Associação Zero alerta que a dependência do glifosato na agricultura atrasa a adoção de medidas ecológicas.
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A licença de cinco anos que permite o uso de glifosato na União Europeia deveria terminar em dezembro de 2022, mas foi prorrogada por mais um ano. A decisão da Comissão Europeia é temporária e visa dar mais tempo às várias entidades responsáveis pela avaliação dos riscos para a saúde humana e para o ambiente. O processo de avaliação começou em 2019, mas atrasou-se e não foi concluído a tempo do termo da atual licença.
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Bruxelas optou, então, pela extensão até 15 de dezembro de 2023, tal como determina a lei, depois da proposta de criar uma nova licença de utilização do glifosato não ter conseguido a maioria necessária para avançar. Portugal foi um dos países que votaram a favor da extensão. Isto, porque o Grupo de Avaliação do Glifosato, constituído pela França, Hungria, Países Baixos e Suécia), a Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA) e a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (EFSA), "concluiu pela segurança deste produto", justificou o Ministério da Agricultura e da Alimentação, em resposta ao JN.
Uma posição que Pedro Horta, membro da associação ambientalista Zero, entende que poderá refletir a "grande dependência deste herbicida na agricultura" e a "influência do lóbi agroindustrial". Este lóbi tem contribuído para a falta de "reformas significativas, que orientem o vasto investimento público na agricultura para a adoção de práticas agroecológicas", acrescenta ainda. E lembra que Portugal subscreveu, em 2014, os princípios da proteção integrada das culturas, que tornou obrigatório o uso de químicos apenas como último recurso.
Avaliar os riscos
Para a Confederação de Agricultores em Portugal (CAP), sem mais avaliações científicas, "não existe justificação plausível" para a substância ativa ser retirada da Europa.
Questionado sobre as alternativas a que os agricultores podem recorrer caso a licença do uso do herbicida não seja renovada, o secretário-geral da CAP, Luís Mira, sublinhou, em resposta ao JN, que "é essencial que, rapidamente, sejam postos à disposição dos agricultores uma série de "ferramentas"" para conseguirem produzir "mais alimentos, de uma forma cada vez mais sustentável, tendo sempre em atenção que, sem sustentabilidade económica, não existe sustentabilidade social e ambiental". O responsável defende, por isso, que essas soluções devem ser usadas em simultâneo com o recurso a pesticidas, cujos riscos devem continuar a ser avaliados.
O futuro do herbicida será decidido até ao fim do ano, após a Comissão Europeia analisar todos os relatórios. Já em maio de 2022, o comité de avaliação de riscos da ECHA concluiu que as provas científicas atuais não permitem classificar a substância como cancerígena, mas concordou que continua a ser considerada passível de causar graves problemas oculares e de ser tóxica para a vida aquática com efeitos duradouros. Prevê-se que o parecer da EFSA seja conhecido em julho.
Proibição deixa produtores europeus em desvantagem
Embora o uso não seja monitorizado, a agricultura nacional dependente muito do uso de herbicidas como o glifosato. Luís Mira, secretário-geral da Confederação de Agricultores de Portugal (CAP), alerta que a proibição criará desigualdades entre os produtores.
Como reage a CAP à prorrogação do uso de glifosato durante este ano?
A Comissão Europeia teve em conta a opinião da enorme maioria dos estados-membros, tendo, assim, imperado o bom senso e a salvaguarda da saúde pública, já que, sem mais uma avaliação científica sobre esta questão, não existe nenhuma justificação plausível para a retirada desta substância ativa.
O que significa o uso do herbicida para os agricultores portugueses?
Esta prorrogação permite continuar a ter acesso a um herbicida com um largo espetro de ação sobre as mais diversas plantas infestantes, que, apesar de ter sofrido aumentos de preço significativos nos últimos tempos, tal como todos os fatores de produção, continua a ser dos mais acessíveis e com uma eficácia no campo comprovada, ao longo de dezenas de anos e sem efeitos colaterais.
Que alternativas tem o Governo incentivado junto dos agricultores?
O Governo tem seguido as diretivas comunitárias nesta matéria. A CAP entende que é essencial que, rapidamente, sejam postas à disposição dos agricultores uma série de "ferramentas", de forma a cumprir esses propósitos. Destacamos, em paralelo, a digitalização, a agricultura de precisão, a possibilidade de serem usadas novas técnicas genómicas ao nível do melhoramento vegetal e, ainda, um claro investimento ao nível dos biopesticidas. Todos estes vetores terão de ser conjugados com a utilização de produtos fitofarmacêuticos que, a cada momento, devem ser confrontados com os avanços científicos que se forem verificando e, em caso de risco elevado, serem retirados do circuito comercial, o que não se passou com o glifosato.
O herbicida é usado por países concorrentes?
O glifosato é largamente utilizado pelos nossos concorrentes de países terceiros na produção de bens alimentares, que são postos à disposição dos consumidores europeus sem qualquer restrição. A proibição desta substância ativa acabará por criar uma situação de concorrência desleal entre operadores ao nível mundial, com clara desvantagem para os produtores europeus.