Depois do Porto, os presidentes das câmaras da Trofa e da Póvoa de Varzim estão decididos a sair da Associação Nacional de Municípios (ANMP). Vão avançar, em junho, com o processo de desvinculação nos órgãos municipais, mas outras câmaras poderão segui-los, como Coimbra.
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O défice nas contas da descentralização no setor da Educação, que ameaça desequilibrar os orçamentos camarários e não foi corrigido no Orçamento do Estado aprovado na sexta-feira, é o ponto da ignição.
Estas autarquias estão preocupadas com a insuficiente resposta do Governo e apontam o dedo à ANMP, que, em nome dos municípios, tem liderado as negociações com o Executivo. A insatisfação incendiou, ontem, na reunião do Conselho Metropolitano do Porto, com Aires Pereira (presidente da Câmara da Póvoa de Varzim) a comunicar a vontade de desvinculação da ANMP aos autarcas vizinhos. Trofa dará o mesmo passo. A Assembleia Municipal do Porto decide a saída da Invicta na segunda-feira. A incógnita é se Rui Moreira convence o PSD a aprová-la.
Já José Pinheiro, presidente de Vale de Cambra, só equacionará a desvinculação, caso se esgote "a possibilidade de reequilíbrio" das contas da descentralização. O autarca de Coimbra, José Manuel da Silva, vai analisar o Orçamento do Estado, antes de se pronunciar.
Reunião agendada
A debandada da ANMP não será o caminho de boa parte dos autarcas do Grande Porto (nem do país), mas a maioria partilha os receios de quem escolhe a desvinculação, na certeza de que as transferências financeiras para a gestão das escolas são muito deficitárias.
"Há uma insatisfação nas autarquias que é preciso reconhecer. O processo negocial", levado a cabo nos últimos cinco anos, "não trouxe as respostas que os municípios pretendiam", admite Eduardo Vítor Rodrigues. O líder da Área Metropolitana do Porto sente o "desânimo", porém crê que é possível manter o diálogo e "que todos continuem na ANMP a trabalhar". Ontem ficou decidido que, no início do próximo mês, o Conselho Metropolitano do Porto voltará a reunir-se e os autarcas trarão os cálculos da descentralização nos seus concelhos, para que possam afinar uma posição conjunta, antes do encontro com a ministra da Coesão Territorial, marcado para junho.
Perigo da bancarrota
Com o Orçamento do Estado em debate, o presidente da Trofa tinha a expectativa de que as reivindicações do Poder Local fossem atendidas, mas o défice na Educação não ficou resolvido com o acréscimo de 10 milhões ao Fundo de Financiamento da Descentralização.
"Não há desculpas, tendo o PS maioria na ANMP e tendo maioria absoluta no Governo", argumenta Sérgio Humberto, que subscreve "a 100%" as críticas de Rui Moreira. "O processo de descentralização tem sido vergonhosamente conduzido, com a conivência da atual e da anterior Direção da ANMP. Ou esta Direção muda de vida ou temo pela desagregação da ANMP".
Aires Pereira não se sente representado na ANMP, desde a saída do socialista Mário Almeida. "Esta paz podre não pode continuar. Estão a conduzir os municípios para a bancarrota e não vou pactuar com isso". O presidente da Póvoa recusa "levar o município a uma situação de sustentabilidade financeira muito débil" e pôr em causa os investimentos em curso, porque a descentralização não foi "devidamente acautelada".
Vereador pressiona para voto contra do PSD na Assembleia
O vereador Vladimiro Feliz, que foi cabeça de lista do PSD à Câmara do Porto nas últimas autárquicas, está a fazer pressão no sentido de, na reunião da Assembleia Municipal de segunda-feira, a bancada do partido votar contra a saída da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) proposta por Rui Moreira, a quem falta maioria de deputados. O social-democrata mantém a posição que teve na reunião do Executivo camarário, em abril, na qual foi aprovada a proposta do presidente da Câmara.
O PSD dividiu-se, já que o vereador Alberto Machado optou pela abstenção, ao contrário de Vladimiro. O argumento do cabeça de lista à Câmara é o de que o alvo das pressões deve ser o Governo, e não a ANMP, evitando que esta saia fragilizada. Quando os sinais do Governo continuam a ser vistos como insuficientes, o JN sabe que Vladimiro tem procurado assegurar no partido a ideia que o grupo municipal deve votar contra a proposta de Moreira. Contactado pelo JN, o autarca do PSD não quis, porém, tecer comentários. Além disso, partido e eleitos ainda vão reunir-se amanhã.
Apesar dos apelos da líder da ANMP, Luísa Salgueiro, para que Moreira adiasse a decisão sobre uma desfiliação e esperasse por resultados da negociação com o Governo, a Câmara avançou com a votação em abril. Agora, a Assembleia Municipal tem de deliberar e os independentes não têm maioria, ao contrário do que sucede no Executivo. O JN tentou, sem sucesso, comentários dos líderes da Concelhia e da bancada.
Pormenores
Mais 10 milhões
No Orçamento do Estado, o Fundo de Financiamento da Descentralização foi reforçado em 10 milhões, aumentando a dotação da Educação para 729 milhões.
Novos critérios
Os critérios das transferências do Estado para a manutenção das escolas mudou. Por escolas com menos de 10 anos, as câmaras receberão 2,80 euros por metro quadrado (m2); com mais de dez anos e menos de 20, o valor sobe para 4,20 euros por m2; com 20 ou mais anos, será de 5,60 euros por m2.
Elogio a Salgueiro
Eduardo Vítor Rodrigues deixou, ontem, um elogio a Luísa Salgueiro, que não esteve presente na reunião do Conselho Metropolitano do Porto, considerando que, em três meses, "fez mais" do que Manuel Machado em quatro anos de liderança da ANMP.