não chegam ao valor do salário mínimo nacional (665 euros). Fazem milagres com pouco dinheiro.
S. João da Pesqueira
Metade da licença fica na farmácia
Quando Vânia Macedo, 29 anos, e Igor Lopes, 28, planearam a chegada de Francisco, agora com mês e meio, não imaginavam o que ia acontecer a seguir. "O bebé foi planeado mas nunca pensei que ficasse desempregada e que as coisas se agravassem", conta Vânia. A jovem era repositora de stock num supermercado em São João da Pesqueira, mas perdeu o emprego na pandemia.
Quando ficou desempregada, em julho do ano passado, passou a receber 11 euros por dia, o que totalizava 330 euros ao final do mês. "Foi muito complicado preparar a chegada de um bebé com pouco mais de 10 euros por dia. As despesas são muito altas e, como é o primeiro filho, é preciso tudo". Quando Francisco nasceu, o subsídio de desemprego foi automaticamente suspenso e substituído pela licença de maternidade. "Passei a receber 18,74 euros por dia e, se estavam mal, as coisas não ficaram melhores. É muito pouco". O leite do menino tem de ser comprado na farmácia e cada lata custa cerca de 20 euros. Precisa também de gotas para ajudar na digestão. "Um frasquinho com pouca quantidade e desaparece num instante". Soma mais 20 euros de despesa, a que se juntam os cremes e suplementos . "Só na farmácia fica mais de metade do valor da licença", revela a jovem mãe, sem contar com as fraldas, roupas e todos os outros gastos inerentes.
Para um casal que está a começar a construir família e se depara com esta realidade, "nenhuma das soluções que nos apresentam é boa e as ajudas são insuficientes". O que vale é o trabalho do pai do bebé, que é agricultor. "Vamos esticando".
Se houvesse mais apoios e incentivos, havia mais bebés
Vânia Macedo não se queixa "porque há experiências impagáveis". "Ser-se mãe pela primeira vez é único", garante, mas confessa que gostava de desfrutar desta fase da vida com menos medo e preocupação. "Queremos dar o melhor aos nossos filhos e os apoios que recebemos são muito poucos". A recém-mãe acredita que "se houvesse mais apoios e incentivos, havia mais bebés".
A licença de maternidade termina em agosto e depois terá ainda direito a um mês de subsídio de desemprego, que ficou suspenso. Vânia não esconde a preocupação com o futuro. Depois de agosto, nem subsídio nem licença. "O que vale é que aqui temos sempre trabalho e começam as vindimas" constata. Além disso, é mãe "e uma mãe tem o dobro da coragem".
Leiria
Não tem pé-de-meia mas é feliz
Ariana Feliciano, 33 anos, tem três filhos, e recebe 400 euros de licença de maternidade do mais pequeno que nasceu a 9 de março. Trabalha em part-time num supermercado, para poder tomar conta das crianças quando regressam da escola. A este valor soma abonos de família, pensões e um apoio por ter resgatado uma menina, de nove anos, Íris, de uma família negligente. Tudo é gerido com mestria para que nada falte em casa.
O apoio suplementar do Serviço de Atendimento e Acompanhamento Social dos Marrazes, freguesia de Leiria onde vive, é determinante para que haja comida na mesa. O cabaz que recebe todos os meses traz legumes congelados suficientes para fazer sopa todos os dias, seis litros de leite por pessoa, massas, arroz, enlatados, pescada congelada, bolacha Maria e queijo ou frango. "Poupo ali 200 euros", assegura Ariana.
A primeira preocupação quando recebe é pagar a renda, de 260 euros, valor que considera "um achado". Apesar disso, gostava de beneficiar de uma habitação social. "Sei de muita gente que vive em bairros sociais, sem necessidade nenhuma".
Apesar das dificuldades, Ariana não ficou indiferente ao caso de uma menina, vítima de negligência. Ao ter conhecimento da situação, recebeu-a em casa, como família de acolhimento. "Não trazia nada", recorda. Hoje, Íris faz parte da família monoparental e é tratada da mesma forma que os irmãos Alexandre, de 13 anos, André, de 3 anos, e Akari, de dois meses.
"Sou uma mulher superfeliz", garante Ariana. "Baixar os braços não é comigo". A prova de que é uma pessoa determinada é que conseguiu amealhar dinheiro para dar entrada para um carro. O seguro é pago com o subsídio de Natal e o combustível, tal como as contas da casa, com os abonos de família. "Costumo acabar o mês com as coisas orientadas. Quando me sobram 20 ou 30 euros, fico toda contente. Não tenho é pé-de- meia". Nos meses mais difíceis, socorre-se da mãe. "Por vezes, adio certas compras para a semana seguinte, para aproveitar as promoções". Contudo, garante que não faltam bens essenciais aos filhos.