Em 2018, 28,35% dos partos foram feitos por cirurgia. Tendência preocupa médicos. Autoridades relativizam.
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Pelo segundo ano consecutivo a taxa de cesarianas voltou a aumentar, respondendo, no ano passado, por 28,35% dos partos realizados em entidades do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Numa altura em que sobem também as taxas de mortalidade materna e infantil, a comunidade médica mostra-se preocupada com os números, que, entende, devem ser analisados no seu conjunto. Já as autoridades de saúde consideram 2017 e 2018 como exceções, destacando antes a diminuição gradual de cesarianas de ano para ano.
De acordo com os dados do Portal da Transparência, em 2018 foram realizadas 19 629 cesarianas, mais 3% face a 2017. Analisando os partos, o aumento foi mais ténue, de 1%. Contactadas pelo JN, a Direção-Geral da Saúde e a Administração Central do Sistema de Saúde, numa resposta conjunta, frisam que "a taxa de cesarianas tem registado uma diminuição gradual de ano para ano, com exceção nos últimos dois anos". Olhando para a evolução entre 2010 e 2017, prosseguem, "a redução foi de quase 5%", resultados "reconhecidos pela própria Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE)".
De acordo com o relatório "Health at a Glance, 2017", Portugal era o décimo país da OCDE com a mais alta taxa de cesarianas. Na Europa, em 2016, 28% dos bebés nasceram por cesariana.
Maior peso no Interior
Sublinhando que a "realização de uma cesariana pode trazer benefícios de saúde inequívocos para a grávida e para o filho, mas a sua utilização abusiva, sem motivos, acarreta riscos acrescidos para ambos", DGS e ACSS admitem outra explicação. O facto de os hospitais do SNS centralizarem os casos mais complexos, que "podem, muitas vezes, originar a necessidade de efetuar cesariana por critérios clínicos de segurança". O que, concluem, "pode originar alguma flutuação na taxa de cesarianas".
É nas regiões do Alentejo e do Norte do país que as cesarianas assumem maior peso no total de partos: 31,2% e 28,8%, respetivamente. Apesar de em menor número, os dados mostram que é no interior do país que estas cirurgias são predominantes. Na Unidade Local de Saúde do Nordeste, no ano passado 42% dos partos realizados foram cesarianas (ler ao lado), seguindo-se o Centro Hospitalar Trás-os-Montes e Alto Douro (37,4%) e o Centro Hospitalar Universitário Cova da Beira (36,9%).
Para o presidente do Colégio de Especialidade de Ginecologia/Obstetrícia da Ordem dos Médicos, esta preponderância no interior "será seguramente por falta de recursos, não por gravidezes de alto risco". A que se juntará, admite João Bernardes, o facto de os médicos serem "pressionados para cesariana a pedido da mulher".
Quem se mostra também preocupado é o antigo presidente da Comissão Nacional para a Redução da Taxa de Cesarianas: "Em 2017 registou-se uma pequena variação, mas no ano passado parece haver uma tendência para manter essa subida". Defendendo Diogo Ayres de Campos que se promova um "estudo aprofundado". Que, diz João Bernardes, deveria analisar, em conjunto, o aumento das cesarianas e das mortalidades infantil e materna.
Outros dados
Privados por revelar
No privado, e obrigando a lei a reporte de dados, nem a DGS, nem a ACSS facultaram dados ao JN. A taxa de cesarianas no privado é o dobro da do público, "que nenhuma regra de boas práticas ou combinação de risco poderá explicar", lê-se no último Relatório da Primavera do Observatório Português dos Sistemas de Saúde.
Penalizações
O Governo definiu um limite - 30% -, a partir do qual os hospitais deixam de ser pagos pelos respetivos episódios de internamento. Em 2018, dez ultrapassaram essa fasquia.
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