Quatro pescadores lúdicos na zona de Coimbra morreram no naufrágio de uma embarcação na Figueira da Foz. Único sobrevivente da tragédia conseguiu chegar à praia e foi a pé até ao hospital pedir socorro.
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"Estava a sair do carro e apareceu-me um senhor a pedir socorro. Vinha só de cuecas, cheio de areia na cabeça e ferido numa mão. Dizia que não sabia onde estava". O testemunho é de uma funcionária da limpeza do Hospital Distrital da Figueira da Foz, que, este sábado de manhã, cerca das 7 horas, foi a primeira pessoa a socorrer o único sobrevivente do naufrágio de uma embarcação marítimo-turística, que aconteceu perto da praia do hospital, a sul da barra da Figueira da Foz. A mulher não sabia, mas o "senhor" era Paulo Veríssimo, de 56 anos, residente na Feteira, em Cernache, Coimbra. Foi o único a sair do mar pelo próprio pé, em busca de socorro. Na água, ficaram os quatro amigos, já inanimados. Tirando Paulo, morreram todos.
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A funcionária do hospital - situado junto à praia - ia entrar ao serviço. Tinha acabado de estacionar o carro, quando foi abordada por Paulo Veríssimo, ex-militar da GNR e proprietário do café Eira da Lapa, na Feiteira. "Ele estava a entrar em hipotermia e muito desorientado. Disse que tinham ficado quatro amigos na água e que deviam estar todos mortos. Só pedia socorro", recordou a mulher, ao JN, sem querer ser identificada. "Fui logo com ele até às urgências e deixei-o com um enfermeiro", acrescentou. Paulo foi transferido para o Centro Hospitalar de Coimbra, encontrando-se "estável e a evoluir favoravelmente", informou fonte hospitalar.
Nevoeiro e mar agitado
Os cinco tripulantes do "Seberino" tinham saído do porto de recreio bem cedo, para uma manhã de pesca lúdica. Manuel Gonçalves, de 55 anos, um ex-sargento do exército, era o proprietário da embarcação, com a qual fazia passeios para grupos. Com ele seguiam, além de Paulo Veríssimo, Rui Ventura, de Loureiro, Cernache, Mário Trota, de Campizes, Condeixa-a-Nova, e Fernando Silva, de Palhagões, também em Condeixa-a-Nova. As causas do acidente que atirou ou cinco homens ao mar, segundo a Autoridade Marítima Nacional, ainda estão "por apurar". O certo é que, àquela hora, as condições de navegabilidade eram difíceis, havia muito nevoeiro e o mar estava agitado.
O alerta dado pelo sobrevivente, quando chegou ao Hospital, fez com que se tenham deslocado para o terreno vários meios da Polícia Marítima e dos bombeiros, bem como um helicóptero da Força Aérea. Os quatro tripulantes restantes viriam a ser localizados na zona de rebentação, sendo retirados do mar com o auxílio da aeronave. Já em terra, após manobras de reanimação por parte do INEM, viriam a ser transportados, em estado crítico, para o hospital, onde foram declarados os óbitos.
"Gravíssimo problema"
A embarcação "Seberino" - que tinha cerca de sete metros de comprimento - acabou por não dar à costa. Mas ao areal chegaram destroços do barco, assim como bóias e coletes salva-vidas. Já o sobrevivente, por estar com problemas de insuficiência respiratória, acabaria por ser transportado para o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra.
Pedro Santana Lopes, presidente da Câmara, acorreu ao local do acidente, às primeiras horas da manhã. Mais tarde, na página de Facebook do município, o autarca afirmou existir, naquela zona, "um gravíssimo problema" de assoreamento, que "importa resolver tão depressa quanto possível". "É bom que as autoridades do país tenham noção", alertou.
"Pescadores lúdicos costumam ter cuidado"
João Borges, da Associação Nacional de Pescadores Lúdicos e Desportivos, diz que "raramente as pessoas arriscam". Os pescadores lúdicos "em geral têm cuidado e a legislação também obriga a ter cuidados, como o uso de coletes". Normalmente os pescadores lúdicos "consultam os sites na internet para verem as condições do tempo e o estado do mar", antes de saírem para pescar. Mas o nevoeiro, que dificulta a visibilidade e uma real perceção da ondulação, "por vezes é imprevisível". No caso ocorrido ontem na Figueira da Foz, "poderá ter havido uma conjugação de fatores, com o nevoeiro e a ondulação, que levaram ao acidente", lamenta.
Casos
Março de 2021: família em Viana
Uma mulher de 45 anos, e os pais, septuagenários, morreram após o naufrágio de uma embarcação no rio Lima, em Santa Marta de Portuzelo, Viana. Iam buscar lenha.
Outubro de 2015: cinco pescadores
Cinco pescadores morreram no naufrágio do "Olívia Ribau", à entrada da barra da Figueira.
Março de 2007: bote virou
Dois pescadores morreram, e um terceiro ficou ferido, na Figueira da Foz, quando o bote em que seguiam se virou junto à ponte dos Arcos.