Crítica de música
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Para uma banda como os Saint Etienne, durante 35 anos associada a uma ideia de minúcia sónica e cultural absolutamente britânica, soa a divertido e lúcido acerto de contas que o seu álbum de despedida se intitule "International" (edição Heavenly). É uma despedida quase exuberante, dominada por canções pop eletrónicas, num contraste climático acentuado com a narrativa ambiental do anterior "The night", lançado em dezembro do ano passado.
Apesar do acentuado contraste superficial entre os dois registos, o rio subterrâneo da melancolia que (também) define o percurso dos Saint Etienne não falta na maioria das 12 canções de "International". Para este derradeiro capítulo, o trio formado por Bon Stanley, Pete Wiggs e Sarah Cracknell rodeia-se sobretudo de gente da pista de dança: ele é Tom Rowlands, de The Chemical Brothers, para o transcendente single "Glad"; a dupla Orbital, em "Take me to the pilot", toda uma constelação de batidas quebradas, teclados trance e arcabouço cinematográfico; e os australianos Confidence Man, que emprestam um sorriso radioso a "Brand new me". Outros ilustres escultores de canções? Nick Heyward, voz dos Haircut One Hundred, lança-se num dueto em "The go betweens". E Vince Clarke, a metade silenciosa dos Erasure, empresta brilho a "Two lovers".
O espírito dos Pet Shop Boys das primeiras danças com o house nos anos 1980 é incorporado em "He"s gone". "Save it for a rainy day" ilustraria sem problemas uma sequela de "Flashdance", mas sem carregar no saudosismo. "The last time", escrupulosamente guardado para o fim, nada tem de apoteótico (os Saint Etienne nunca foram assim), investindo antes na ternura.
"International" é classicismo, nuance e mestria. Uma súmula do território único, flutuante, dançável, classicista, bucólico e, lá está, radicalmente britânico dos Saint Etienne, aperfeiçoado com o passar das décadas mas nascido já com todas as componentes no sítio. Esta foi uma viagem maravilhosa.