<p>O ribeiro que no Inverno molha os pés da Lavandeira, em Carrazeda de Ansiães, quase não leva água. Por esta altura, leva esgotos do mesmo povo que os quer ver tratados. Diz que poluem os poços e dão cabo das hortas.</p>
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Sai-se do alcatrão ao fundo da aldeia, entra-se no caminho paralelo ao ribeiro e já se sente o fedor. Entre as gentes da terra da Santa Eufémia nem todos se queixam com a mesma veemência, há quem nem se queira queixar, embora seja unânime que "aquilo cheira muito mal" e que da forma que está "não tem jeito nenhum".
Valha a verdade que a situação já assim está há uma meia dúzia de anos, altura em que foi instalado o há muito reclamado saneamento básico, que escoa para uma fossa séptica junto ao ribeiro. Mas depois de tanto protesto caído em saco roto, o mesmo povo a quem os efluentes incomodam o olfacto, aproveitou a mudança nas principais cadeiras da Junta de Freguesia e da Câmara Municipal para voltar a reclamar.
"Bem sabemos que os esgotos têm de ir para algum lado, mas ao menos que os tratem primeiro", diz Armindo Mesquita, que tem um terreno na zona que todos conhecem por "ribeiro", precisamente porque por ali corre.
Assegura que, de um lado e do outro do regato, uns quinze agricultores foram abandonando as culturas. "Eu punha aqui de tudo: couves, batatas, feijão, hortaliça... e mais coisas. Punha, porque há tempos que não planto cá nada", queixa-se, Adelina Ferreira, apontando para a placa onde anuncia que vende o terreno. Com dois números de telefone. "Estar cá e não estar é a mesma coisa, porque ninguém lhe pega", lamenta.
A justificação para o abandono é simples: "A gente acaba por ter nojo de comer uma batata daqui. Os esgotos do ribeiro vão ter aos poços de rega e contaminam tudo", torna Armindo, que lamenta que, por causa deles, "as melhores" hortas da aldeia estejam abandonadas. Há três anos que deixou de plantar na dele, um pouco mais abaixo da de Adelina.
Embora sem terrenos no chamado "ribeiro", Glória Moutinho diz que se lhe "vencem os vómitos" quando ali passa a caminho de umas terras que cultiva um pouco mais acima, no "sobredo". E ao marido, ainda pior. "Ainda o outro dia aqui passou e um pouco mais à frente deitou tudo fora. Isto é um bom nojo, lho digo eu", reforça.
Até quem não tem nada para aquelas bandas presta solidariedade a quem tem alguma coisa, própria ou emprestada. Lurdes Novais não tem lá terreno "mas se os lá tivesse também reclamava". Rosa Rodrigues tem a "mesma ideia", apesar de "só ter lá ido apanhar castanhas" ao souto da vizinha.
Há duas semanas no poder, o novo presidente da Junta de Freguesia, Renato Lopes, já foi confrontado com as reclamações da população, do "cheiro nauseabundo e insuportável", e já levou o assunto ao também novo presidente da Câmara. E será a este que vai caber pressionar a empresa que gere o saneamento, a Águas de Carrazeda.