Moradores de Paradinha, acusados de provocar insegurança, queixam-se de atrasos na entrega do correio. Policiamento existe há dez anos.
Corpo do artigo
No Bairro de Paradinha, em Viseu, o correio só chega duas vezes por semana. À terça e à quinta-feira, sempre por volta da hora de almoço. Ao meio-dia e meia o carteiro começa a distribuição e não vai sozinho. Ao lado tem sempre um polícia, que acompanha todo o trabalho. É assim há quase dez anos. Depois de vários episódios de violência e intimidação aos profissionais dos Correios de Portugal (CTT), por parte dos moradores do bairro, na maioria cidadãos de etnia cigana, a distribuição postal começou a ser feita com escolta profissional.
A "volta" pelo bairro é feita com calma. O carteiro vai à frente. Pelo caminho vai entregando a correspondência a quem espera por ele na porta dos vários blocos. O agente da PSP dá uma ajuda sempre que é preciso e assegura que tudo decorre com normalidade. Vai fardado e armado.
"Sem polícia nenhum de nós entra no bairro. Se os outros colegas foram agredidos, a gente também pode ser", afirma ao JN um carteiro, que prefere manter o anonimato. "Ainda há dias o polícia não apareceu e o serviço ficou por fazer", acrescenta.
São três os trabalhadores dos correios que passam pelo Bairro de Paradinha. A escolta policial começou, segundo a PSP, a 6 de janeiro de 2012, quando os carteiros se recusaram a distribuir a correspondência sem a presença de agentes da força de segurança. Queixavam-se das ameaças, de injúrias e de agressões, sobretudo quando os vales do rendimento social de inserção (RSI), mas também da reforma, "não chegavam a horas". A Polícia acabou por ser chamada a intervir, num serviço que é pago pelos próprios CTT.
Problema resolvido
"Desde que a PSP acompanha os carteiros não há registo de incidentes. O cenário é melhor do que em anos passados, pois com a presença da Polícia os problemas ficaram resolvidos", garante o subcomissário Luís Santos, comandante da esquadra de Viseu da PSP.
É isso também que confirma o carteiro ouvido pelo JN, explicando que o agente da Polícia está sempre junto à pessoa que faz a distribuição. "Até agora nunca teve de intervir. Neste momento, ele até é mais uma pessoa a ajudar a fazer o serviço", refere.
No bairro já ninguém estranha "a entrega de cartas guardada". Os carteiros continuam a defender a medida. "É mais seguro para nós", sustenta o elemento dos CTT, que, em parte, compreende "a revolta" dos moradores do bairro que só recebem a correspondência duas vezes por semana, muitas vezes com atraso.
Há casos de pessoas a receber avisos do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) ou cartas dos hospitais que chegam depois da data em que é suposto apresentarem-se, o que acaba por originar reclamações.
Sandra, nome fictício de uma moradora do bairro, que não quer ser identificada para evitar problemas, é uma das queixosas. Já perdeu a conta às vezes em que teve de ir ao IEFP justificar o motivo por não se ter apresentado a tempo e horas. As idas ao médico também são difíceis.
"Já perdi muitas consultas dos meus filhos no Hospital de Coimbra porque as cartas vêm depois da data marcadas. Isto causa-nos muitos transtornos a todos, é muito complicado", frisa.
"Não somos bichos"
A viver em Paradinha há quase duas décadas, Sandra também não tem conhecimento de qualquer problema recente com o carteiro e, por essa razão, defende que a distribuição postal devia ser feita diariamente. "Não somos bichos, nem criminosos. As pessoas estão com outro pensamento e mentalidade e já não há aquelas ameaças, nem nada. Isso foi há muitos anos. Não percebo porque nos continuam a fazer isto", afirma, em jeito de revolta, mas também de lamento.
Quem se coloca ao lado dos habitantes do bairro é o coordenador do Centro Comunitário da Cáritas em Paradinha, instituição que trabalha há vários anos com os moradores da zona. Por já não existirem problemas, António Ramalho também defende que chegou a hora de o serviço postal funcionar como em todos os outros locais.
Os CTT asseguram ao JN que o policiamento dos carteiros em Paradinha "vai ser mantido". Não equacionam reforçar os dias de entrega das cartas e dizem não ter "conhecimento de atrasos do correio".