Cidade tem várias mercearias com produtos específicos de países que fazem as delícias dos imigrantes, mas também dos portugueses.
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É uma autêntica viagem pelo Mundo aquela que se pode fazer sem sair do Porto. Com o cheiro intenso do açafrão-da-índia, passando por descobertas agridoces da Europa de Leste, pelos picantes de África e terminando nas tentações doces e salgadas do Brasil, em que o melhor é nem pensar nas calorias. Estabelecimentos cujo público dominante são os imigrantes, que procuram matar saudades dos sabores de casa, mas também os portugueses, muitos dos quais reféns das memórias dos tempos em que procuraram uma vida melhor lá fora.
1. Amália Beauty - Filhas à frente de negócios da mãe
Quando se pergunta na Baixa onde se pode encontrar uma mercearia africana no Porto, a resposta é consensual: "Na Amália, no Marquês".
Na verdade, o estabelecimento fica nas Galerias Atlantis, na Rua de Santa Catarina. E não desista se aqui chegado vir o nome "Amália Beauty", associado a um cabeleireiro e a uma loja de produtos de beleza, com perucas e tranças.
Amália, da Guiné-Bissau mas a viver em Portugal há quase 40 anos, tem três estabelecimentos, incluindo uma mercearia nestas galerias. No entanto, como está "de baixa", são as filhas que estão à frente dos negócios. "Quem quiser vir à mercearia, basta dirigir-se a uma das outras duas lojas que nós abrimos a porta", contou ao JN a filha, Bonémia Gomes, 28 anos.
Aqui encontra-se o fubá de bombó, funje, óleo de palma, castanha-de-caju, peixe seco, como o cacusso, creme de amendoim - com que se faz o caldo de mancara -, milho branco ou amarelo para a cachupa e arroz, "que tem a particularidade de ser perfumado", conta Bonémia, antiga jogadora de voleibol da Seleção Nacional.
É sobretudo "gente que vem à procura do gosto de África". Sejam eles imigrantes (a sua maioria) ou portugueses, "com saudades dos tempos em que viveram por lá".
2. Ali Indian Groceries - Talho cumpre rituais muçulmanos
A meca dos produtos indianos no Porto, como preparados de "chicken curry masala", arroz basmati, pão naan e especiarias e molhos do mais picante que há, fica situada na Rua de Cimo de Vila, próximo do Teatro Nacional S. João.
Foi aqui que há 18 anos, Nusrath Qurashi, 38 anos, a viver no Porto há 21, abriu a mercearia que tem maioritariamente clientes portugueses. "Diria que 70% são portugueses e 30% asiáticos".
"Gente que gosta de experimentar novos sabores, mas também antigos imigrantes das colónias portuguesas, que vêm à procura dos condimentos picantes com que cozinhavam em África".
Por volta das 17.30 horas, o espaço, com corredores preenchidos com mil e uma variedades de leguminosas e temperos - aliás no ar paira um cheiro forte a especiarias - fica repleto com pessoas de diferentes zonas do Mundo. Inclusive empregados de outras lojas da cidade, que aqui vêm buscar sobretudo especiarias para revenda.
Nhana Sané, 37 anos, da Guiné-Bissau, a viver no Porto há 12, é já cliente habitual e, por isso, juntamente com o filho Seco, sabe bem o que vai buscar: "Óleo de palma, quiabos e frango".
"Como sou muçulmana, só aqui encontro carne em que a forma como matam os animais é feita segundo os rituais muçulmanos (que implica o sangramento da carne). É tal e qual como se faz na Índia", remata Nusrath, que vive no Porto com a mulher e com as três filhas, que já nasceram em Portugal, de um, quatro e seis anos.
3. Mix Markt - Veio fazer pé-de-meia e acabou por ficar
Nadiya Havdyda tinha 20 anos quando decidiu vir ter com o namorado, que estudava em Portugal. Nos sonhos da ucraniana estava a possibilidade vir fazer um pé- -de-meia e depois regressar ao seu país. A casa ainda chegou a ser comprada na Ucrânia, mas a vida acabou por se fazer toda cá.
Com o diploma de professora primária, foi auxiliar num infantário, onde aprendeu "a falar português com as crianças". Seguiu-se um emprego numa loja e quatro anos como empregada doméstica. Até arranjar trabalho num supermercado com produtos alimentares da Europa de Leste.
Espaço onde a Nadiya "mata saudades". Não só dos alimentos do seu país - como os varenikis com sementana -, como da língua, uma vez que a maioria dos clientes são imigrantes de Leste.
"Mas também já temos portugueses que vêm à descoberta dos chás pretos, do "Borodino" ( pão de centeio típico da Rússia), dos queijos frescos com chocolate ou dos kefirs (leite fermentado).
Com duas filhas já nascidas em Portugal, de 8 e 18 anos, Nadiya, de 39, visita agora a Ucrânia uma vez por ano. Neste, por causa da pandemia, isso não aconteceu.
4. Mercado Brasil Tropical - Do panetone com doce de leite às coxinhas
"Brasileiro que é brasileiro sente sempre falta de um churrasquinho", desabafa Jucileni Oliveira, 32 anos, de olhos postos num panetone de frutas, já a pensar no Natal que será passado no Porto. A brasileira confessa que gosta do "panetone clássico", mas Bruna Sousa, 26 anos, funcionária do Mercado Brasil Tropical, na Rua do Dr. Alfredo Magalhães, vai desafiando os clientes a provarem "com chocolate ou doce de leite". "É uma delícia!", garante.
Aliás, por ali, o que não faltam são tentações. Ora doces, ora salgadas. Jucileni sorri quando encontra os "Negrecos" (idênticos às bolachas Oreo) numa das prateleiras. E logo explica: "Podem até dizer que são parecidos, mas esses são muito melhores!".
Na ressaca de quem vive longe das origens há ano e meio, Jucileni vai matando as saudades com tapioca. E como está em promoção (1 kg custa 2,49€) acaba por levar dois sacos.
Com a massa pronta - "basta apenas forrar o fundo da frigideira com uma camada fininha" - a auxiliar de saúde do Hospital do Terço gosta particularmente de fazer crepes "no café da manhã".
Nas compras vai também "uma farofinha", mas também elogia "o pão de queijo congelado.
Bruna acrescenta que todos os dias o mercado tem "pão francês quentinho que também vem congelado do Brasil". "E coxinhas, enroladinhos de salsicha e biscoitos de queijo".