Centro de dia recebeu, segunda-feira, seis utentes, depois de cinco meses com portas fechadas, mas maioria espera por setembro. Ali ninguém teme o regresso.
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Das colunas de som sai a voz inconfundível de Cesária Évora a cantar "Sodade". A música imortalizada pela rainha da morna não podia casar melhor com o momento de quem já leva o caminho longe. "Ai, menino, finalmente! Estava mortinha por voltar cá, não imagina as saudades que eu já tinha disto..." As saudades são de Lina Gonçalves. Na verdade, são partilhadas por todos, pelos seis utentes que ontem regressaram ao Centro de Dia Laços Quotidianos, na Senhora da Hora, em Matosinhos.
Cinco meses depois de terem sido fechadas pela pandemia, as portas puderam voltar a abrir com um sem número de regras e 1001 cuidados. Na semana passada, o espaço foi todo readaptado. À entrada, há desinfetante para as mãos e para o calçado; há um trajeto para entrar e outro para sair e não faltam cadeiras com um enorme X para garantir o distanciamento necessário.
As exigências são grandes, conta Francisco Vieira, diretor técnico e psicólogo: "Tem, por exemplo, que haver um intervalo entre cada banho para a desinfeção do espaço e o material tem que ser todo descartável. E o transporte, dentro dos possíveis, deve ser individual... Por isso, uma instituição com muitos utentes não consegue responder...".
Muitas ainda não reabriram, apesar de o poderem fazer desde sábado. Segundo as contas do presidente da Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade Social (CNIS), padre Lino Maia, apenas metade estará a funcionar. A abertura dos centros de dia com outras respostas sociais está sujeita a uma avaliação prévia e a CNIS recomenda que só entrem em funcionamento os que funcionam de forma independente."
tempos muito tristes
É o caso deste, onde se respira de alívio em sobretudo, liberdade. Durante meses, estiveram confinados às quatro paredes de casa, alguns longe dos filhos, outros dos netos. "Ai, esteja calado, foram tempos muito tristes. Não podíamos estar com ninguém, falar com ninguém...", recorda Alice Dias, ansiosa por meter a conversa em dia. Não se fala em vírus, nem em medo. "Temos muito que falar, não há tempo para tristezas", diz Lina Gonçalves. O dia é de festa. E a dobrar. Pelo regresso e porque o centro (gerido por uma entidade privada) faz três anos. Agora fazem-se recortes para decorar o cartaz que assinalará a data, antes jogou-se bowling e ao balão. As massagens e a dança, de que tanto gostam, foram proibidas pela pandemia que agora lhes permite voltar a estar ali juntos.
"Cinco meses foi para eles demasiado tempo. Começou-se a notar neles alguma debilidade em termos musculares, articulares e cognitivos e o isolamento social tem tendência para aumentar a sintomatologia depressiva e ansiógena", explica Francisco Vieira.
A pedido dos familiares, alguns utentes tiveram apoio domiciliário. "Tivemos o cuidado de fazer testes em fases distintas e cada um dos elementos da equipa tinha a cargo um utente, para evitar cruzamentos e possíveis contágios. Os utentes ficaram contentes, embora fossem dizendo que sentiam saudades do centro. Eles e os familiares foram percebendo que não há risco se forem respeitadas as medidas de distanciamento físico e por isso estão finalmente de volta".