Parlamento quer explicações da procuradora, Eanes talvez também as pudesse dar ao país
O presidente da Assembleia da República sugeriu que Lucília Gago explique a "Operação Influencer" aos deputados. Esquerda e PAN concordam. Ramalho Eanes diz que faz todo o sentido celebrar o 25 de novembro mas, há não muito tempo, defendia o contrário. O que mudou? Talvez o ex-presidente também pudesse explicar.
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Depois de, nas comemorações do 25 de Abril, ter convidado as famílias dos quatro últimos civis mortos pela PIDE, o presidente da Assembleia da República voltou a surpreender: defendeu que a procuradora-geral da República vá ao Parlamento explicar os processos que originam crises políticas - desde logo, o que levou à demissão do anterior Governo.
BE, PCP, Livre e PAN subscreveram de imediato a ideia (o PS não falou, mas talvez até seja o partido que mais a deseja). Do lado contrário esteve o Chega, com o argumento - sempre sedutor - de que isso será a prova de que "os políticos se protegem uns aos outros".
É evidente que, como lembrou o PCP, não só a procuradora não responde perante o Parlamento como os processos concretos não devem ser abordados. Mas é igualmente verdade que a "Operação Influencer" tem vindo a "desmoronar-se" - conforme recordou o líder parlamentar do BE - e que, pelo meio, deitou abaixo um Governo.
Nesse sentido, e usando as palavras de Aguiar-Branco, talvez faça sentido tentar mitigar a "suspeição" em torno do caso, numa era em que parecem estar a tornar-se incomodamente comuns os exemplos de líderes políticos de primeira linha próximos de cair em desgraça devido a processos supersónicos - Pedro Sánchez que o diga.
A ida de Lucília Gago ao Parlamento seria uma oportunidade para dar mostras de transparência - a tal que tantos advogam - e, até, para reforçar a confiança no Ministério Público. O país talvez precise desses sinais, até porque a queda de um Governo não é um assunto de somenos.
Eanes: celebrar novembro - sim ou não? E, afinal, o que quis o PCP?
Em época de comemorações de Abril, tão ou mais interessante do que ouvir Lucília Gago seria escutar o antigo presidente Ramalho Eanes sobre o 25 de Novembro. O próprio falou do tema esta semana, para defender que "faz inteiramente sentido" celebrar a data. Dá-se, no entanto, o caso de o Eanes de 2024 contrariar o Eanes de 2015.
Há nove anos, o primeiro chefe de Estado eleito após o 25 de Abril tinha uma perspetiva diferente sobre novembro: "Foi um momento fraturante e eu entendo que os momentos fraturantes não se comemoram; recordam-se e recordam-se apenas para reflectir sobre eles", afirmou então.
Esta sexta-feira, Eanes também acusou o PCP de ter tentado estabelecer "um regime totalitário" em 1974 e 1975. Numa altura em que a memória histórica da Revolução é cada vez mais disputada, talvez seja importante enriquecer a visão de Eanes - testemunho sem dúvida fundamental de um protagonista da época - contrapondo-lhe uma perspetiva contrária.
Ela foi publicada nas páginas do JN do passado dia 22. Em entrevista, o historiador francês Yves Léonard, especialista em História Contemporânea do nosso país, argumentou que o perigo de uma ditadura comunista "nunca foi muito evidente": "O PCP não tinha possibilidade de tomar o poder e, por outro lado, a vontade de Brejnev [líder soviético] não era fazer de Portugal um modelo da Europa do Sul, até porque o país já era membro da NATO".
Também Pacheco Pereira - historiador, conhecedor do percurso do PCP e, apesar de tudo, militante do PSD - tem posto em causa que os comunistas quisessem instaurar uma ditadura. Tendo sido Eanes uma figura de primeira linha da Revolução, seria de particular interesse que explicasse o motivo da sua mudança de posição face a novembro e, também, que aprofundasse a rua reflexão sobre o PCP. A memória histórica e o imaginário do país ficariam, decerto, a ganhar.
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