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A polémica em torno da presença do treinador do F. C. Porto num torneio infantil em Espanha e o incidente envolvendo o árbitro e ainda um autarca da cidade de Cartaya devem servir para pensarmos na forma como lidamos com o desporto de formação. Para esta discussão são irrelevantes os detalhes do caso que envolve Sérgio Conceição e quem tem ou não razão. A questão está, sobretudo, que se tornaram vulgares os incidentes em jogos de crianças.
Qualquer que seja o desporto, os jogos nos escalões de formação têm pouco público e ainda menos visibilidade nos órgãos de comunicação, pelo que a maioria dos incidentes, a não ser em casos extremos, nunca se tornam conhecidos. Mas são bem mais vulgares do que pensamos e, apesar de não terem grandes consequências, assumem uma gravidade muito superior aos factos vistos de forma isolada.
O desporto ganhou uma dimensão de escape social e com ela carrega toda uma bagagem que é, em grande medida, um espelho da própria sociedade: um peso opressivo do individualismo e uma visão do crescimento das crianças essencialmente ligada à obtenção de resultados. Tudo exacerbado por uma carga excessiva da divisão clubística com que convivemos no dia a dia e pelos pais do século XXI, dispostos a tudo para garantirem um futuro de sucesso para os filhos, mesmo que para isso tenham de ser eles a fazer os trabalhos escolares e a discutir com o treinador os minutos de jogo das suas crias.
O resultado são bancadas de recintos desportivos com pais a insultarem-se mutuamente, árbitros transformados em alvos da ira irresponsável de adultos tidos como pacíficos e educados e, inevitavelmente, mais uma machadada na formação (de caráter e de cidadania) que cabe ao desporto.