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Neste espaço livre que o JN hoje nos abre, é-me dado o gosto de começar com um pedido de atenção para a figura anexa. É muito recente e compara a parcela “subnacional” da despesa pública na UE. Portugal está na 3.ª ou 4.ª piores posições, em 24 países. Somos um dos países mais centralizados da Europa. Um centralismo obsoleto, retrógrado, comprovadamente pesado e pouco eficiente, uma das causas do nosso fraco desempenho económico.
O obsoleto centralismo não se reforma?
Não, o centralismo não se reforma. Não tem capacidade nem vontade de se auto-reformar. A questão é política e de distribuição do poder. A organização dos partidos e o sistema eleitoral fomentam o centralismo do Estado, que por sua vez se repercute na qualidade das instituições. As análises sugerem uma deplorável atitude política de aversão ao reformismo. Por inércia, o nosso centralismo vai continuar a ser o que é.
Todavia, esta inércia do centralismo poderia ser quebrada pela “democracia regional” continental, de que nos falava Sá Carneiro. Sou pela democracia regional, conjugando dois princípios democráticos, inseparáveis: o da “subsidiariedade”, aos níveis subnacionais do município e da região; e o da “vigilância”, ao nível nacional, central, sobre aqueles. Por aqui, gradualmente, avançaria bem a reforma do centralismo. Defendo-o há muitos anos, mesmo sabendo que a ardilosa revisão constitucional de 1997 instituiu uma condição desigual que favorece descaradamente o centralismo.
O grandioso centralismo esquece o Interior?
Sim, esquece muitas vezes. Sobretudo, quando ressurge a tentação do centralismo pelos grandiosos projetos. Olhando só ao século XXI, essa tentação vem de Sócrates, reaparece nos últimos anos de Costa, aparenta prolongar-se em Montenegro. Se juntarmos as ferrovias de alta velocidade e o aeroporto, mais as suas acessibilidades e a nova ponte do Tejo, teremos uma enormidade. Uma hiperconcentração de investimentos que agravarão, ainda mais, os nossos desequilíbrios do Território, a favor do Litoral e contra o Interior. Quanto ao aeroporto, tentei há meses uns comentários, que são modestos avisos, estão no portal do Círculo, indicando que o Interior é absolutamente esquecido nas orientações do Governo anterior, resoluções 89/2022 e 86/2023, e prossegue esquecido nas decisões e comunicados do Governo actual.
Pode a social-democracia abraçar o centralismo?
Não, não pode. A tecnocracia pode, até pode servi-lo; a ditadura pode, até pode servir-se dele; a democracia e a social-democracia não podem, não devem. Porém, ao que parece, este Governo da AD não gosta da alternativa ao centralismo que é a “democracia regional” de Sá Carneiro e da sua AD. E porquê? Não vejo fundamentação, consistência, estudo. Vejo superficialidades, impressões, falácias. Não conheço, por exemplo, o pensamento do Governo perante aquela posição relativa, factual, de Portugal na figura anexa dos centralismos europeus. E voltando ao Interior, não percebo por que razão a social-democracia que nos governa veio anunciar a tal enormidade de acúmulos no Litoral sem, ao menos, apresentar algumas “políticas compensatórias” do Interior, dignas desse nome. As boas políticas de desenvolvimento do Interior são genuinamente social-democratas, sejam elas regionais ou sub-regionais, sejam transversais como as do Movimento pelo Interior, 2018. Mas zero, nada de vulto. Como foi possível este péssimo sinal de puro e duro centralismo?