Todos os dias, o secretário de Estado do Planeamento, José Mendes, escreve sobre a viagem de Bragança a Sagres de bicicleta.
Corpo do artigo
Casa Branca. A placa ali estava, à beira da estrada, naturalmente alusiva ao casario caiado típico do Alentejo. Como gosto de me rir enquanto pedalo, pensei que talvez pudesse fazer um desvio para cumprimentar o presidente Trump. Na impossibilidade, olhei para o outro lado da estrada e dei com um enorme sobreiro, despido do sobretudo de cortiça. A imagem trouxe-me à memória uma história de um outro americano, nos tempos que correm quiçá presidenciável.
Há uns bons anos, no calor do debate sobre a comparação entre as rolhas de cortiça e as de plástico, o dito cidadão terá manifestado a sua revolta pelas práticas insustentáveis dos portugueses, ao abaterem tantas árvores centenárias apenas para delas retirarem a cortiça. Alguém teve de lhe explicar o óbvio. A cortiça não era como marfim, pelo que as árvores não tinham o destino dos elefantes.
O tema da sustentabilidade andava-me na cabeça desde que parti de Bragança. Era preciso encontrar um ritmo regular, consumindo os meus recursos físicos na mesma medida que os repunha. O elemento equilibrador foi sempre a água. Assim cheguei ao Alentejo montado numa geringonça com duas rodas e, imagine-se, sem motor.
Olho à minha volta, e deleito-me com as curvas arredondadas dos montes. Se tivesse sexo, a paisagem alentejana era mulher. Insinua-se e, quando quer, enche-nos a alma.
Mas será este mar sem sal sustentável? Serão o sobreiro e a oliveira as duas chaves gémeas que dão acesso ao tesouro dos territórios equilibrados e perenes? Mais uns quilómetros e faz-se luz. O amarelo do coberto vegetal começa a ser listrado por faixas de outras cores, maioritariamente verdes. Outras culturas, outros filhos da terra, outra diversidade, outro valor. Escondido no mosaico multicolor, umas veias de água dão vida ao plantio.
É a água do Alqueva, explica-me um local. Até mudou o clima, trouxe vida e futuro.
A sustentabilidade não é, afinal, um conceito fechado. Tal como na pedalada, com mais água podemos ir mais longe. O futuro pode ser líquido, inodoro, insípido e incolor. E não devemos desistir dele.