Milhares de venezuelanos e lusodescendente fizeram fila em oito mesas em Portugal para votar na consulta popular contra a continuidade de Nicolás Maduro na presidência da Venezuela, e o seu projeto para rever a Constituição.
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Pais, filhos, netos, genros, noras, amigos. Chegavam em grupos, munidos de bandeiras e camisolas a rigor, os venezuelanos que, em Braga, participaram na consulta popular contra a continuidade de Nicolás Maduro na presidência da Venezuela e o seu projeto para rever a Constituição. Menos de duas horas após a abertura da urna instalada no restaurante 100 Montaditos, junto à Universidade do Minho, 102 pessoas tinham votado.
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Quem por ali passasse via um ambiente de festa, apesar da seriedade daquilo que se discutia dentro do estabelecimento. "A Venezuela precisa de ajuda. Temos crimes de lesa-humanidade todos os dias", dizia-nos Susana Bernardo, que numa semana conseguiu organizar a iniciativa em Braga, a pedido da Associação Civil de Venezuelanos em Lisboa - Venexos. A expectativa de mudança, acredita, é grande: "Meia hora antes de abrir a votação, já havia gente à porta". Venezuelanos puros e luso-venezuelanos.
Celestino Nascimento é um deles. Sentiu-se forçado a regressar a Portugal há um mês, depois de uma vida de 52 anos na Venezuela. "Decidimos vir porque não se pode viver lá. Muitos ladrões, mortes, temos a Guarda Nacional, a polícia... é muito difícil". Vinha com os filhos, o genro e uma neta que também quiseram dar um contributo, ainda que simbólico, "para acabar com a ditadura no país". Ontem, Celestino vivia um dia de "esperança".
Contra a Constituinte
"Temos que manifestar a vontade de mudança no país. Quem está fora tem obrigação de contribuir para restituição da democracia na Venezuela". Ana Cunha, lusodescendente de origem bracarense, foi votar com o marido Jovanni Fello, venezuelano. Ana acredita que as eleições para a Constituinte marcadas por Maduro, a 30 de julho, só servirão para o próprio "ter o controlo do poder". Jovanni explica: "Ele não convocou o povo a votar, para saber se quer uma nova Constituição. Isso é completamente ilegal e ilegítimo. Vai convocar 500 pessoas a dedo para mudar as leis como quer".
Ambos regressaram a Braga em 2010, com os pais de Ana, que ainda têm negócios na Venezuela. "Ainda tenho que ir lá algumas vezes, mas nunca me sinto seguro", lamentou o pai, Manuel, que partiu para aquele país aos 11 anos. Já Ana e Jovanni não voltarão tão cedo. Querem criar o filho em segurança. "É um risco ter um bebé lá. Há casos de pessoas a morrer no hospital porque não têm medicamento para uma alergia".
A tristeza das palavras contrastava com o ambiente animado que, para Susana Bernardo, revela o espírito do povo venezuelano. Além disso, acredita que ontem era "um dia de festa", "o início do fim" de Nicolás Maduro. "Internacionalmente, temos que ser ouvidos. Isto vai ter efeitos psicológicos para todos nós", garante Susana, também ela impelida a deixar a Venezuela há três anos, após o sequestro e morte de um familiar.
Para lá de marcar uma opinião, a consulta popular terá servido para fazer um levantamento real dos venezuelanos em Portugal. Os votantes que passaram pelas oito mesas de votos instaladas em Portugal (três na Madeira), deixaram o nome, e-mail, profissão e cidade de residência.