Construiu a própria bicicleta de madeira à mão, mas foram precisos dez protótipos para chegar ao modelo que já está nas bocas do mundo. Na oficina de casa, em Ovar, onde João Baptista restaurava bicicletas vintage, nasceu um produto de luxo e um negócio que se tornou tão rentável que já emprega outras três pessoas.
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Há cinco anos, depois de sair do mundo da publicidade, João descobriu num site uma bicicleta feita de madeira por um construtor holandês. Nunca tinha feito nada do género, mas sempre gostou de bicicletas. E decidiu criar a sua. "Quando disse em casa, acharam que não estava bem da cabeça", conta o vareiro de 54 anos. "Começou tudo num abrigo de jardim, onde guardava as ferramentas. Comecei por fazer arranjos numas bicicletas e motoretas", relata. O primeiro protótipo que construiu "foi uma coisa tosca, feita com restos de bicicletas antigas". "Mostrei a toda a gente, achava que era uma grande coisa. Ainda mantenho essa bicicleta".
À boleia dos porta-moedas
Mas o verdadeiro modelo só havia de chegar ao fim de dez tentativas, em 2015. "Passados nove meses, já tinha gasto 17 mil euros", diz. Conseguiu financiar o projeto a vender uns porta-moedas em cabedal, também feitos à mão que ainda hoje vende. "Fazia dez por dia no abrigo".
A bicicleta nasceu por tentativa e erro. O mais difícil foi conseguir os componentes. "Cheguei a ter vergonha de dizer nas empresas que estava a construir uma bicicleta em madeira. Só consegui que me abrissem portas numa fábrica em Águeda". Carregou o seu protótipo até lá e "toda a gente ficou impressionada". A partir daí conseguiu contactos com empresas para o selim e rodas. No abrigo, que entretanto cresceu e onde monta a bicicleta tipo puzzle com as peças que molda em madeira, já há espaço para a mulher, genro e filho. Todos lá trabalham. "Só quando vendi as primeiras unidades para os Estados Unidos é que comecei a vender para a Europa. Tinha a bicicleta exposta numa loja do Porto e um americano viu e ficou interessado. Foi o primeiro país para onde exportei". Cerca de 90% dos seus clientes são estrangeiros. "Este não é um negócio de massas. É um produto de desejo. Muita gente me pergunta se isto dá mesmo para andar, dizem que ficava bem era na sala exposto", comenta.
Todas as bicicletas da MUD Cycles - marca que criou - são numeradas e certificadas. Até hoje, vendeu 38. Agora, está a fazer um protótipo de trotineta elétrica em madeira, que será lançada na primavera. "Sempre fui empreendedor. Aos sete anos, apanhava grilos e vendia-os na escola. Quando me meti nesta aventura nem sabia se ia conseguia fazer a bicicleta, quanto mais que a ia vender".
Pormenores
Dois modelos - Há dois modelos: a clássica e a cruiser, que custam 2300 euros. Mas também já há a versão elétrica (3490 euros). A qualquer modelo pode ser aplicado o kit elétrico, com autonomia até 80 quilómetros.
Mudanças - João criou as suas máquinas porque não existiam ferramentas para bicicletas em madeira. A bicicleta tem uma manete lateral para as mudanças (foto), em vez de ser no punho, inspirada nas motas Harley.
Suspensão - As primeiras dez unidades que vendeu foram construídas com suspensão à frente, inspiradas numa mota dos anos 20. Entretanto, abandonou esse sistema, porque a bicicleta ficava muito mais cara e pesada.
500 mil euros, foi quanto João faturou a vender bicicletas e acessórios, como mochilas e bolsas, desenhadas por ele, que têm sempre madeira, cabedal e cortiça.