O Programa 1.º Direito, criado em junho de 2018 e que se propunha resolver a carência habitacional de mais de 25 mil famílias até abril de 2024, tem contratualizada, para já, a execução de 18% dos fogos exigidos ao fim de dois anos de vigência.
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Até 24 de julho, foram assinados os acordos para disponibilizar 4740 novas habitações em cinco municípios: Lisboa, Almada, Oeiras, Évora e Arruda dos Vinhos. Acresce que o levantamento nacional, concluído em fevereiro de 2018, já não corresponde à realidade atual e a necessidade é muito maior do que a estimada - mais quase 80%.
A meta ambiciosa do primeiro-ministro, António Costa, que se comprometeu a eliminar "todas as situações de carência habitacional" até 25 de abril de 2024 - ano em que a Revolução dos Cravos assinala os 50 anos - dificilmente será concretizada. O financiamento do 1.º Direito, com 700 milhões de euros do Orçamento do Estado até 2024 e, no máximo, mais mil milhões em empréstimos bonificados, foi desenhado a pensar na resposta às 25 762 famílias identificadas no diagnóstico do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU). Percebe-se agora que essa resposta corresponderá a uma pequena parte das necessidades no país. O número nacional de 25 mil famílias necessitadas de habitação digna é irrealista.
A presidente do IHRU, Isabel Dias, já reconheceu que as estratégias locais de habitação entregues pelas câmaras ao instituto relevam um aumento das carências "na ordem dos 77%" face ao levantamento de 2018.
Até agora, só 34 dos 308 municípios apresentaram as suas estratégias e, dessas, 17 encontram-se aprovadas. "As estratégias já entregues preveem o financiamento de mais de 20 mil soluções habitacionais, das quais cerca de dois terços serão património público e os restantes serão apoios à reabilitação de habitação própria", esclarece o instituto ao JN.
428 milhões em cinco câmaras
O IHRU celebrou, até ao dia 24 de julho, cinco protocolos com Lisboa, Oeiras, Almada, Évora e Arruda dos Vinhos, correspondendo a um investimento total de 428 milhões de euros. A comparticipação do instituto ascende a 153 milhões.
Entretanto, a Câmara de Matosinhos chegou a acordo com o IHRU para aplicar 57 milhões até 2025 e, assim, suprir as carências de 1691 famílias. A maior fatia é concedida pelo instituto: 51,7 milhões, dos quais 22,9 milhões a fundo perdido e 28,7 milhões de empréstimo bonificado.
Lisboa avança com 1.ª fase
A Câmara de Lisboa avançará, numa primeira fase, com a disponibilização de 1527 fogos: 274 serão construídos, mil reabilitados e 253 adquiridos e reabilitados. Oeiras providenciará 1793 casas: 1026 recuperadas e 767 adquiridas.
Arruda dos Vinhos vai renovar o Bairro Social João de Deus, beneficiando 15 fogos e construindo mais 16. A Câmara de Évora, que estima ter 1336 famílias a residir em "condições indignas", compromete-se a garantir 467 habitações até 2026. Além de edificar 200 casas, vai requalificar o Bairro General Humberto Delgado (86 famílias) e mais 135 fogos camarários que fiquem vagos nos próximos seis anos. Dará ainda apoio ao arrendamento a 46 famílias.
Já o município de Almada acertou a reabilitação de 481 casas e a construção de mais 441 num total de 922. O número fica aquém das necessidades identificadas pela estratégia local da autarquia, que estima serem precisas cerca de oito mil habitações até 2029. E só para realojar quem hoje vive em áreas de risco e em barracas em Almada serão necessários 1710 fogos.
O Levantamento Nacional das Necessidades de Realojamento Habitacional foi elaborado pelo IHRU após consulta aos 308 municípios. À data, muitas autarquias desconheciam o retrato total da carência nos seus territórios.
Nove vezes mais em matosinhos
Arruda dos Vinhos não identificou qualquer carência, Évora apontava 153 agregados em habitações indignas (são 1336), Lisboa indicou 2867 famílias (só a última lista de espera por habitação social tem 4237 candidatos) e Matosinhos contabilizou 190 famílias a precisar de ajuda. Quase nove vezes menos do que as necessidades identificadas na sua estratégia local. Estas discrepâncias repetem-se em muitos municípios.
Olhando para as 17 autarquias cuja estratégia local de habitação já mereceu o aval do IHRU (Porto, Lisboa, Almada, Évora, Arruda dos Vinhos, Alfândega da Fé, Ovar, Celorico da Beira, Funchal, Guimarães, Lousada, Mortágua, Oeiras, Silves, Torre de Moncorvo, Faro e Viseu), todos registam um aumento das necessidades. No levantamento de 2018, este grupo contava com 9890 agregados familiares a precisar de ajuda. Hoje, e concluídos os diagnósticos municipais, a carência duplicou e ascende a 19 mil famílias.
Há quase 11 mil candidatos a 707 casas acessíveis
Há quase 11 mil candidatos a uma habitação a preços acessíveis e a plataforma de imóveis, gerida pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), contava com 707 alojamentos até 17 de julho. O programa está a dar resposta a 1,8% dos pedidos, com 194 contratos ativos. A maioria dos alojamentos arrendados fica na Área Metropolitana de Lisboa.
A renda média é de cerca de 580 euros na Grande Lisboa e de 468 euros na Área Metropolitana do Porto. É a segunda região do país com maior número de contratos celebrados no Programa de Arrendamento Acessível. São as duas regiões onde os jovens e as famílias testemunham maior dificuldade em encontrar uma casa a preços comportáveis.
Apesar da pandemia de covid-19, a integração de novos imóveis na plataforma do arrendamento acessível não abrandou. Entre março e 21 de maio, foram disponibilizados mais 115 alojamentos. Nos dois meses seguintes, entraram mais 116 casas. O stock total é de 707 habitações: "90% são de pessoas singulares [privados] e os restantes são de pessoas coletivas ou heranças indivisas", precisa o IHRU em resposta ao JN.
No entanto, o ritmo de entrada de novas habitações é muito inferior à acelerada cadência de novos candidatos. Entre 21 de maio e 17 de julho, foram submetidos, em média, dois novos alojamentos por dia, enquanto, em igual período, chegaram 24 candidaturas diárias em média. Até 17 de julho, o IHRU registava 10 724 candidatos à procura de uma habitação com renda abaixo do valor do mercado.
Mais 34 contratos
A celebração de novos contratos esmoreceu nos últimos dois meses. Reconhecendo que a crise económica provocada pela pandemia, teve impacto no programa nacional, o IHRU sublinha, porém, que foram celebrados 55 contratos entre março e 21 de maio. Desde essa data, só foram firmados mais 34 contratos.
A expectativa do IHRU passa por disponibilizar mais uma centena de casas públicas até ao final deste ano, depois de terem sido integradas 18 habitações do Estado em Mangualde.