O fenómeno não é novo e parece difícil de travar, mas há redes que têm vindo a trabalhar para fixar os locais e atrair novos residentes, mantendo as aldeias vivas e evitando que fiquem totalmente despovoadas.
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É certo que nem todas são iguais. Há fatores como a localização (próximas de grandes centros urbanos, de praias ou com bons acessos), dimensão (abaixo de um determinado limiar demográfico é difícil reverter o despovoamento) e área envolvente (se tiver dinamismo económico e emprego é mais atrativa) que "fazem toda a diferença" e tem salvado alguns lugares, explica o geógrafo João Ferrão, ex-secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades. Mas para as que não têm essas vantagens a seu favor, a "revitalização só acontecerá a partir de estímulos externos".
Há projetos e casos que mostram que "não é inevitável que as aldeias caiam no esquecimento e desapareçam do mapa", realça João Ferrão. Do retorno de emigrantes a nómadas digitais, passando por projetos turísticos, há vários exemplos de como fixar locais e atrair "fluxos externos de pessoas". A organização das aldeias em rede (ler exemplos ao lado) permite ganhos de "escala e dão visibilidade". Podem não ter força suficiente para inverter a tendência de despovoamento, mas "indiciam que é possível animar dinâmicas e processos que contribuam para a revitalização pelo menos de algumas".
É preciso também um outro olhar para a função social das pessoas que vivem nas aldeias, acrescenta o especialista, defendendo uma "fiscalidade favorável que reconheça a importância dos serviços ecossistémicos", aqueles que garantem a qualidade do ar, do solo, da água e biodiversidade, ajudando assim a viabilizar a manutenção de pessoas.
Uma espécie de "Erasmus interno", em que houvesse uma troca de estudantes para que conheçam áreas onde nunca iriam, "moldando uma nova visão sobre as potencialidades destes territórios rurais", é outra sugestão para dar "vida às aldeias"
Aumentar autoestima
Bruno Ramos, da ADXTUR, a Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto, criada em 2007, explica que na primeira década do projeto "foram recuperados cerca de 500 edifícios e instaladas muitas infraestruturas básicas" nestes lugares. Mas o maior ganho é a "perceção de valor que as pessoas nas aldeias têm relativamente aos espaços que habitam", antes associados a carência e pobreza.
O projeto, que também pretendia "encontrar outros meios de desenvolvimento socioeconómico para estes territórios", dado o declínio de atividades rurais, tem atraído novos habitantes. São "pessoas que querem fazer investimento, maioritariamente associado a serviços turísticos, artistas, pessoas que procuram ligação com a natureza e comunidade, nómadas digitais e outras pessoas que trabalham à distância", pois as aldeias já têm conectividade e qualidade, descreve Bruno Ramos.
Teresa Pouzada, da Adritem, a associação que atualmente assume a presidência da Rede Aldeias de Portugal, conta que as estratégias para estes lugares são delineadas "em conjunto com as comunidades, associações de relevo, autarquias e "filhos da terra", identificando recursos, problemas, a sua identidade e a alma da aldeia que a diferencia". Esse trabalho conjunto culmina num plano de valorização.
O esforço tem tido sucesso e traduz-se na "atração de investimento público e privado, em trazer [de volta] filhos da terra e na autoestima da comunidade". "Se queremos fixar as pessoas nas aldeias, temos de mudar a forma de atuação e criar raízes, é muito importante promover o sentimento de pertença" e valorizar "as vantagens de se viver nas aldeias", sublinha Teresa Pouzada.
A saber
Xisto
São 27 aldeias que têm em comum o material usado para as edificações. Estão distribuídas por 20 municípios do Pinhal Interior.
Montanha
São 41 aldeias em municípios serranos que a ADIRAM - Associação de Desenvolvimento Integrado da Rede de Aldeias de Montanha propõe que sejam exploradas pelo contacto com a natureza, sabores e cultura.
Históricas
A Rede Aldeias Históricas de Portugal é composta por 12 aldeias (Almeida, Belmonte, Castelo Mendo, Castelo Novo, Castelo Rodrigo, Idanha-a-Velha, Linhares da Beira, Marialva, Monsanto, Piódão, Sortelha e Trancoso), localizadas no Centro.
Calcário
Em 2018, os seis municípios da Associação de Desenvolvimento Terras de Sicó uniram-se para criar a Rede das Aldeias do Calcário. Numa primeira fase estavam englobadas as aldeias Casmilo (Condeixa-a-Nova), Chanca (Penela) e Cotas (Soure), Granja (Ansião), Poios (Pombal) e Ariques (Alvaiázere).
Portugal
A rede é composta por lugares, "em que a sua comunidade e atores locais estão determinados em ter um futuro na aldeia". Das 86 aldeias, 20 estão em reclassificação e há outras 40 que fizeram proposta de classificação.