Porque faltava uma prenda para alguém da família, ou falhava o pão-de-ló ou o bolo-rei, os centros comerciais voltaram a viver uma véspera de consoada marcada pelas enchentes.
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Embora sem a confusão do ano passado, a corrida às compras de última hora foi suficiente para entupir os acessos rodoviários, onde as buzinas impacientes substituíram a música da época. Em Matosinhos, Gaia, Lisboa e Braga o cenário foi idêntico.
"Quase que não dava para andar" no hipermercado
Depois de visitarem as lojas do NorteShopping, em Matosinhos, à procura dos últimos presentes de Natal, da lista de compras de Maria Fernandes, 55 anos, e da filha Diana, 19, só faltavam os ingredientes para a "doçaria". Mas circular pelo hipermercado do centro comercial foi um desafio. "Quase que não dava para andar lá dentro", diz Diana. "Passar no corredor dos brinquedos foi quase como andar nos carrinhos de choque. Foi um bocado stressante", descreve Maria. Mãe e filha, de Santo Tirso, viajaram até Matosinhos de propósito para acabar de fazer as compras.
"Aqui é mais fácil porque conseguimos encontrar tudo num só lugar", justifica Diana. Ao final da tarde, já com o carrinho cheio, as duas estiveram mais de uma hora, à porta do hipermercado, à espera da boleia de regresso a casa. "Há uma hora que estamos à espera que o meu filho chegue aqui. Para ir embora está o caos", observa Maria, olhando para os carros parados na Rotunda AEP. Nos acessos aos shoppings, as filas agigantaram-se.
Ao ver o tempo passar, desconfiava que já não conseguiria encontrar sacos para as prendas e um último presente que teimava em não aparecer.
Nas lojas, principalmente nas de tecnologia, o dia ficou marcado pelas filas.
Isabel Pinto, de 52 anos, referiu que os brinquedos foram o principal motivo das deslocações aos centros comerciais. Assim como a correria aos bombons e aos doces tradicionais. A funcionária do GaiaShopping considera, no entanto, que a confusão não tomou as proporções do ano passado, apesar de o movimento ter começado logo de manhã.
Mais calmo ao almoço
"Isto agora nem é nada. No ano passado foi muito pior", garante Isabel, notando que "de manhã houve logo um rebuliço, que acalmou à hora de almoço e retomou ao final da tarde".
O bacalhau e o polvo compraram-se durante a semana, referiu, verificando que a maioria das compras de quinta-feira foram de "bombons, brinquedos e roupas".
Com o pão-de-ló e bolo-rei na mão, já não falta nada para a consoada da família de Manuel Rocha, 75 anos. Com tudo pronto, o gaiense, que mora em Vilar do Paraíso, "já não sai mais de casa". "Só para ir para casa da minha filha", corrige.
Há quem goste da "adrenalina"
Em Lisboa foram muitos os que deixaram as compras de Natal para a véspera da consoada, mas a maioria dos presentes já estava comprada. "Costumo evitar vir neste dia, mas tinha um desconto e quis aproveitar. Como já sabia o que queria fui direto à loja. Esta foi mesmo a última, a que faltava. O resto comprei em novembro", contou entusiasmado Jorge Mateus, que viajou de propósito desde Almada até ao El Corte Inglés. Rosa Salazar é de Loures: "Vir a Lisboa e não vir aqui é difícil. Tinha umas consultas e aproveitei para comprar o que faltava, mas não costumo vir neste dia".
Sofia Rebelo, acompanhada pelos filhos, também costuma fazer as compras mais cedo, mas este ano teve menos tempo livre. "Vamos só comprar os presentes essenciais, toda esta conjuntura da pandemia levou-nos a focar-nos mais na família", disse, após fazer as últimas compras. Sofia admitiu que este ano olhou mais para os preços, "o que não fazia antes". "Até a classe alta já faz contas. Não sabemos o que aí vem", confessou.
A Fernanda Branquinho ainda faltavam algumas "compras de supermercado". "Detesto vir neste dia, mas há sempre algo que falta". Para Tomás Ribeiro também é difícil evitar a confusão da véspera da consoada. "As prendas para oferecer estão todas, mas faltam as minhas", dizia, enquanto experimentava um casaco. Mafalda Falcão também "namorava" uns ténis. "Deixo tudo para a última, agora só falta mesmo para mim", observou.
Se a maioria não gosta das enchentes de última hora, há quem faça questão de comprar nos dias 23 e 24 de dezembro. "Gosto de vir na véspera, dá mais adrenalina. E haveremos de vir amanhã outra vez", garantiu Bernardo Catalão, acompanhado pela mãe, que ainda procurava por dois presentes.
Menos confusão do que em 2020
Cristina Vasconcelos "tenta" sempre comprar os presentes de Natal com antecedência, mas este ano deixou para o último dia, "porque [teve] uma folga" no trabalho. Na quinta-feira, chegou pelas 11 horas ao Braga Parque, o maior centro comercial da cidade, e ainda conseguiu fazer compras "tranquilamente". Quando saiu, pelas 15.15 horas, a realidade começou a ser diferente, com as filas a aumentarem para fazer pagamentos e para o parque de estacionamento.
"Isto começou a encher agora. Mas o ano passado foi pior, por causa das restrições", afirmou Cristina Vasconcelos, à saída do centro comercial com as mãos já repletas de presentes. Ao lado, a filha Eduarda Ferreira confessava que o comércio tradicional não costuma ser opção, porque no shopping "há mais variedade".
Marcelo Fernandes, emigrante já habituado a ir às compras de Natal "à última hora" ficou surpreendido. "Está menos confusão do que imaginava", atestou. Já para Marçalo Costa, de Barcelos, o número de pessoas a circular pelo espaço comercial era suficiente para querer ir embora rapidamente. "Odeio confusão. Vim cá porque faço anos e quis trocar umas prendas", confidenciou ao JN.
Segundo António Afonso, diretor-geral do Braga Parque, as lojas têm recebido mais clientes, um aumento entre "30 a 40%" face ao ano passado. "Tem estado muita gente, mas em números estáveis", não se verificando "um pico" com o aproximar das festas, ressalvou, acrescentando que, "sem restrições de horários, as pessoas dispersam ao longo do dia e não se concentram às mesmas horas".
A saber
1 pessoa por cada cinco metros quadrados foi o limite de ocupação imposto pelo Governo para os espaços comerciais.
Devoluções e trocas
O prazo para devolução de e trocas de artigos nas lojas foi alargado até 31 de janeiro, como forma de evitar grandes aglomerações de pessoas nos espaços comerciais.
Saldos proibidos
Entre o dia de Natal e 9 de janeiro estão proibidos os saldos nos estabelecimentos comerciais, também para evitar grandes ajuntamentos de quem procura preços mais reduzidos.
Circulação aberta
O Governo não anunciou qualquer restrição à circulação nem para o Natal, nem para o Ano Novo, no âmbitos das novas medidas para combater a pandemia.