Corpo do artigo
Ao longo dos anos habituamo-nos a ouvir relatos de problemas com a distribuição de médicos pelos serviços de saúde de todo o país, uma situação que se agudizou com o aumento do peso dos privados. Os médicos, e muito bem, deixaram de estar sujeitos às imposições do setor público, ganharam autonomia e capacidade de escolha como qualquer outro trabalhador.
Essa capacidade, como é lógico, leva-os a escolher as melhores opções de emprego. Porquê sujeitarem-se a ganhar menos e trabalhar mais em instalações exíguas e inadequadas e, ainda por cima, sem os meios indispensáveis? A resposta é óbvia, mas deixa à sociedade portuguesa um legado pesado e ao Governo uma situação difícil de resolver.
A solução passa inevitavelmente por fazer corresponder as condições do setor público às do privado. Mas, na verdade, ninguém acredita que essa solução seja viável num prazo aceitável.
Outras soluções, como aumentar o número de médicos formados em Portugal ou contratar médicos estrangeiros, enfrentam sempre uma intensa oposição das organizações profissionais. E é essa oposição que se torna difícil de entender. Se há capacidade e vontade das universidades para formar mais médicos, porque não fazê-lo sem esbarrar numa parede levantada pela própria classe profissional em nome de uma suposta diminuição da qualidade.
Porém, dificilmente se consegue perceber que a existência de mais médicos prejudique a qualidade do seu trabalho. Também não se consegue entender que o intercâmbio médico ou o trabalho no estrangeiro sejam excelentes formas de melhorar o conhecimento, mas que a vinda de médicos estrangeiros para trabalhar em Portugal seja perniciosa. Os relatos de clínicos de outros países que por cá tentam obter equivalência são bem claros quanto às dificuldades artificiais impostas a esse processo.
De uma coisa as organizações representativas da classe médica não se conseguem livrar: uma clara sensação de estarem mais interessadas em defender um “status quo” que lhes dá uma posição negocial invejável e menos em resolver o problema da falta de médicos.
*Editor-executivo-adjunto