Governo cria carta de condução digital e dispensa condutor de trazer título em papel

Este ano, 18 mil condutores foram apanhados a usar telemóvel ao volante
Leonel de Castro/Global Imagens
Uso do telemóvel ao volante levará à perda de três pontos e o valor da multa duplicará para 250 euros. Governo altera Código da Estrada e proíbe trotinetas elétricas velozes de circular nas ciclovias.
Os condutores deixarão de ser obrigados a ter a carta de condução e os documentos do veículo em papel na carteira. A carta mudará de grafismo e passará a ter uma versão digital. Os documentos da viatura, como o registo de propriedade, o certificado do seguro e a ficha de inspeção, estarão armazenados numa aplicação móvel.
No entanto, os agentes de autoridade terão de estar equipados com os meios eletrónicos para ler e permitir a comprovação dos dados contidos nos documentos digitais nas operações de fiscalização de trânsito. Caso não disponham desses meios, o automobilista terá trabalho acrescido: fica obrigado a apresentar os documentos em papel na esquadra da PSP ou no quartel da GNR no prazo de cinco dias.
Esta é uma das alterações que o Governo vai introduzir no Código da Estrada, a par do agravamento da punição pelo uso do telemóvel ao volante, da interdição à circulação de trotinetas velozes nas ciclovias e da definição de regras para a condução de tratores.
A secretária de Estado da Administração Interna, Patrícia Gaspar, garantiu domingo que está para breve a conclusão da revisão do Código da Estrada, iniciada há mais de um ano. O diploma, a que o JN teve acesso, remete a definição dos termos da carta de condução digital para uma futura portaria do Governo. O grafismo do título de condução em papel também vai mudar, com a introdução de um código de barras bidimensional, tipo QR Code, e a duplicação da foto do condutor em tamanho reduzido no canto inferior direito. Esta mudança visa introduzir melhorias de segurança e permitir a leitura digital da carta e dos dados associados, argumenta o Governo naquele projeto de decreto-lei, enviado recentemente para parecer da Associação Nacional dos Municípios e da Comissão Nacional de Proteção de Dados.
Dispensa de capacete
O uso do telemóvel ao volante terá multas agravadas e será equiparado à condução sob a influência de álcool. A coima duplicará: de 120 para 250 euros e de 600 para 1250 euros. Quem for apanhado, arrisca perder três pontos na carta de condução. Até setembro de 2020, as autoridades já autuaram quase 18 mil condutores. Em 2019, registaram-se 34 810 infrações.
Avança, ainda, a proibição da circulação nas ciclovias e nas vias mistas para velocípedes e para peões de trotinetas e de outros veículos de duas rodas elétricos que atinjam velocidades superiores a 25 quilómetros por hora e tenham motor com potência acima dos 250 quilowatts. A restrição impõe-se "atendendo à proliferação de veículos equiparados a velocípedes que podem circular" em ciclovias e "à sua extrema perigosidade na partilha do espaço".
Desrespeitar esta regra será uma contraordenação grave, punível com multa de 60 a 300 euros, apreensão imediata da viatura e perda de dois pontos na carta. Na prática, apenas as trotinetas ou velocípedes elétricos com uma velocidade máxima de 25 quilómetros por hora (correspondente à capacidade dos aparelhos disponíveis para partilha em muitas cidades) continuarão a ser equiparadas às bicicletas. As bicicletas elétricas mantêm o direito a utilizar as ciclovias, desde que o motor só funcione quando o ciclista está a pedalar. Os veículos com maior potência perdem essa equiparação e o seu regime de circulação será fixado por decreto regulamentar.
O Governo aproveita para revogar a obrigatoriedade de uso de capacete para os condutores de velocípedes e de trotinetas com motor elétrico, assim como a sanção por coima de 60 a 300 euros. A revogação da norma, contida no atual Código da Estrada, vem na sequência de um parecer da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, emitido em 2018 e contestado pela DECO, que defende que o capacete não é obrigatório.
Outras mudanças no Código da Estrada
Pernoita de autocaravanas punida
A pernoita (entre as 21 h e as 7 h do dia seguinte) e o aparcamento de autocaravanas ou de rulotes fora de locais autorizados serão punidos com coima de 60 a 300 euros. Se a autocaravana estiver estacionada em território da Rede Natura 2000 ou de parques naturais, a multa será agravada para um mínimo de 120 euros e um máximo de 600 euros. A fiscalização compete à GNR, à PSP e à Autoridade Marítima Nacional, apenas nas zonas costeiras.
Crianças sem cadeira auto nos TVDE
Tal como os táxis, os automóveis ao serviço das plataformas de TVDE (transporte de passageiros em veículos descaraterizados), como a Uber, deixarão de ser obrigados a transportar as crianças em sistemas de retenção, vulgo cadeira auto. Os menores estão impedidos de viajar nos bancos da frente. Os condutores de TVDE também terão de obedecer às regras mais apertadas que se aplicam aos taxistas, no que concerne ao consumo de álcool e ao agravamento de coimas de infrações rodoviárias.
Carta caduca com o falecimento
A carta de condução caducará com o falecimento do condutor. Essa condição não está prevista na lei e abre a porta à apropriação indevida da identidade da pessoa falecida. A data de óbito será acrescentada ao registo nacional de condutores. Também caducará se o condutor em regime probatório for condenado pela prática de crime ligado à condução, de contraordenação muito grave ou de uma segunda contraordenação grave. A carta não poderá ser renovada se tiver caducado há mais de 10 anos. Hoje, o Código da Estrada não permite a renovação de cartas caducadas há mais de cinco anos.
Avaliação psicológica sem papel
Tal como o atestado médico, o certificado de avaliação psicológica, necessário para revalidar a carta, terá de ser enviado eletronicamente. Poderá ser entregue em papel em caso de mau funcionamento do sistema informático, desde que seja transmitido por via eletrónica no prazo máximo de 72 horas.

