Tribunal de Contas, municípios, arquitetos, engenheiros e construtores com reparos ao diploma do Governo. Marcelo promulgou, mas também criticou.
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O decreto-lei que altera as regras relativas às obras públicas, promulgado pelo presidente da República, esta quarta-feira, está a ser alvo de críticas de vários quadrantes. Dos municípios ao Tribunal de Contas, passando pelas ordens dos arquitetos, engenheiros e associação de construtores, todos alertaram para a falta de transparência e concorrência que o diploma pode originar. O Governo recusa divulgar o decreto-lei e enviou-o para Belém sem passar pelo Parlamento.
Na base das críticas ao decreto-lei está a generalização do regime de conceção-construção que, até agora, só podia ser utilizado em situações excecionais. Este regime prevê que a empresa que vença o concurso público de obra também fique responsável pelo projeto de arquitetura. Antes, tinha de haver pelo menos dois concursos: um para o projeto e outro para a obra.
Com esta opção, o Governo quer "simplificar e agilizar os procedimentos de contratação pública" para dar resposta ao PRR, justificou o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, André Moz Caldas, na semana passada, quando os ministros aprovaram o documento.
Marcelo deixa avisos
Ontem, Marcelo Rebelo de Sousa promulgou o diploma, mas lembrou que o documento "levantou objeções, designadamente em matéria de transparência, de livre concorrência e de eventual concentração excessiva de obras, ao Tribunal de Contas e à Associação Nacional de Municípios". O presidente da República promulgou-o pois entende que é "indispensável adotar medidas excecionais para tentar recuperar o tempo transcorrido e permitir a utilização das ajudas europeias" face ao "relativo deslizar da execução" do PRR.
Além do Tribunal de Contas, municípios e Presidência da República, também a Ordem dos Engenheiros deixou reparos. Sem se opor diretamente à medida, o bastonário Fernando de Almeida Santos pediu ao Governo que salvaguardasse "a obrigatoriedade de apenas se recorrer ao regime de conceção-construção excecionalmente, sempre que se tratem de obras de especial complexidade ou que o prazo do investimento o exija".
Gonçalo Byrne, bastonário da Ordem dos Arquitetos, vai mais longe e acusa o Governo de "fechar o acesso concorrencial à atividade de projetistas, sejam eles arquitetos, engenheiros ou paisagistas". Na mesma senda, o presidente da Associação dos Industriais de Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN), Manuel Reis Campos, critica as "limitações da concorrência" que o Governo introduziu, transferindo "o risco e a responsabilidade dos investimentos para as empresas".
Sem consulta pública
As críticas foram feitas à versão preliminar do diploma pois a versão final só o Governo e a Presidência da República conhecem. A versão inicial foi enviada pelo Governo para várias entidades se pronunciarem, mas não foi colocada em consulta pública. Essas entidades desconhecem a versão final. O JN requereu-a ao Ministério da Presidência, mas o pedido foi recusado. O Parlamento também não conhece o diploma, ainda que dez deputados, juntos, possam pedir a apreciação parlamentar após a publicação em Diário da República.
Conceção-construção
É alargado o leque de situações em que as entidades públicas podem optar pelo regime de conceção-construção, em que o empreiteiro fica responsável pela obra e projetos de arquitetura, engenharia e especialidades. Até agora era excecional. É a medida mais criticada.
Custos do trabalho
A entidade pública que contrata passa a ter a possibilidade de exigir aos candidatos uma folha com a estrutura de trabalho da obra, de modo a garantir o cumprimento das regras laborais. É uma alteração que recebeu elogios das entidades que foram consultadas.